Jair Bolsonaro entrará no estúdio do Jornal Nacional, da TV Globo, no Rio de Janeiro, na noite desta segunda-feira (22), e sentará numa cadeira de frente para os apresentadores William Bonner e Renata Vasconcelos. Quando voltar do intervalo, o âncora do mais importante telejornal brasileiro anunciará o nome do presidente e informará que aquela é a primeira entrevista com os candidatos ao próximo mandato para o Palácio do Planalto. A previsão de duração para a “conversa” é de 40 minutos.
Uma verdadeira eternidade para um sujeito que não sabe dialogar com ninguém. Quem assiste qualquer gravação antiga, de até 30 anos atrás, do então deputado Jair Bolsonaro, até os milhares de vídeos do político de extrema-direita após ter se tornado chefe de Estado, sabe que não é possível estabelecer uma interlocução civilizada com ele. Gritos, interrupções, “opiniões” bárbaras e ultrajantes, acusações, xingamentos, ameaças e toda a caixa de ferramentas de um homem autoritário que despreza a democracia e os marcos civilizatórios.
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Há muita gente que acredita que a entrevista desta segunda-feira sequer chegará ao fim conforme o previsto. E essa possibilidade é muito real, uma vez que Bolsonaro já atacou e ofendeu inúmeras vezes Bonner e não consegue agir com respeito com uma só jornalista mulher. Mas o que preocupa mesmo a sua claque e seu círculo palaciano mais próximo são as perguntas que serão feitas, que certamente tirarão o presidente do eixo e o farão surtar (mais uma vez).
A primeira de todas essas preocupações é em relação a questões envolvendo as urnas eletrônicas. A obsessão de Bolsonaro por criticar com argumentos ridículos e infantis o sistema eleitoral brasileiro levou o país a uma crise institucional nos últimos meses. Embora pare de falar do assunto por alguns dias, ele o retoma e torna a falar barbaridades. Inevitavelmente uma cachoeira de groselhas aparecerá na entrevista no que diz respeito a isso.
O respeito à democracia é outro conteúdo sensível. Autoritário inveterado, fã de ditadores e entusiasta de ditaduras, inclusive da nossa, Bolsonaro deve soltar suas pérolas em tom tão amigável quanto um rottweiler faminto em fúria. Ao ser rebatido quanto a sua incivilidade e seu desprezo pelo Estado Democrático de Direito, certamente surtará, como de costume.
Corrupção também é um assunto que promete deixá-lo possuído. Quando posava de outsider, embora tivesse mais de 30 anos de vida política, Bolsonaro adorava falar sobre corrupção. A dos outros, claro. Nunca estiveram tão expostas as vísceras da roubalheira envolvendo seus filhos, os integrantes de seu governo, sua esposa e ele próprio. É certo que soltará o famoso “e o PT?”, “e o Lula?”, mas isso pouco deve adiantar, porque a dupla de apresentadores do JN deve apertá-lo e é aí que o monstro sai do controle.
Suas relações espúrias com o Centrão e com as raposas criminosas do Congresso e de algumas denominações evangélicas também são temas complicados para o presidente. Por ser chamado de “tchutchuca do Centrão”, ele desceu do carro oficial da Presidência e partiu para cima de um jovem na saída do Palácio da Alvorada.
Sobre suas ações assassinas durante a pandemia, como incentivar contaminações, indicar remédios sem eficácia, recusar vacinas, tirar sarro de mortos e doentes e agir com absoluto sadismo e morbidez, ele deverá tentar suas desculpas pueris e sem sentido, que saem aos trancos e barrancos de sua fala engasgada e ininteligível, cheia de anacolutos insuportáveis. Só que será rebatido e confrontado, e ali não é o seu cercadinho brasiliense, onde Bolsonaro nada de braçada e agrada aos seguidores de sua seita.
De tudo isso, o que se tem certeza absoluta é de que a participação do descompensado presidente no JN não será dentro da normalidade, porque em quase quatro anos de mandato, nenhuma participação em programas ou entrevistas de emissoras ou personalidades não alinhadas ao seu caótico governo foi normal. Sempre há maluquices, estrepolias, gritos, interrupções e um show de horrores, o que é sua marca registrada.