A proposta de Soninha Francine, a nova secretária municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, de criar campings sociais para acomodar moradores em situação de rua, já encontra resistência.
O advogado Ariel de Castro Alves, especialista em políticas públicas de direitos humanos, integrante do Movimento Nacional de Direitos Humanos e presidente do Grupo Tortura Nunca Mais, tem uma posição contrária ao projeto.
“A proposta de campings sociais se assemelha aos estacionamentos para moradores em situação de rua nos Estados Unidos. O Poder Público precisa de soluções efetivas e não de projetos transitórios. A Praça da Sé, por exemplo, já virou um camping”, diz o advogado.
Ariel afirma que “camping social não pode ser considerado como política pública para a população de rua. Precisamos de vários programas e serviços como políticas públicas para essa população, conforme as peculiaridades de cada morador de rua e das famílias em situação de rua”.
Na avaliação do especialista em direitos humanos, a conduta correta seria oferecer “residências sociais, moradias populares, aluguéis sociais, auxílio moradia, regularização das ocupações dos prédios públicos e privados que estão subutilizados no centro de São Paulo e nos demais polos comerciais da cidade, repúblicas para jovens, residências terapêuticas para moradores de rua com doenças mentais e dependência de drogas e álcool, e a inclusão dessas pessoas em programas de formação profissional, geração de renda, escolarização de jovens e adultos, acompanhamento social e familiar, com rendas básicas, auxílios e bolsas sociais”, aponta Ariel.
Além disso, segundo ele, é necessário o reordenamento dos centros temporários de acolhimento, para que se tornem unidades menores, e ampliação dos serviços de centros dia para a população em situação de rua e dos serviços de acolhimento de famílias.
Ariel: “Precisamos ter espécies de Poupatempos sociais”
Ariel propõe que sejam criados espaços diferentes: “Precisamos ter espécies de Poupatempos sociais, que possam fazer a triagem e individualização dos atendimentos da população de rua e encaminhamento para os programas e serviços mais adequados, conforme as características e necessidades de cada pessoa ou família em situação de rua”.
O advogado reitera que outras propostas, como o camping social, são soluções paliativas, que não resolvem a situação da crescente população em situação de rua.
“Pelo contrário, pode gerar o aumento dessa população e reforçar a marginalização dessas pessoas em ‘guetos’, como forma de limpeza social, visando tirá-los das calçadas e praças das regiões centrais e das vistas de turistas, consumidores e comerciantes, para coloca-los em terrenos baldios. Pode gerar migração de pessoas e famílias de cortiços, pensões e favelas, na expectativa de que os campings, por serem iniciativa da prefeitura, possam ser portas de entrada para o encaminhamento para moradias populares”, acrescenta.
Ariel acredita, ainda, que muitas pessoas nessas condições podem retomar os vínculos familiares e voltar a viver em família, deixando a situação de rua, por meio de programas públicos efetivos de apoio e acompanhamento familiar.
Aumento de 230%
O último Censo da População em Situação de Rua, divulgado em janeiro, aponta que, em dois anos, a capital paulista registrou aumento de 230% dessas moradias improvisadas instaladas em vias públicas. Em 2019, eram 2.051 pontos do tipo. Em 2021, 6.778.
Entre 2019 e 2021, saltou de 24.344 para 31.884 o número de pessoas em situação de rua na capital paulista, um aumento de 31%, diz o levantamento.
Na pandemia, também houve uma mudança de perfil dos sem-teto. Se antes era mais comum se deparar pelas calçadas com homens solteiros, em geral usuários de álcool e drogas, hoje não é raro ver famílias, muitas despejadas de suas casas pela crise econômica. Segundo o censo, quase dobrou a quantidade de famílias que foram para as ruas neste período: de 4.868, em 2019, para 8.927 pessoas, em 2021.