O ministro da Educação, Milton Ribeiro, atuou nos bastidores a favor de um centro universitário denunciado por fraude no Enade 2019.
O centro universitário presbiteriano Unifil, de Londrina, contou com a ajuda do ministro da Educação, Milton Ribeiro, em processo onde é investigada por fraude que teria ocorrido no curso de biomedicina, a partir do vazamento da avaliação do ensino superior, durante o Enade 2019.
A instituição é presbiteriana, assim como o ministro, que é pastor.
O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) concluiu com a investigação haver fortes indícios, sobretudo estatísticos, de fraude após a coordenadora da graduação ter tido acesso à prova e às respostas com antecedência.
Ribeiro tratou do caso pessoalmente. Ele recebeu os controladores da instituição e viajou a Londrina no meio do processo, além de ter determinado que seu próprio secretário acompanhasse uma visita de supervisão.
O chanceler da Unifil é o pastor Osni Ferreira, líder da Igreja Presbiteriana Central de Londrina e apoiador do presidente Jair Bolsonaro (Sem Partido). Seu irmão Eleazar Ferreira é o reitor. Em março do ano passado, Osni convocou uma carreata para defender o presidente e criticar restrições de circulação.
Osni e Eleazar foram recebidos por Ribeiro em seu gabinete em 2 de setembro do ano passado. No dia 26 do mesmo mês, um sábado, Milton Ribeiro viajou à Londrina, sem assessores da pasta, para visitar a Unifil. Ele deu uma aula e concedeu entrevista com elogios à instituição.
De acordo com pessoas próximas, o ministro protelou o envio do caso da Unifil à Polícia Federal. A área técnica e a Procuradoria do Inep haviam concluído pela necessidade da investigação criminal desde meados de 2020.
Ribeiro teria chegado a ameaçar de demissão lideranças do Inep caso a investigação fosse levada à PF.
A informação sobre a atuação de Ribeiro foi confirmada ao repórter Paulo Saldaña, da Folha por três pessoas do alto escalão. O recado teria sido dado pelo secretário-executivo da pasta, Victor Godoy Veiga. O ministro e seu principal assessor foram claros sobre o motivo para impedir a apuração criminal: tratava-se de uma instituição presbiteriana.
Um ofício só foi levado à Polícia Federal em fevereiro deste ano, após o MEC ter encerrado a investigação de forma favorável. Foram ignoradas na decisão evidências estatísticas da fraude apuradas pelo Inep.
O MEC informou em nota que o caso foi enviado à autoridade policial. "Toda a apuração foi realizada pelo MEC de maneira técnica, observando-se os dispositivos legais. Todos os atos administrativos praticados estão adequadamente registrados no processo administrativo encaminhado na íntegra à Polícia Federal pelo MEC em fevereiro de 2021".
A Unifil não respondeu aos questionamentos enviados desde o dia 27 de abril.
O resultado do Enade compõe indicadores de qualidade e impacta na regulação —desempenhos ruins podem provocar o fechamento do curso?.
Uma semana antes do Enade, em 17 de novembro de 2019, o Inep recebeu uma denúncia anônima. Nela, um aluno afirmou que a coordenadora de biomedicina na Unifil, Karina Gualtieri, teria vazado questões e o gabarito aos estudantes naquele mês. O objetivo era obter nota máxima, o que ocorreu.
Gualtieri teve, de fato, acesso ao material com antecedência: ela faz parte da comissão que elaborou a avaliação para o governo. Gualtieri não respondeu à reportagem. Por conta disso, a denúncia chamou atenção no Inep.
O Inep manteve o exame para depois averiguar os dados. Técnicos do Inep então compararam o desempenho da Unifil com a média dos cursos de biomedicina do país e também com os de nota máxima. Concluiu-se que era estatisticamente impossível que a Unifil conseguisse o resultado alcançado.
Com informações da Folha