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O governo de São Paulo está na iminência de autorizar a instalação de uma termelétrica em Peruíbe que vai destruir um dos últimos santuários ecológicos do Estado. Será a maior usina desse tipo dentro de uma área urbana no Brasil, e os impactos para o meio ambiente e para a população serão devastadores.
Por Fernando Morais e Manuela Azenha do Nocaute
Uma violência sem precedentes está para ser cometida nas nossas barbas contra a natureza, o meio ambiente e a população.
O governo Alckmin está para autorizar a instalação de uma usina termelétrica a gás natural com capacidade de 1.700 megawatts na cidade de Peruíbe, litoral sul de São Paulo, no coração da Juréia, um dos últimos santuários ecológicos do Estado.
Será a maior usina desse tipo dentro de uma área urbana no País.
O projeto, chamado “Verde Atlântico”, está em análise na CETESB, Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental. Segundo o parecer técnico, a área de 180 hectares percorrerá a zona de amortecimento de dois parques estaduais, três áreas de proteção ambiental e vastas áreas hoje ocupadas por indígenas.
Ainda de acordo com o documento, a usina ficaria a menos de cinco quilômetros de distância de Piaçaguera, área ocupada por índios.
O gasoduto de distribuição e as linhas de transmissão percorreriam o entorno das áreas indígenas de Itaoca, Guarani do Aguapeú e Rio Branco.
Segundo o ambientalista Plínio Melo, o maior impacto será o efeito da chuva ácida, que vai degradar um dos últimos remanescentes contínuos de Mata Atlântica no Estado de São Paulo: a Estação Ecológica da Juréia.
Acabou? Não. O estrago vai ser maior.
A etapa de resfriamento do vapor para a geração de energia consumirá mais de três toneladas de água do mar por hora, ou 90 milhões de litros por dia. Além de voltar para o mar numa temperatura mais elevada, essa água poderá estar contaminada por efluentes químicos como soda cáustica e cloro. Um atestado de morte para a fauna marítima da região.
A suspeitíssima rapidez do processo de aprovação da licença ambiental para a construção da usina chamou a atenção e está sendo investigada pelo Ministério Publico Federal e Estadual.
O empreendimento de R$ 5 bilhões é da Gastrading Comercializadora de Energia. Trata-se de uma empresa criada há apenas seis anos por Alexandre Chiofetti, empresário com grande desenvoltura no mercado financeiro – com passagens pelos bancos BNP Paribas e JP Morgan, como se pode ver no seu perfil no Linkedin – mas nenhuma experiência na área de construção de usinas.
Em resposta a uma solicitação da repórter Manuela Azenha, do Nocaute, a Gastrading informou que “o Verde Atlântico será o primeiro projeto desse porte da empresa”.
O que fazer para impedir esse crime contra a natureza?
Não sou eu quem vai ensinar o povo de Peruíbe a defender a saúde de seus netos.
Até porque não é a primeira vez que a população da região compra briga contra projetos desse tipo. O empresário Eike Batista tentou construir um porto em Peruíbe em 2008, mas graças à pressão da opinião pública o Ibama e a Funai não concederam o licenciamento.
Mas você deve estar se perguntando: porque é que eu, Fernando Morais, estou metendo o bedelho num assunto que diz respeito apenas ao povo do litoral sul? Logo eu, que não sou de Peruíbe e nem sei nadar?
Eu explico.
Em 1980, há quase quarenta anos, a ditadura militar decidiu construir não uma, mas DUAS usinas nucleares – isso mesmo, duas usinas nucleares, como as de Angra – exatamente onde? No coração do santuário ecológico da Juréia. Éééé: em Iguape… e Peruíbe!
Foi então que decidi fazer o que a maioria dos meus amigos achava uma rematada maluquice: mover uma Ação Popular contra o presidente da República, general João Batista Figueiredo.
Para calçar a Ação com argumentos sólidos, convidei para se associarem a mim alguns dos mais importantes cientistas de então. Além de mim, a Ação foi assinada pelos físicos Mário Schemberg e Luís Carlos de Menezes, os economista Raul Ximenes Galvão e Ricardo Abramovay, o geólogo Aziz Ab’Sáber e a ecologista Ecléa Bosi, todos professores da USP. O advogado que nos representou foi Iberê Bandeira de Melo, conhecido pela defesa de presos políticos.
Para surpresa de todos, a ação foi acatada e correu na 4a Vara da Justiça Federal de São Paulo, que determinou a citação do réu, por carta precatória.
Confesso que me senti vitorioso só de ler o nome do Figueiredo datilografado na capa do processo como “réu”.
A Ação percorreu os sossegados escaninhos da Justiça brasileira até que, ao final, sabe o que aconteceu?
Eu ganhei! Sim, o impossível aconteceu. Eu ganhei a ação e o governo desistiu de construir as usinas em São Paulo.
Por que é que estou lembrando desse episódio? Por uma razão muito simples: se foi possível vencer a ditadura, por que não venceríamos o tucano Geraldo Alckmin?
Portanto, vamos à luta. O Nocaute está aberto para quem quiser entrar nessa briga. Vamos lá!
Assista ao vídeo:
Fotos: Adriana Mattoso / Sistema Ambiental Paulista e Rovena Rosa / Agência Brasil