O governo estadual de Romeu Zema (Novo) apresentou uma proposta de privatização da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) aos deputados estaduais nesta quarta-feira (18). Seria adotado um modelo de corporação na para transferência de gestão da empresa, no qual o Estado não terá mais controle administrativo.
A privatização da Cemig é uma prioridade no plano de governo apresentado por Zema em agosto de 2022. No eixo Prosperidade do documento, ele propõe "realizar a venda de participações minoritárias e privatização de empresas estatais, a fim de garantir serviços de melhor qualidade e mais acessíveis ao cidadão mineiro, assim como foi com os serviços de telefonia no Brasil".
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Em 2022, a Cemig anunciou lucro anual de R$ 4,1 bilhões, com receita líquida de R$ 9,7 bilhões. O abastecimento de energia da empresa atinge 9 milhões de clientes em 774 municípios mineiros. Segundo seu site oficial, a estatal possui 76 usinas hidrelétricas, 6 parques eólicos e 1 usina fotovoltaica, em um total de 5,78 GW (Gigawatt).
Em nota, o governo de Minas Gerais garante que a decisão se pauta na modernização da companhia: "A escolha foi pelo modelo de corporação, adotado por grandes empresas do mundo para garantir uma gestão com mais capacidade de investimentos".
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A proposta de privatização
O Governo Zema apresentou um programa de alteração nas ações da Cemig: foi proposto que 100% das ações da empresa sejam convertidas em ações ordinárias – aquelas com direito ao voto e participação nas decisões da companhia.
Atualmente, somente um terço das ações da Cemig são ordinárias enquanto o restante se configura como ação preferencial – sem direito ao voto, mas com preferência no recebimento dos dividendos.
O Estado detém 50,97% das ações ordinárias da Cemig, valor que permite o controle administrativo da empresa por ser superior à metade. Esse montante corresponde a 17,04% das todas as ações, percentual que deve ser mantido no caso de desestatização. Ou seja, Zema abriria mão das ações preferenciais e de quase metade das ações ordinárias.
Um dos objetivos em manter uma parcela das ações á a aplicação do mecanismo de "travas societárias" para impedir outro acionista de acumular mais direitos de voto e garantir o poder de veto à Minas Gerais, colocando-se como "acionista-referência". No entanto, a medida sucederia no controle da Cemig por milhares de acionistas, que teriam o poder de escolher o Conselho Administrativo, núcleo de caráter deliberativo na empresa.
Nesse modelo, a Cemig também passará a ter mais sócios que, com o Governo de Minas, estão obrigados a realizar investimentos no Estado sempre superiores à desvalorização dos seus ativos, e em patamares superiores aos praticados atualmente, para melhorar o atendimento a indústrias, clientes rurais e residenciais.
"Todas as vezes que a imprensa tratar de privatização, nós vamos corrigi-los, nós não faremos para CEMIG e para a COPASA privatização nós faremos corporação. O estado não está, como alguns que querem dizer e querem induzir as pessoas a acreditar, dilacerando patrimônio, nós não vamos abrir mão do nosso patrimônio. Na Cemig, nós temos 17% das ações e 83% já estão nas mãos da iniciativa privada. O que nós queremos fazer é tirar a gestão do estado. O estado vai manter as ações como estão, no caso da Copasa diminuindo um pouco a a participação, mas mantendo uma boa parcela", afirmou Zema no Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte (MG).
A oposição critica o projeto, tendo em vista que a energia elétrica é considerada um bem de consumo essencial. Outro ponto de preocupação é a taxação em cima dos valores cobrados pela prestação do serviço no caso, uma vez que o Conselho Administrativo seria composto por uma gestão voltada para a concentração de lucros em empresas privadas.
O governo assegura que a reestruturação não resultará no aumento das taxas: "O preço da conta de luz ao consumidor final não será alterado, já que, hoje, a definição da tarifa de energia é definida pela agência de regulação, a Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica], após analisar uma série de dados".
Os passos para a privatização da Cemig
Em março deste ano, executivos da fornecedora de energia defenderam sua privatização e incentivaram o governo do estado à intensificar os diálogos desta pauta na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Em abril, o Conselho de Administração da Cemig aprovou o pagamento de mais de R$ 248 milhões em dividendos.
É muito bom para a Cemig passar por um processo de privatização, se transformar em uma corporação. Irá gerar valor. Esse processo de criação de valor se acelera ainda mais em um movimento em que a gente tenha que virar corporation, eventualmente ser privatizada
Reynaldo Passanezi, CEO da Cemig
O CEO da empresa, Reynaldo Passanezi foi contratado em meio à controvérsias. Assumiu o cargo em 13 de janeiro de 2020 e assinou o contrato com a empresa que faria a sua seleção – contratada pela Cemig sem concorrência, licitação e transparência – como novo presidente no dia 20, uma semana depois.
"Fomos limpando essas pautas e a nossa cabeça voltou mais para a gente tentar cada vez mais focar em Minas, sair de ativos de baixa rentabilidade ou até rentabilidade negativa. Isso permitiu que a gente voltasse mais o trabalho para a privatização", explicou Márcio Utsch, presidente do Conselho, em referência às parcerias com a Light e Renova, outras companhias do ramo energético.
A proposta de mudança de gestão da estatal será encaminhada à ALMG após aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 23/2023, que sugere o fim da obrigatoriedade da realização de um referendo sobre as privatizações da Cemig e Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa).
De acordo com Gustavo Valadares, secretário de Estado de Governo de MG, o projeto de privatização significaria a redução na qualidade do serviço prestado pelas companhias: "quando você tira o governo da gestão das duas empresas, você tira as empresas das amarras que qualquer estatal tem, por exemplo, seguir lei de licitação para contratação de serviços e para compra de material".
Cemig e Copasa são duas empresas prestadoras de serviços, uma na área de energia elétrica, a outra na área de saneamento. Quem são os clientes? Os mineiros. Se você fizer uma pergunta hoje para qualquer mineiro, de qualquer canto do Estado, eles vão falar que há um grande espaço para melhorar a prestação de serviço.
Desde o início do mandato Zema, a Cemig, segundo representantes das categorias de trabalhadores do setor, tem sido vítima de uma desastrosa gestão e alvo de inúmeras denúncias de desmandos, malversação de recursos e precarização dos serviços prestados aos cidadãos.
O próprio governador Romeu Zema faz críticas à qualidade dos serviços prestados pela Cemig. As reclamações são interpretadas como uma estratégia para privatizar a energética, uma promessa de Zema desde a campanha eleitoral de 2018. Por lei, a ALMG precisa aprovar a decisão com dois terços dos parlamentares, para depois submeter o resultado a uma consulta popular.
Em janeiro de 2021, a empresa anunciou o afastamento de 15 gerentes e superintendentes da Cemig, todos contrários à privatização. "Nós, do Sindieletro [Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais], não temos dúvidas de que essa é mais uma das várias medidas que visam a fortalecer o projeto de privatização da Cemig, uma vez que o governador indicará para esses postos estratégicos pessoas alinhadas com sua política privatista", manifestou Jefferson Silva, coordenador-geral do sindicato.
Dias depois, a direção da empresa emitiu um comunicado para os funcionários confirmando os rumores e assinalando que a medida havia sido tomada porque o Conselho Administrativo da companhia aprovara uma autorização para a contratação de 40% dos trabalhadores de fora dos quadros da Cemig. Ou seja, para admitir pessoal não concursado.