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POLÍTICA
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[caption id="attachment_145522" align="alignnone" width="480"] Foto: Reprodução/YouTube[/caption]
Por Victor Maia*
As democracias ocidentais parecem caminhar em direção ao colapso iminente. Em vários países da Europa e das Américas, candidatos têm chegado ao poder sem endossar qualquer compromisso com o fortalecimento das democracias que os elegem. Ao contrário, muitos deles têm sido eleitos com discursos de ódio sectário, ataque aos direitos civis, à imprensa, aos partidos políticos e às minorias identitárias. Esse cenário de recessão democrática no mundo deve nos alertar para o fato de que as democracias devem ser defendidas permanentemente, sob o risco de sucumbirem às demagogias autoritárias.
Embora os contextos nacionais em que as democracias se desenvolvem sejam singulares e, de algum modo, incomparáveis entre si, há uma linha estrutural comum a todas elas. Isso é o que chamo aqui de “diagrama democrático”. Trata-se de perceber como as democracias ocidentais se realizam a partir de componentes fundamentais, que vão desde a manutenção de condições básicas de diálogo entre os indivíduos que endossam visões de mundo divergentes, até o interminável fortalecimento das instituições jurídicas e políticas que sustentam a democracia.
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Mas as instituições não são capazes, por elas mesmas, de instaurar, desenvolver e manter o empreendimento democrático. É preciso, além disso, que os agentes políticos endossem comportamentos norteados por uma visão de razoabilidade e de justiça social que sirva de freio a possíveis investidas autoritárias e antidemocráticas. Ou seja, é necessário que as lideranças político-partidárias encontrem meios de coexistência dentro das tensões e divergências ideológicas de uma determinada sociedade.
No aclamado livro “Como as democracias morrem” (Zahar, 2018), os pesquisadores da Universidade de Harvard, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, referem-se a essas condições como esquemas informais de freios e contrapesos democráticos. Nesse sentido, seria preciso privilegiar a tolerância mútua e as rivalidades legítimas como instrumentos fundamentais de manutenção da ordem democrática.
Com o avanço da recessão democrática e da escalada autoritária observado nos últimos anos ao redor do mundo (Itália, Hungria, Venezuela, Polônia, dentre outros) é possível perceber como o seu desmantelamento não se dá mais, necessariamente, de forma espetaculosa e bélica. As democracias definham lentamente, de modo mais ambíguo e menos visível. Entretanto, esse processo não se dá sem que os sintomas do adoecimento democrático se apresentem.
A ascensão de líderes nacionais demagogos ao poder tem nos mostrado, nos últimos anos, algumas estratégias de enfraquecimento democrático em comum. De um modo pouco evidente para a maior parcela da população, as democracias são postas em xeque – até mesmo sucumbem. Embora muitos desses mecanismos que solapam as democracias sejam invisíveis a olhos nus, algumas ações evidenciam o cansaço democrático de algumas nações.
O ataque a jornalistas, as chantagens à imprensa com o corte de verbas públicas de publicidade, a criminalização dos movimentos sociais, as tentativas de aniquilamento dos partidos opositores, a histeria anticomunista e o uso deliberado de informações falsas pelos mandatários para convencer parte do eleitorado são apenas algumas das ações que fazem soar os alarmes da derrocada democrática.
As razões para o arrefecimento das democracias ocidentais são variadas e conhecidas. Destacam-se as crises econômicas, que geram instabilidade das classes médias e o aumento do desemprego entre a classe trabalhadora; o avanço das conquistas das minorias identitárias e da agenda progressista, como o casamento gay, a legalização do aborto, as políticas afirmativas e o empoderamento feminino; além do exponencial crescimento das formas conservadoras de profissão de fé nos países não europeus, principalmente do protestantismo.
Cenários como esse, somados a instituições jurídicas e políticas fragilizadas, potencializam as condições de hostilidade popular à democracia e de desconfianças em relação ao establishment político. Nesse contexto, os discursos antipolítica dos “outsiders” permeiam facilmente a opinião pública, facilitando a ascensão ao poder de perfis hostis à ordem democrática.
Para muitos brasileiros, principalmente os nascidos a partir dos anos 1980 – a chamada geração dos millenials –, a democracia é um valor autojustificado, um empreendimento infinitamente autossuficiente. Crescemos num intervalo de consolidação democrática que não nos ensinou que as democracias podem sucumbir ao extremismo, se os indivíduos e as instituições responsáveis pela sua manutenção capitularem.
Ao eleger o primeiro presidente de extrema direita de sua história, o Brasil põe à prova a força de suas instituições enquanto mecanismos de contrapeso às investidas autoritárias. Embora a esquerda latino-americana esteja em processo de crise e reformulação de suas diretrizes de ação, muito provavelmente foram os partidos de direita e de centro-direita os efetivamente derrotados no pleito de 2018. Com a perda da sua capacidade de ser porta-voz da classe média, esses partidos viram sua representação no Congresso diminuir substancialmente.
Um dos caminhos possíveis para a defesa da democracia a partir de agora passa pela tentativa de moderar a polarização vista nos últimos anos. Apostar numa oposição que não endosse a política do “quanto pior, melhor” também será importante. Opor-se a qualquer tipo de autoritarismo pelas vias do aumento da polarização e da estridência política pode ser o combustível para o rompimento democrático. Trata-se, nesse sentido, de reunir esforços de todos os espectros políticos em torno do fortalecimento das instituições. Uma coalizão interpartidária, que reúna tanto amigos quanto adversários políticos, evidenciando assim o caráter comunitário e compartilhado do empreendimento democrático.
*Victor Maia é pós-doutorando em Ética e Filosofia Política pela UFRJ e subsecretário de Cultura de Nova Iguaçu, RJ
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