O presidente Jair Bolsonaro mudou de ideia e avisou ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (6), que agora quer depor pessoalmente no inquérito que investiga suposta interferência política na Polícia Federal (PF).
A Corte analisaria, nesta quarta, uma solicitação do próprio Bolsonaro para depor por escrito. Porém, com a mudança de posicionamento do presidente, o caso não chegou a ser julgado.
Em outubro de 2020, o STF iniciou apreciação sobre o caso da PF. À época, o relator era o ministro Celso de Mello, que declarou não ser admissível a concessão de “privilégios” e “tratamento seletivo” e defendeu que Bolsonaro fosse depor presencialmente à polícia.
Alexandre de Moraes, substituto de Celso de Mello na relatoria, negou o pedido do presidente para não depor, justificando que caberia ao plenário definir como seria o interrogatório, se presencial ou por escrito. Com a nova decisão de Bolsonaro em depor pessoalmente, o julgamento sobre o formato do depoimento foi cancelado.
Nos bastidores, especula-se que Bolsonaro tenha adotado a estratégia pois, se o julgamento desta quarta-feira acontecesse e fosse determinado que ele prestasse depoimento pessoalmente, se abriria um precedente para que ele não pudesse depor por escrito em outros eventuais inquéritos.
À Fórum, no entanto, a advogada criminalista Jessica Boldi, colaboradora da Metzker Advocacia, explicou que "não há, em nosso ordenamento jurídico, previsão legal para manifestação por escrito para investigados".
"Assim, o presidente será interrogado nos termos do art. 185 e seguintes do Código de Processo Penal, sobre os fatos que ensejaram a investigação e terá a faculdade de responder o que for perguntado ou permanecer em silêncio", diz.
Investigação perto do fim
A investigação a respeito de denúncias do ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, sobre interferência de Bolsonaro na PF corre desde abril de 2020 e foi prorrogada inúmeras vezes. A abertura de inquérito junto ao STF havia sido solicitada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Moro acusou o presidente de ter trocado o comando da PF para conseguir acesso a investigações do órgão de modo a proteger familiares e aliados políticos de investigações. A gota d'água foi a demissão do delegado Maurício Valeixo, que tinha sido escolhido por Moro para a direção-geral da instituição.
Segundo a advogada Jessica Boldi, o depoimento de Bolsonaro à Polícia Federal, que ainda será marcado, é um indicativo de que a investigação pode estar próxima a ser concluída.
"O interrogatório, quando não se há outra prova a ser produzida, é último ato a ser praticado antes de serem encerradas as investigações. Assim, o presidente, além de responder as perguntas que lhe forem feitas, também poderá defender-se sobre os fatos e acusações feitas pelo ex-ministro Sérgio Moro", esclarece.
"Isso significa dizer que a autoridade pode estar prestes a concluir as investigações do inquérito para verificar se há indícios de autoria e prova da materialidade de que o presidente Jair Bolsonaro tenha interferido politicamente na Polícia Federal e cometido uma série de outros crimes comuns, como falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administrativa, prevaricação, obstrução da justiça e corrupção passiva privilegiada, todos indicados pela PGR", prossegue a advogada.
Afastamento
De acordo com a criminalista, caso o inquérito do STF confirme que Bolsonaro, de fato, interferiu politicamente na Polícia Federal, a PGR poderá apresentar denúncia contra o mandatário, que deverá ser autorizada pela Câmara dos Deputados para o avanço das acusações.
"Se a Câmara autorizar, o STF irá decidir pelo recebimento ou não da denúncia. Assim, aceita a denúncia, o presidente será afastado por 180 dias e passará a responder por processo criminal, onde pode ser condenado pelos crimes eventualmente imputados", atesta.
Ao todo, Jair Bolsonaro é alvo de quatro inquéritos no STF e de 8 ações que tramitam no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).