Após audiência de custódia realizada nesta sexta-feira (12) foi solta a estudante de 23 anos que havia sido presa no ato em defesa da democracia de ontem (11) em Florianópolis. Acusada de desacato, resistência à prisão, pichação e lesão corporal, a estudante nega as acusações e responde ao processo em liberdade.
Nos meios de comunicação locais é comum vermos a versão da polícia expressa nas matérias sobre o caso sem contraponto. Segundo essa versão, a estudante, que não teve a identidade revelada por questões de privacidade e segurança, teria feito pichações ao longo da cidade e, quando detida, resistiu à prisão, desacatou e mordeu um dos policiais, arrancando-lhe sangue.
Em depoimento exclusivo para a Revista Fórum, a advogada Daniela Félix, que faz a defesa da estudante, nega todas as acusações e denuncia uma manobra acusatória para mantê-la presa, mesmo sem necessidade. A advogada explica que o excesso de acusações por parte do delegado poderia somar penas que ultrapassariam os quatro anos, o que, pela lei obrigaria a manutenção da prisão da estudante.
“Ela foi enviada para o presídio feminino porque a soma das penas ultrapassava 4 anos e não foi arbitrado fiança. Ficou evidente que a intenção era o aprisionamento dela, a utilização do poder punitivo para prender politicamente essa manifestante”, conta a advogada.
Na audiência de custódia, o juiz homologou o flagrante e acompanhou tanto o Ministério Público como a advogada de defesa na sua soltura. Por ser estudante, ter residência fixa e não ter antecedentes, a acusada foi solta no meio da tarde de hoje. Ainda não se sabe os desdobramentos do processo, mas a advogada acredita que o Ministério Público não deva oferecer denúncia por falta de provas.
Ela está livre!! Ditadura Nunca Mais!
— Portal Desacato (@portaldesacato) August 12, 2022
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“Se você assiste o vídeo da prisão dela que rodou pelas redes sociais, fica claro que não houve desacato, resistência ou lesão corporal, conforme a acusam. Uma estudante com 50kg não teria como resistir, agredir ou tentar fuga sendo segurada por três policiais, sendo que cada um pesava quase o dobro dela”, explica Daniela Félix.
Sobre a suposta mordida, o policial afirmou em depoimento ter feito um exame pericial que, contudo, não está nos autos do flagrante. A defesa alega que além de não ter tido acesso ao laudo, o policial estaria naquela noite fria fardado com mangas cumpridas, o que dificultaria uma lesão por mordida humana. “Eu quero analisar as fotos que estão no auto de prisão em flagrante em uma qualidade melhor do que a que tive acesso. E além disso me estranha muito que no interrogatório filmado dentro da delegacia o próprio policial não tenha levantado a blusa e mostrado as marcas da suposta mordida ao delegado, deixado-as registradas na filmagem”, questiona a defesa.
Além disso, em relação a acusação de pichação, foram apreendidos com a estudante duas formas de stencil sem indícios de uso e uma lata de tinta guache, à base de água. Vale a nota de que esse tipo de material não serve para realizar uma pichação, pois qualquer contato com a água apagaria o suposto vandalismo. Seria o equivalente a ser acusado de esfaquear alguém com aquelas faquinhas de plástico, comuns em festas infantis.
“Com esses crimes atribuídos a ela, e da forma como foram, fica muito evidente pra mim que isso foi feito justamente para manter a estudante presa. Se fosse só a pichação, que eles dizem ter visto mas não apresentaram provas, ela teria assinado um termo circunstanciado no local do fato e não seria levada à delegacia com penas que somadas a mandariam direto para a prisão. O objetivo era justamente criminalizar essa manifestante. É uma prática recorrente. Sou advogada há muitos anos e entre 2013 e 2019 estive presente em todas as mobilizações de rua e de movimentos sociais aqui em Florianópolis. Acompanhei todas as prisões em flagrante que ocorreram aqui nesse período e o metiê é sempre o mesmo”, concluiu Daniela Félix.