Se até há pouco tempo a prisão de Jair Bolsonaro era considerada uma possibilidade remota, o escândalo das joias milionárias mudou este entendimento dentro da Polícia Federal. Investigadores da corporação têm falado em prazo para pedir o encarceramento do ex-presidente à Justiça diante de sua permanência nos Estados Unidos em meio ao inquérito que apura o caso.
O ex-chefe do Executivo brasileiro já é alvo de investigação da PF que apura os atos golpistas promovidos por bolsonaristas em Brasília no dia 8 de janeiro. Esta apuração, entretanto, ainda não reuniu elementos que justifiquem um pedido de prisão de Bolsonaro, e seu incentivo ao levante antidemocrático deve, por hora, gerar punição por parte do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que pode torná-lo inelegível se associar o movimento antidemocrático à campanha de ataque que o ele fez ao sistema de votação do Brasil.
As revelações sobre a tentativa de Bolsonaro de fazer entrar de forma ilegal no Brasil joias de R$ 16,5 milhões e ter se apropriado de outro conjunto de artigos de luxo milionário - ambos "presentes" do governo da Arábia Saudita -, entretanto, já dão base para a PF pedir a prisão preventiva do ex-presidente, e investigadores têm estudado a forma de fazê-lo.
Segundo reportagem da jornalista Carolina Brígido, do portal UOL, policiais federais que apuram a questão das joias vêm cogitando pedir a prisão de Bolsonaro caso ele não retorne ao Brasil até o mês de abril. O ex-mandatário está nos EUA desde 30 de dezembro de 2022 e, de acordo com a PF, sua permanência no país da América do Norte diante do inquérito pode configurar "evasão do distrito da culpa", dispositivo que consta no artigo 302 do Código de Processo Penal e que pode justificar a solicitação para uma prisão cautelar.
Além das joias de R$ 16,5 milhões, o governo da Arábia Saudita deu ao Estado brasileiro um segundo estojo com artigos valiosos e este outro "presente" foi para o acervo privado de Bolsonaro sem ser declarado à Receita Federal e desrespeitando acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) que versa sobre a questão. Caso este conjunto de peças milionárias não seja apresentado publicamente e devolvido ao patrimônio da União, a PF pode vir a realizar operações de busca e apreensão em endereços do ex-mandatário.
Pedido de prisão no MP
Para além das joias de R$ 16,5 milhões dadas pelo governo da Arábia Saudita e que Jair Bolsonaro tentou fazer chegar ao Brasil ilegalmente, levando a Receita Federal a apreender as peças, e do estojo de artigos de luxo, também um "presente" saudita, que o ex-presidente se apossou de forma irregular, o ex-mandatário ganhou um fuzil e uma pistola durante outra viagem que fez ao Oriente Médio e trouxe os armamentos ao país em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB).
Em outubro de 2019, Bolsonaro esteve em viagem oficial nos Emirados Árabes e ganhou de um príncipe local um fuzil calibre 5,56mm, de uso restrito, e uma pistola 9mm. O novo caso veio à tona a partir de reportagem do jornalista Guilherme Amado, do site Metrópoles.
As armas teriam sido repassadas a um terceiro que as entregou para Bolsonaro dentro do avião da FAB. O fuzil vale entre R$ 32 mil e R$ 42 mil, enquanto a pistola é avaliada entre R$ 5,9 mil e R$ 15,6 mil.
O fato de Bolsonaro ter se apossado dos armamentos e os incorporado ao seu "acervo pessoal" pode ser considerado ilegal, visto que acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) diz que “o recebimento de presentes de uso pessoal com elevado valor comercial", por parte do presidente da República, "extrapola os limites de razoabilidade” e, por isso, devem ser devolvidos, quando for este o caso, à União.
Foi com base neste entendimento que o TCU determinou, recentemente, que membros da comitiva de Bolsonaro que o acompanharam na mesma viagem aos Emirados Árabes devolvam relógios de luxo das marcas Hublot e Cartier, dados por autoridades do país do Oriente Médio, que chegam a custar R$ 53 mil cada um. Como o valor das armas que Bolsonaro trouxe ao Brasil é parecido, ele não poderia ficar com elas.
Por este motivo, a deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP) protocolou junto ao Ministério Público Federal (MPF), nesta sexta-feira (10), uma representação em que solicita a prisão preventiva de Bolsonaro por improbidade administrativa, peculato e tráfico internacional de armas, que é um crime hediondo.
Segundo a deputada, o crime de improbidade administrativa estaria configurado pelo fato de Bolsonaro não ter respeitado o acórdão do TCU ao incorporar as armas ao seu acervo privado. Já a prática de peculato estaria na apropriação que o ex-presidente fez do fuzil e da pistola, que deveriam ser considerados, pelo valor, bens públicos. O crime de tráfico internacional de armas, por sua vez, teria sido praticado a partir do momento em que o ex-mandatário importou o armamento pesado e de uso restrito "sem autorização do Estado brasileiro".