Escrito en
POLÍTICA
el
Para a juíza o jornal “ultrapassou o direito de crítica que decorre do Estado Democrático de Direito, esbarrando em ofensa pessoal aos profissionais”. Segundo ela, a comparação com os três patetas, “grupo cômico conhecido por suas ‘trapalhadas’, ensejou verdadeira desqualificação pessoal, colocando os autores em situação vexatória”.
Do Conjur
Embora ocupantes de cargos públicos possam ser alvo de críticas, o uso de expressão jocosa para ridicularizá-los atinge a esfera íntima do indivíduo, implicando infração ao direito fundamental à honra e à imagem. Assim entendeu a juíza Priscilla Bittar Neves Netto, da 32ª Vara Cível de São Paulo, ao mandar o jornal Folha de S.Paulo pagar R$ 90 mil a três promotores que pediram a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O trio Cássio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique de Moraes Araújo alegou dano moral com reportagem publicada em março do ano passado, três dias depois de apresentarem denúncia contra Lula, Marisa Letícia e outras 14 pessoas por supostas irregularidades envolvendo um triplex em Guarujá, no litoral paulista.
Logo no início do texto, o jornalista Mario Cesar Carvalho utilizou sigilo da fonte ao dizer que, dentre especialistas consultados sobre a denúncia, alguns classificaram a acusação como “um lixo” e chamaram os promotores de “três patetas”.
A Folha disse que apenas publicou críticas e repercussões sobre o trabalho dos promotores, sem citar todos os entrevistados, e que apenas seguiu o exercício regular do direito de informar.
Para a juíza, porém, o jornal “ultrapassou o direito de crítica que decorre do Estado Democrático de Direito, esbarrando em ofensa pessoal aos profissionais”. Segundo ela, a comparação com os três patetas, “grupo cômico conhecido por suas ‘trapalhadas’, ensejou verdadeira desqualificação pessoal, colocando os autores em situação vexatória”.
A ré foi condenada a pagar R$ 30 mil a cada um dos promotores. Ainda cabe recurso.
Denúncia fatiada
A notícia da Folha citava críticas de advogados, professores de Direito e membros do Ministério Público contra o conteúdo da acusação, considerado simplório. Nem todas os entrevistados tiveram o nome divulgado.
No mesmo dia da denúncia, os promotores pediram a prisão preventiva de Lula, alegando “ira contra as instituições do sistema de Justiça”, discursos inflamando a população e reclamações públicas contra medidas judiciais. Eles escreveram que as condutas do ex-presidente “certamente deixariam Marx e Hegel envergonhados” — confundindo Friedrich Engels com o alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel.
Conserino, Blat e Araújo incluíram Lula e seus familiares em acusação sobre irregularidades em imóveis que pertenciam a uma cooperativa. A denúncia dizia que a transferência de unidades da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop) para a empreiteira OAS prejudicou pessoas que esperavam a casa própria, enquanto o ex-presidente foi acusado de praticar lavagem de dinheiro ao ocultar a posse de um desses imóveis.
Os promotores entendiam que a denúncia não interferia no trabalho do Ministério Público Federal. A estratégia, no entanto, não deu certo. O juiz federal Sergio Moro acabou assumindo o trecho contra Lula por suposta relação com a operação “lava jato”, enquanto a juíza Maria Priscilla Veiga Oliveira, da 4ª Vara Criminal de São Paulo, aceitou o restante sobre supostas irregularidades envolvendo imóveis da Bancoop.
Cássio Conserino e Fernando Henrique de Moraes Araújo chegaram a acusar a juíza de fechar acordo ilícito para dividir as investigações. O Superior Tribunal de Justiça, porém, reconheceu o fatiamento.
Em janeiro deste ano, a defesa de Lula apresentou ação cível contra Conserino cobrando indenização de R$ 1 milhão por supostos ataques à imagem, à honra e à reputação do petista. O processo foi apresentado depois que o membro do Ministério Público compartilhou em seu Facebook publicação que chamava Lula de “encantador de burros”.