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"É mais uma tentativa de burlar as leis", disse deputado sobre o "fundo eleitoral" que Huck e outros empresários estão criando para financiar candidaturas apoiadas pelo mercado. Financiamento empresarial de campanhas foi proibido pelo STF no ano passado
Por RBA
Um grupo de empresários anunciou a criação de um fundo para financiar políticos para as próximas eleições. A iniciativa, batizada de Fundo Cívico para a Renovação da Política (RenovaBR), pretende dar “mesadas” e doações para os selecionados do empresariado disputarem pleitos com maior força. Acontece que o financiamento privado de campanha por empresas (pessoas jurídicas) foi proibido no ano passado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O questionamento do deputado federal Jorge Solla (PT-BA) é justamente se tal fundo vai se comportar como uma empresa, visto que, como explica o professor de direito civil Carlos Roberto Gonçalves, em sua obra Direito Civil Brasileiro (2005), "a pessoa jurídica consiste num conjunto de pessoas ou bens, dotado de personalidade jurídica própria e constituído na forma da lei para a consecução de fins comuns". No caso, para o parlamentar, a finalidade comum do grupo de pessoas seria a de eleger seus candidatos. Caberá à Justiça investigar e julgar a natureza do negócio.
“É mais uma tentativa, travestida de boas intenções, de burlar as leis, de fraudar a democracia. A única forma de doação de dinheiro com finalidade eleitoral prevista na legislação é o de pessoa física para partidos ou para CNPJ da campanha do candidato. Qualquer coisa fora disso é ilegal. É o velho e repugnante caixa dois”, afirma o parlamentar.
O fundo conta com a colaboração de nomes como o apresentador Luciano Huck, o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga e o empresário Abílio Diniz, todos sob comando do articulador Eduardo Mufarej.
Mufarej é sócio da Tarpon Investimentos e presidente da Somos Educação. Posicionado à direita no espectro político e econômico, o empresário foi um dos fundadores do Partido Novo. Mesmo com seu envolvimento direto com tal campo ideológico, o empresário afirma que o fundo será “apartidário”.
“Iniciativas como essa não deixam nosso país mais democrático, ao contrário: é o poder da grana dos interesses dos empresários que tenta definir como o Congresso deve se renovar, atendendo os interesses desses empresários, que via de regra não é o interesse popular. Se eles querem se organizar para disputar eleições, que venham para o jogo da política dentro das regras, fundem um partido, filiem seus candidatos e vamos às urnas”, completou Solla.
Os empresários alegam “renovação” para montar essa “fábrica de novos políticos”. Acontece que o Congresso Nacional já possui presença maciça de representantes das empresas. Sempre foi dessa forma, como explica o economista e presidente da Fundação Perseu Abramo, Marcio Pochmann: “Produto de um sistema eleitoral contaminado pelo sistema econômico, temos um parlamento cuja composição equivale à presença de um deputado vinculado aos trabalhadores para cada 12 vinculados ao poder econômico”, afirma.
“Se olharmos para a composição do povo brasileiro, temos um empresário para cada 40 trabalhadores. Temos um Parlamento com uma enorme desproporção em termos de representação entre trabalho e capital”, completa o economista. Os bolsistas que os empresários pretendem bancar com o capital das empresas deles receberão, somadas ajuda de custo e formação, algo em torno de R$ 8.000 por mês.
Maquinaram o sistema
A agenda do grupo começou oficialmente na segunda-feira (2). A seleção começa no próximo sábado, quando os empresários devem escolher quais pessoas eles acham adequadas para defender seus interesses no Parlamento. O processo vai até dezembro. Em janeiro começam os pagamentos para os considerados mais interessantes para o grupo. Em abril, eles deverão escolher seus partidos e, em agosto, começam a receber doações dos indivíduos que compõem o grupo. Solla questiona se isso não seria uma forma de financiamento empresarial travestido da legalidade das doações que, neste último momento, seriam realizadas pelas pessoas físicas componentes do grupo.
“Observa-se, excelência, que os envolvidos na criação do fundo maquinaram o sistema de forma a conduzir todo o processo eleitoral, desde a escolha dos pretensos candidatos, até a filiação partidária deles, sob o manto do poder econômico. Não foi por outro motivo que a convocação pública fora designada para o dia 7 de outubro e o início dos desembolsos financeiros já para janeiro, meses antes do prazo limite para a filiação partidária”, argumenta Solla em juízo.
O parlamentar completa sua queixa, direcionada à Procuradoria-Geral da República, sustentando que tal ação dos empresários representa a “legalização do caixa dois”, e pede a “imediata suspensão do fundo cívico”. “O caixa dois é, senão, prática financeira ilegal, num verdadeiro mundo paralelo, alheio a qualquer fiscalização, geralmente destinado a atividades ilegais (…). O fundo cívico se propõe a financiar, desde um ano antes, sem qualquer controle da Justiça eleitoral, pessoas com o fim de obter-lhes as candidaturas. Está incontroverso.”