Um enorme cordão humano à beira-mar, formado pela comunidade pesqueira da Praia do Arpoador, no município maranhense de Tutóia, conseguiu evitar, nesta quinta-feira (19), o despejo de mais de 100 famílias que habitam o local há pelo menos um século.
Em decisão liminar, a juíza da comarca de Tutóia deu reintegração de posse para a empresa de energia eólica da Vita Energias Renováveis Ltda. A decisão judicial alega que a empresa tem um contrato de aluguel da área por 30 anos, mas ignora, no entanto, a permanência secular da comunidade no local.
Segundo explicou à Fórum o advogado Diogo Cabral, defensor dos direitos de povos e comunidades tradicionais, “com o avanço da energia eólica no Brasil, especificamente no Maranhão, a empresa passou a cercar essa área, até porque ela fez um contrato de arrendamento”. De acordo com ele, “como há a permanência de pessoas dentro da área, que é muito grande, não há definições claras de limites, é uma área de praia, a empresa ajuizou neste ano três ações de reintegração de posse contra algumas pessoas e houve uma decisão judicial em agosto que determinou a reintegração em favor da empresa”.
Cabral diz ainda que “como a área é grande, outras pessoas que não estão dentro do processo e sequer sabiam dele, vão ser afetadas”. Ele lembra também que no Maranhão existe uma Comissão Estadual de Violência no Campo, que foi criada por lei estadual em 2015, que analisa todos esses processos que envolvem conflitos agrários. “Esse processo não passou pela Comissão”, alerta. “A polícia foi cumprir a ordem sem passar pela comissão. Pela manhã, nós informamos à Comissão sobre a situação de despejo, solicitamos que fosse feito um relatório de situação para saber a dimensão da área, como as comunidades serão afetadas e solicitamos que, de maneira cautelar, a operação fosse suspensa. Por conta desse aspecto legal, foi solicitada a suspensão da ação de reintegração até a adoção de relatórios que venham a corroborar com eventual cumprimento da decisão. O clima é tenso, porque muitas pessoas não sabem de fato se serão afetadas ou não pela decisão”, concluiu.
A polícia chegou com um forte aparato para cumprir o mandado de reintegração de posse, que reuniu vários policiais, tratores e até helicópteros. A comunidade fez uma barreira humana para impedir a entrada no território e após uma articulação política com a Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular (SEDIHPOP) do Maranhão, a reintegração de posse foi interrompida.
A ação, no entanto, pode ser retomada a qualquer momento, conforme explicou Diogo Cabral. “A situação está bem tensa no local. Há o temor de que a polícia volte com mais força”, reiterou o agente da Comunidade Pastoral dos Pescadores do Maranhão, José de Maria Silva que está acompanhando a comunidade no local.
De acordo com informações da CPP, os comunitários estão em vigília neste momento, “no aguardo de mais informações e dispostos a lutarem pelo seu território. Essa não é a primeira vez que a comunidade está sendo ameaçada de ser expulsa. Já há algum tempo os moradores do local têm resistido à especulação imobiliária na região”.