LIBERDADE DE IMPRENSA

STF julgará caso que deve definir tese de responsabilização de jornais

Ministros da Corte divergem em decisão referente à acusação caluniosa de jornal a ex-deputado federal

Supremo teve entendimento do caso, mas trabalha com três teses divergentes.Créditos: Valter Campanato/Agência Brasil
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Supremo Tribunal Federal (STF) julgará na quarta-feira (29) uma ação que pode servir de parâmetro para definições de liberdade de expressão e o direito à indenização em julgamentos da Corte. A tese trata sobre a responsabilização de jornais pelos crimes de injúria, difamação ou calúnia em declarações de entrevistados, e deve nortear as próximas decisões de casos semelhantes.

O Supremo deve analisar a entrevista publicada pelo jornal Diário de Pernambuco em 1995, na qual o ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho (PT-SP) foi acusado de participação em ataque a bomba que deixou três mortos e 14 feridos no Aeroporto de Guararapes, em Recife (PE), no ano de 1966. 

Falecido em 2017, Zaratiini foi militante do Partida Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) durante a ditadura militar, porém foi inocentado de todas as acusações de envolvimento no atentado ainda na década de 1980. O ex-parlamentar entrou com ação judicial por danos morais decorrentes da entrevista publicada, que teria ofendido sua honra. 

Em outubro de 2016, a Terceira Turma do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 700 mil. Contudo, o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJ-PE) reverteu a decisão e declarou improcedente o pedido de Zarattini.

O ministro Paulo de Tarso Sansverino considerou que o Diário de Pernambuco deveria ter se agido de modo a preservar a integridade moral de Zarattini e aberto espaço para que fosse exercido o direito de resposta às acusações feitas pelo entrevistador.

Parte dos crimes contra a honra, a calúnia é definido como a atribuição falsa de crime a partir do artigo 138 do Código Penal (CP). A pena incorre àquele que imputar, propalar e divulgar falsa declaração de crime, inclusive de mortos.

As teses defendidas

Em agosto deste ano, o STF formou um entendimento sobre o tema. Por 9 votos a 2, os ministros determinaram que o jornal pode ser responsabilizado, posicionamento contrário do voto do relator do caso em 2020, Marco Aurélio de Mello – aposentado desde 2021.

De acordo com Mello, o jornal não emitiu opinião a influenciar leitores, apenas exerceu o direito de liberdade de imprensa e expressão. "Responsabilizar a imprensa não é a forma ideal de combate à divulgação de entrevista, ainda que inadequado o que dito pelo entrevistado", declarou o magistrado.

O Estado torna-se mais democrático quando não expõe esse tipo de trabalho à censura oficial, mas, ao contrário, deixa a cargo da sociedade fazer a análise, formando as próprias conclusões. Somente é possível chegar-se a uma sociedade aberta, tolerante e consciente se as escolhas puderem ser pautadas em discussões geradas a partir das diferentes opiniões sobre os mesmos fatos.

A tese definida por Marco Aurélio de Mello, e apoiada pela ex-presidente da Corte Rosa Weber, diz: "Empresa jornalística não responde civilmente quando, sem emitir opinião, veicule entrevista na qual atribuído, pelo entrevistado, ato ilícito a determinada pessoa".

Os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin apresentam divergências quanto à tese:

Alexandre de Moraes

Para Alexandre, a liberdade de imprensa não é um direito absoluto pois encontra limites nos direitos fundamentais e, portanto, deve ser aplicada com responsabilidade. Conforme seu voto, os jornais devem ser responsabilizados nos casos em que publicam declarações injuriosas.

"A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, não permitindo qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas", escreveu Moraes.

Luís Roberto Barroso

O ministro seguiu a tese de Moraes, porém enfatizou a necessidade da existência de indícios concretos de informação falsa à época da publicação, isto é, diante da possibilidade do Diário de Pernambuco não estar ciente da falsa declaração de crime quando publicou a entrevista.

"Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios", defendeu Barroso.

Edson Fachin

Tal qual a decisão de Moraes, Fachin apontou a restrição enfrentada pela liberdade de imprensa frente aos princípios constitucionais. Sua tese defende a responsabilização em casos de jornais que não procuram o outro lado da acusação ou que não aplicam "protocolos de busca pela verdade".