Mal inicia a semana que antecede o primeiro turno das eleições nacionais e já começam a aparecer nas redes sociais vídeos vazados de chefes e patrões tentando coagir funcionários a votarem em Jair Bolsonaro (PL). Na tarde desta segunda-feira (26) foi a vez de um gerente da unidade da Imetame Metalmecânica, de Aracruz, Espírito Santo, ter vazada nas redes sociais uma fala para funcionários da empresa onde diz para não reclamarem no dia que ficarem sem emprego, caso votem no candidato que “diz absurdos com relação às famílias e a quem empreende”.
“Assuntos absurdos com relação às famílias, assuntos absurdos com relação a quem empreende, contra quem tem a coragem de fazer o que nós fazemos e que é estar aqui investindo, sempre para gerar emprego. Quando você vê pessoas falando coisas negativas de quem faz realmente esse país ir pra frente, e você ainda tem coragem de votar nessas pessoas, no futuro você não vai poder reclamar. No dia que você não tiver mais emprego, você não vai poder reclamar, porque você escolheu”, diz o gerente da unidade no vídeo que vazou.
A fala é ambígua e pode ser interpretada de mais de uma maneira. Por associação, utilizando referências da própria fala, como a defesa grosseira da ideia de "família", é possível intuir que o gerente faz pedido de voto no atual presidente Jair Bolsonaro (PL) e que, em sua opinião, uma vitória da oposição poderia ser danosa para a economia brasileira e causar o fechamento de empresas e vagas de emprego. No entanto, há também aqueles internautas que acreditam que a fala se tratou de uma ameaça velada aos trabalhadores.
No caso da segunda interpretação ser a correta, o gerente pode ter cometido um crime eleitoral, de tentativa de ‘coação eleitoral no ambiente de trabalho’. Em outras palavras, esse tipo específico de crime eleitoral ocorre quando patrões tentam manobrar os votos dos trabalhadores utilizando-se do seu poder econômico - sobretudo com ameaças de demissões veladas. A reportagem não conseguiu contato com a empresa e, assim que consegui-lo, esta nota será atualizada.
Já a prática de coação eleitoral em ambiente de trabalho foi muito documentada nas eleições de 2018 e neste ano já teve alguns episódios midiáticos, como o da socialite ruralista Roseli Vitória Martelli D'Agostini Lins. . Apoiadora fanática de Jair Bolsonaro (PL) e dona da Imbuia Agropecuária na cidade de Luiz Eduardo Magalhães, no interior da Bahia, ela virou alvo do Ministério Público do Trabalho (MPT) no último dia 6 de setembro após divulgar um vídeo em seu perfil no Instagram em que orienta outros ruralistas que "demitam sem dó" os funcionários que votarem em Lula (PT). Por ordem judicial, ela postou um vídeo recentemente nas redes sociais se desculpando e desautorizando a fala anterior, que acabou apagada. Neste ano, a maioria das denúncias de coação eleitoral vêm de empresas ligadas ao agronegócio.
Caso de 2018 do 'Véio da Havan' foi julgado em maio de 2022
O caso mais famoso foi protagonizado pelo empresário Luciano Hang, que além de ser dono das Lojas Havan e um dos investigados pela Polícia Federal pela difusão de discursos contrários à democracia e ao Estado de Direito, também chantageou seus funcionários em 2018 a fim de que votassem em seu candidato. É de conhecimento público a preferência de Hang pelo atual presidente Jair Bolsonaro (PL).
No último dia 20 de maio, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª região condenou a empresa Havan a pagar uma indenização de R$ 30 mil por assédio moral contra uma funcionária. A funcionária denunciou que o proprietário da empresa, Luciano Hang, o Veio da Havan, induziu os empregados da rede a votarem em Jair Bolsonaro em vídeo publicado no ano de 2018. "Luciano Hang dirigiu-se diretamente a seus funcionários, com vistas a induzi-los a votar em seu candidato, eis que, do contrário, suas lojas seriam fechadas e todos perderiam seus empregos, conduta essa ilegal e inadmissível, à medida que afronta a liberdade de voto e assedia moralmente seus funcionários com ameaças de demissão", escreveu a juíza Ivani Contini Bramante.
Já a auxiliar de vendas foi demitida após fazer boletim de ocorrência e relatou ainda ter sofrido perseguição por parte de um superior, que fazia comentários e provocações e chegou a agredi-la com arranhões.
“Coagir trabalhadores e trabalhadoras no local de trabalho a votar em determinado candidato é assédio eleitoral laboral. É crime. E tem de ser combatido, denunciado e punido. Não aceite calado, procure seu sindicato, denuncie”, avisa o presidente nacional da CUT, Sérgio Nobre, com base no aumento de casos e denúncias dessa prática criminosa nessa reta final da campanha eleitoral, cometida principalmente por aliados do bolsonarismo.