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[caption id="attachment_165238" align="alignnone" width="618"] Foto: Agência Brasil[/caption]
A longa trajetória política de Jair Bolsonaro e sua família sempre foi pautada por um absoluto desrespeito à imprensa e à liberdade de expressão e informação. Essa característica foi ganhando contornos mais amplos, na medida em que o militar foi se aproximando do poder. Agora, na presidência, já deu mostras de que vai recrudescer ainda mais essa prática.
O exemplo mais recente foi o processo contra a Fórum movido pelo atual presidente da República e por seu filho, Eduardo Bolsonaro. A revista está sendo processada junto com o fotógrafo Luiz Araújo Marques, o Lula Marques, pela publicação feita por ele e divulgada pela Fórum de uma conversa de Bolsonaro com Eduardo, em que num dado momento o pai diz que não vai visitar o filho na Papuda.
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Segundo Paulo Zocchi, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, a entidade avalia a iniciativa como um atentado à liberdade de imprensa, uma tentativa de censurar a livre informação jornalística no Brasil.
“O novo presidente e as pessoas que o apoiam já mostraram que são inimigos da liberdade de informação. A vida pública pregressa do Bolsonaro sempre se notabilizou por uma postura de hostilidade à liberdade de informação e expressão. O presidente e o grupo que o apoia diretamente querem impedir que informações de interesse público circulem. A ideia de processar é a tentativa de calar, de bloquear o exercício do jornalismo, de impedir a liberdade de imprensa”, analisa Zocchi.
Maria José Braga, presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), lembra que recorrer à justiça é um direito do cidadão e da cidadã que se sentir prejudicado/difamado por informação veiculada pela mídia. “Mas esse recurso tem de estar fundamentado na legislação em vigor que prevê três crimes de opinião: a injúria, a calúnia e a difamação”, explica.
“Ninguém deve recorrer à Justiça contra veículos de comunicação e contra jornalistas porque não ‘gostou’ da informação veiculada, quando esta informação não constituiu um desses crimes de opinião. Isso fica ainda mais obrigatório para as pessoas que estão na vida pública. Por dever, jornalistas devem informar à sociedade o que os agentes públicos fazem e dizem, mesmo que isso cause danos à imagem que querem passar para o público”, afirma.
Dentro dessa perspectiva, segundo Maria José, Jair e Eduardo Bolsonaro, como políticos profissionais e, portanto, homens públicos, deveriam adotar o procedimento de respeitar o trabalho jornalístico.
“Mas, ao contrário, recorreram à justiça contra a Revista Fórum e o jornalista Lula Marques para tentar cercear o trabalho desenvolvido. É, claramente, uma forma de intimidação”, diz.
Princípios éticos
No processo contra a Fórum e Lula Marques, os Bolsonaros pedem indenização e alegam “uso abusivo de imagem e violação de privacidade e conduta difamatória”, o que é facilmente descartado pelos dirigentes.
“Lula Marques realizou uma atividade jornalística da mais alta relevância, respeitando todos os princípios éticos do jornalismo, divulgando uma matéria de interesse amplo, socialmente falando. E a Revista Fórum, ao publicar e divulgar a notícia, fez sua obrigação e cumpriu seu papel de órgão noticioso da imprensa brasileira”, avalia Zocchi.
[caption id="attachment_165225" align="alignnone" width="550"] Paulo Zocchi: “O novo presidente e as pessoas que o apoiam já mostraram que são inimigos da liberdade de informação” - Foto: Arquivo Pessoal[/caption]
“Evidentemente que se Jair Bolsonaro quisesse privacidade, tinha que conversar no WhatsApp em algum lugar privado, mas estava no plenário da Câmara dos Deputados. E ele, candidato à presidência da Câmara naquela ocasião, estava conversando com outro deputado, que, além do mais, vinha a ser seu filho e não estava presente para votar nele. Então, tudo isso tem interesse público, sim, é relevante, sim. Não tem nada de privado nessa história”, relata Zocchi.
O sindicalista acrescenta que o fato de Bolsonaro estar digitando no Whatsapp em sua bancada na Câmara indica que ele está exibindo o WhatsApp, porque está num local público, tratando de um assunto público, com pessoas públicas. “Então, o flagrante jornalístico do Lula Marques merece elogios e a divulgação dele merece defesa, sustentação e apoio.”
Maria José segue na mesma direção: “No caso em questão, alegar violação de privacidade, uso abusivo de imagem e conduta difamatória é tentar induzir o Judiciário ao erro. O registro fotográfico foi feito durante sessão da Câmara dos Deputados, na qual o então deputado Jair Bolsonaro utiliza o telefone no plenário (local mais que público). E como alegar conduta difamatória, se a imagem feita pelo jornalista Lula Marques é a prova das informações veiculadas?”, questiona.
Ameaça
A relação do Bolsonaro com a mídia, até o momento, é de intimidação e de tentativa de impedir o livre exercício do jornalismo. Zocchi menciona um exemplo.
“Isso aparece no momento logo após a posse, quando ele ataca violentamente a Folha de S.Paulo e a jornalista Patrícia Campos Mello pela reportagem que revelava uma questão crucial: o fato que, de maneira fraudulenta, empresas privadas turbinaram as fake news no WhatsApp para beneficiar a candidatura do Bolsonaro. Ele, inclusive, colocou em questão, retoricamente, a própria existência do jornal”.
O presidente do sindicato cita, ainda, a prática adotada por Bolsonaro de se negar a conceder entrevistas coletivas, de selecionar com quem fala, de dar entrevistas em situações em que esteja confortável. “Vamos lembrar a ausência total em debates, a partir de certo momento de campanha, a negativa de expor as ideias, de se submeter ao crivo, de fato, do eleitorado.”
Além disso, depois da posse, Bolsonaro sempre se posicionou no sentido de impedir a livre comunicação de interesse público. “O governo federal lida, através do presidente, do vice e de seus ministérios, sempre com informações de relevância. Então, é claro que um aspecto importante e democrático da prática de governar deveria ser a disseminação generalizada das informações de interesse público. Ele se opõe a isso de maneira cabal”, reflete.
Assim que se deu a eleição de Jair Bolsonaro, a Fenaj divulgou nota alertando os profissionais e a sociedade em geral que a democracia e a liberdade de imprensa estavam ameaçadas. “Fizemos isso em razão do comportamento do deputado e, principalmente, do Jair Bolsonaro candidato, que, mais de uma vez, deixou claro seus posicionamentos antidemocráticos”, relembra Maria José.
A presidenta da Fenaj acrescenta que a sociedade brasileira o elegeu e, mesmo antes da posse, ele ameaçou veículos de comunicação. No dia da posse, jornalistas brasileiros e estrangeiros foram submetidos a situações constrangedoras, tiveram restrições ao seu trabalho e chegaram a ser ameaçados por assessores.
“No último dia 24, o governo alterou a Lei de Acesso à Informação (LAI), que pode torná-la letra morta. Infelizmente, ou a sociedade brasileira reage e exige a volta da democracia e o respeito às instituições democráticas ou viveremos tempos ainda mais sombrios”, afirma.
Censura e violência
Na avaliação de Paulo Zocchi, há, na América Latina, uma onda conservadora. “Vivemos numa região que é área de influência dos Estados Unidos, que exerce aqui um tipo de controle bastante pesado. Nesse momento, a ofensiva do império americano sobre a América Latina está particularmente forte”, diz.
Esse controle, prossegue o sindicalista, tem conseguido influenciar diretamente a situação política de diversos países, como a Venezuela, que está sob uma pressão brutal norte-americana. “A gente vê de maneira mais ampla na América Latina uma ofensiva contra a liberdade de imprensa. Essa é a tônica do Trump, um presidente que hostiliza a imprensa e quer bloquear a livre circulação de notícias no país. Isso é um vírus que está espalhado pela América Latina e que cabe a todos nós combater”.
A Fenaj lançou, no último dia 18, seu relatório da Violência contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil, ano 2018. Foram registrados, no ano passado, 135 casos de agressões, vitimando 227 profissionais (em alguns casos mais de um profissional é vitimado), informa Maria José.
“Toda violência contra jornalistas é uma tentativa de cerceamento da liberdade de imprensa e, claro, entre as violências cometidas há casos de censuras explícitas, inclusive de censuras prévias. Infelizmente, no Brasil, a censura, apesar de ser terminantemente proibida pela Constituição, é praticada por empresas de comunicação (atendendo a interesses econômicos, políticos e pessoais)”, reflete.
[caption id="attachment_165226" align="alignnone" width="550"] Maria José Braga diz que processo é “claramente uma forma de intimidação contra a revista Fórum e o jornalista Lula Marques” - Foto: Arquivo Pessoal[/caption]
E isso acontece não somente nos setores ligados à comunicação. “Até mesmo pelo Poder Judiciário, quem deveria garantir as liberdades de imprensa e de expressão. Para citar um exemplo recente, o Supremo Tribunal Federal, por decisão de seu presidente Dias Toffoli, proibiu jornalistas de entrevistarem o ex-presidente Lula e proibiu os veículos de comunicação de divulgarem entrevistas que tivessem sido feitas. Censura prévia a partir do órgão que deveria garantir o cumprimento da Constituição”, protesta Maria José.
Combate
Para combater a tentativa de intimidação por parte do governo Bolsonaro, os dirigentes apontam caminhos.
“O Sindicato dos Jornalistas, a Federação Nacional dos Jornalistas e o conjunto das nossas entidades têm que aumentar a militância em defesa da liberdade de imprensa, buscando de todas as formas, através de pronunciamentos, declarações, manifestações, ações judiciais e institucionais, levar à sociedade a consciência do risco que correm a liberdade de imprensa, de informação e os próprios direitos democráticos no nosso país”, aponta Zocchi.
Além disso, acrescenta, é preciso afirmar a importância desses fatores na vida de cada um, para que o país possa combater todas as suas mazelas: desigualdades sociais, pobreza, miséria e exploração desenfreada. “O que pode ser feito é um conjunto de atividades, mantendo como pauta permanente a defesa da liberdade de expressão e da democracia”.
Para isso, afirma Zocchi, o Sindicato dos Jornalistas está permanentemente pronto para atividades, pronunciamentos em defesa da liberdade e da ética jornalística, e de toda atividade que combata a censura dos meios de comunicação. “Podem contar com a gente, estamos à disposição e sempre prontos a participar de todas as ações que defendam esses princípios que para nós são caros”, completa.
A Fenaj e o sindicato fazem, permanentemente, denúncias de casos de violência contra jornalistas, entre elas as intimidações. “A denúncia é importante para inibir quem quer cercear a liberdade de imprensa. Também é importante que os veículos de comunicação denunciem e sejam solidários uns com os outros, o que, infelizmente, não ocorre no Brasil”, lamenta Maria José.
Outra frente de trabalho é o envolvimento do Poder Judiciário no debate sobre liberdade de imprensa. “Temos tido bons resultados pelo Brasil afora, mas ao mesmo tempo ainda é grande o número de decisões judiciais que cerceiam a liberdade de imprensa”, finaliza.
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