Quem são Alan e Alex, os PMs ‘nota mil’ de Flávio Bolsonaro

Irmãos da tesoureira do PSL-RJ foram denunciados por vínculo à organização criminosa: desembolsos mensais de R$ 1 mil para manter loteamento irregular na Zona Oeste do Rio

Reprodução/Instagram
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Por Rogério Jordão, do Rio de Janeiro, especial para a Fórum  “Policiais presos em operação no Rio participaram de campanha de filho de Bolsonaro”. Com este título, o jornal O Estado de S. Paulo, de 5 de setembro de 2018, apresentava a foto que abre este texto. Retirada do Instagram de Flávio Bolsonaro, publicada com a legenda “Parabéns Alan e Alex pelo aniversário, essa família é nota mil!!!”, o Estadão foi o único jornal a noticiar, durante a campanha eleitoral, a prisão dos policiais militares Alan e Alex Rodrigues de Oliveira, de camisa listrada na imagem. Gêmeos, que na ocasião da foto, outubro de 2017, completavam 47 anos, são irmãos da tesoureira do PSL do Rio, Valdenice de Oliveira Meliga, que também aparece na imagem ao lado de Flávio e do então deputado federal e atual presidente Jair Bolsonaro. Segundo a reportagem do jornal paulista, os policiais participaram, até serem presos, de atividades da campanha de Flávio ao Senado na Zona Oeste. Na região, e conforme denúncia do Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro (ver abaixo), ambos mantinham um loteamento ilegal, no bairro de Paciência, alvo de duas operações policiais em 2018. Uma em janeiro, apenas três meses depois da foto “nota mil”, e a outra em abril, nos primórdios da campanha eleitoral. Não investigada pela imprensa ao longo das eleições, a imagem do aniversário voltou ao noticiário, desta vez nas páginas da revista Época de 29 de janeiro de 2019, no bojo das revelações sobre os elos de funcionários do gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) com acusados de ligações com milicianos e os enroscos do ex-assessor Fabrício Queiroz. Mas, ainda assim, sem maiores detalhes, a não ser de que os irmãos PMs foram “acusados de extorsão”. A quem ou de quem, exatamente? A denúncia do Ministério Público Estadual (MPE), da segunda fase da Operação Quarto Elemento, deflagrada em agosto de 2018, que levou os irmãos “nota mil” a terem a prisão preventiva decretada, e que motivou a já citada matéria do Estadão, é longa e detalhada. Tem 236 páginas. Nela está descrito um esquema incrustado na Polícia Civil carioca, a partir das delegacias de Bangu e posteriormente Santa Cruz, ambas na Zona Oeste, responsável por diversos crimes, como corrupção, extorsão, desvio de mercadorias apreendidas (principalmente cigarros), entre outros. Neste esquema, do qual participavam mais de 40 policiais, os irmãos Alan e Alex figuram como sendo de um escalão hierárquico menos importante. Na estrutura da organização são identificados, pelos promotores, como “amigos”. Ou, segundo a denúncia: “pagadores regulares de propina aos policiais e seus prepostos”, conforme a página 23 da denúncia. “Amigos”, aqui, no sentido de que participariam de acertos periódicos de dinheiro, em um caso aparentemente pouco comum, em que policiais (militares) pagavam a policiais (civis), conforme o MPE. Alan e Alex são acusados de terem desembolsado R$ 1 mil ao mês, ao longo de 2017 (mesmo ano da foto “nota mil”), a policiais civis de Santa Cruz, para poderem manter um empreendimento imobiliário irregular longe da fiscalização. O terreno, chamado de Gabriela Residencial, chegou a ter material de propaganda confeccionado. Os lotes eram oferecidos a partir de R$ 600 mensais, com a possibilidade de aceite de carros como entrada.
[caption id="attachment_166309" align="aligncenter" width="448"] Anúncio do “Gabriela Residencial”. (Reprodução)[/caption]
Segundo o MPE, os investigadores, liderados por um delegado da Polícia Federal, chegaram, pela primeira vez, em janeiro de 2018, até o loteamento ilegal de Paciência a partir da colaboração de um informante, no bojo das investigações da Operação Quarto Elemento. O objetivo era verificar, como de fato ocorreu, a existência do empreendimento, um pedaço descampado de terra na altura do número 1300 da Rua Agaí, o que sustentaria a parte central da denúncia, a existência dos pagamentos ilícitos. Preso em flagrante no local por crime ambiental, junto com outro sócio, ao carregar “areia e minério”, conforme documento da Justiça, em caminhões, o policial Alan foi posto em liberdade provisória na sequência, em 24 de janeiro, por não representar “situação de risco para a ordem pública e econômica”, conforme deliberação da juíza da 7ª Vara Federal Criminal, Caroline Vieira Figueiredo. O crime ambiental prevê prisão de 6 meses a 1 ano e multa. A despeito da diligência policial de janeiro, entretanto, o empreendimento prosseguiu. Em 25 de abril de 2018 uma nova incursão ao terreno, desta vez no bojo de uma operação mais ampla contra as milícias na Zona Oeste, foi realizada pela Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA), da Polícia Civil. Em sua página no Facebook, na ocasião, embora sem citar os policiais Alan e Alex, uma nota da DPMA apontou nominalmente o condomínio Gabriela, entre outros da região, onde haveria “parcelamento irregular do solo”. Embora enfatize que a dita Operação, chamada de Nocaute, e que envolveu diversas delegacias especializadas na Zona Oeste, tenha sido contra as milícias, a nota oficial da DPMA não vinculava diretamente os condomínios alvos de buscas a milicianos. Quatro meses depois, em agosto de 2018, Alan seria preso pela segunda vez, desta vez preventivamente, junto com o irmão, Alex, no bojo da já citada denúncia da segunda fase da Operação Quarto Elemento, do MPE. No relatório a palavra ‘milícia’ não aparece. As atividades policiais investigadas são, conforme os promotores estaduais, de outra natureza. Na condição de “amigos”, os PMs Alan e Alex foram denunciados por promover, constituir, financiar e integrar organização criminosa. Presos preventivamente em agosto de 2018 foram soltos em dezembro. O processo corre na Segunda Vara Criminal de Santa Cruz.
No início de fevereiro deste ano o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, autorizou a retomada das investigações sobre as transações do ex-assessor de Flávio Bolsonaro na Alerj, Fabrício Queiroz. Desde que foram reveladas, em dezembro, o caso cresceu, com a descoberta de que a mulher e a mãe do ex-capitão Adriano Magalhães da Nóbrega, suspeito de chefiar a milícia de Rio das Pedras, na Zona Oeste, eram funcionárias do gabinete de Flávio. Em 2018, durante a campanha eleitoral, quando da prisão dos PMs Alan e Alex, o então deputado estadual disse ao Estadão desconhecer o teor das acusações: “Não sei se é grave ou não. Não parei para ver ainda”. No atual contexto, porém, o caso dos policiais “nota mil” poderá ganhar outra relevância. Em relação a Flávio e seu entorno, o rol de perguntas é extenso.

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