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Ediane Maria: quem é a primeira doméstica e líder sem-teto eleita deputada estadual em SP

Nascida no sertão de Pernambuco, filha de pedreiro e feirante, Ediane se forjou na luta social através do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) e conquistou uma vaga na Alesp com mais de 175 mil votos

Ediane Maria, primeira empregada doméstica a ser eleita como deputada estadual na Alesp.Créditos: Divulgação/MTST
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Além de Guilherme Boulos (PSOL), que se elegeu deputado federal, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) tem mais uma liderança eleita: trata-se de Ediane Maria (PSOL), que conquistou uma vaga de deputada estadual na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). 

Mulher negra, mãe solo de 4 filhos e nascida em Floresta, no sertão pernambucano, Ediane, aos 38 anos, se tornou a primeira empregada doméstica a ser eleita deputada estadual em toda a história da Alesp. Tendo como principal bandeira o direito à moradia, a coordenadora do MTST obteve 175.617 votos. 

Em entrevista à Fórum, Ediane conta que saiu de sua cidade e foi para São Paulo para trabalhar como empregada doméstica aos 18 anos. "Vim pra cá seguindo o mesmo ciclo de minha mãe, vim para cuidar dos filhos da menina que minha mãe criou, vim ser babá dos filhos dessa menina em São Paulo. Vim por indicação da minha mãe pra trabalhar e fiquei a maior parte do tempo trabalhando como empregada doméstica", detalha. 

Ediane Maria (Divulgação/MTST)

A deputada estadual eleita revela que conheceu o MTST em 2017, na fila de distribuição de leite, no âmbito do programa Leve Leite, da prefeitura da capital paulista. "Quando meu fez 7 anos, automaticamente ele não tinha mais o direito de pegar o leite. E foi quando eu comecei a ficar na fila de espera da sobra do leite. E foi lá que comecei a me organizar com o povo. Eu chegava muito cedo, às 7 da manhã, pra garantir que às 9h eu conseguisse um litro de leite. Muitas vezes ia para casa de mãos vazias", relembra. 

"Com o MTST virei alguém" 

Nesta fila do leite Ediane conheceu uma militante do MTST, que a convidou para conhecer o movimento. Ela topou e, então, passou a fazer parte da Ocupação Povo Sem Medo, a maior da América Latina, em São Bernardo do Campo (SP), que chegou a contar com mais de 12 mil famílias. 

"Chegando lá, entendi que o sertão que eu deixei para trás, em busca de oportunidades, encontrei nas ocupações do MTST. É lá que encontrei solidariedade e lá que comecei a virar uma liderança, virei coordenadora do MTST. Todo o companheirismo me fez ter resgatado essa visão de sociedade, de pertencer a algum lugar", pontua. De lá para cá, Ediane atuou em diversos setores do movimento e se tornou uma de suas maiores lideranças em São Paulo. 

"Eu sempre falo que São Paulo tirou minha identidade, eu era empregada de alguém. Nas ocupações eu voltei a ser a Ediane. Ganhei apelidos carinhosos, como Pom Pom, virei alguém. E é isso que me motiva a continuar lutando sempre", prossegue a líder sem-teto. 

Ediane deputada 

Segundo Ediane, a ideia de sua candidatura a deputada estadual surgiu através de um "consenso coletivo" no MTST e começou a ser trabalhada já em 2018, quando Guilherme Boulos, um dos líderes do movimento, foi lançado à presidência da República. 

Ediane Maria e Guilherme Boulos (Divulgação/MTST)

"Entrei [no MTST] como todo mundo, de igual, pela minha casa, minha moradia, e chegando lá entendi que a luta estava para além. Não queremos só moradia, queremos saúde, educação, transporte de qualidade. Aprendi a lutar pela cidade que queremos", atesta. 

Além do direito à moradia, Ediane Maria, que é madrinha do projeto Cozinhas Solidárias do MTST, afirma que, como deputada estadual, terá entre suas principais bandeiras a luta contra a violência doméstica e por mais cultura nas periferias. 

"A Delegacia da Mulher está no centro e a gente precisa do Estado também na periferia. Não dá mais pra gente ser as maiores vítimas da violência doméstica e muitas de nós não conseguirmos o acolhimento devido, e muito menos uma delegacia próxima de nossas residências. Quero também que a cultura chegue na periferia, é importante ter sarau, roda de conversa, é assim que a gente abre mentes, assim que a gente conscientiza, politiza as pessoas, foi assim que eu aprendi dentro do MTST", assegura.