Escrito en
POLÍTICA
el
Os trechos da conversa entre Sérgio Machado e o ministro Romero Jucá não escancaram somente o golpe, como também abrem questões que precisarão ser avaliadas adiante
Por Glauco Faria
A conversa vazada entre o ex-diretor da Transpetro, Sérgio Machado, e o atual ministro do Planejamento, Romero Jucá, revelam mais do que até o Sensacionalista sabia que era óbvio: o processo de impeachment de Dilma, é, na verdade, um golpe parlamentar, sendo que um de seus objetivos é modular os efeitos da Lava Jato.
A candidez do diálogo entre os dois é notável, e revelam os mecanismos do Estado brasileiro. Não estamos falando de governos, mas sim de instituições que são corroídas por interesses particulares e nada republicanos. Sua solidez, celebrada volta e meia quando as comparamos com outros países, é posta em xeque como em poucas ocasiões.
Abaixo, alguns trechos relevantes dentre aqueles que foram revelados:
Temer é Cunha
MACHADO – Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel [Temer].
JUCÁ – Só o Renan [Calheiros] que está contra essa porra. ‘Porque não gosta do Michel, porque o Michel é Eduardo Cunha’. Gente, esquece o Eduardo Cunha, o Eduardo Cunha está morto, porra.
(…)
MACHADO – O Renan [Calheiros] é totalmente ‘voador’. Ele ainda não compreendeu que a saída dele é o Michel e o Eduardo. Na hora que cassar o Eduardo, que ele tem ódio, o próximo alvo, principal, é ele. Então quanto mais vida, sobrevida, tiver o Eduardo, melhor pra ele. Ele não compreendeu isso não.
JUCÁ – Tem que ser um boi de piranha, pegar um cara, e a gente passar e resolver, chegar do outro lado da margem.
Essa é uma das obviedades que mesmo parte da mídia tradicional hoje já reconhece – embora sempre soubesse. Temer deve seu governo provisório ao ex-presidente da Câmara, ainda seu fiador na relação com a Casa. Na disputa de poder dentro e fora do PMDB, Calheiros não joga no mesmo time de Cunha. Sérgio Machado, ex-senador e ex-deputado, teria sido indicado para o posto de diretor da Transpetro, cargo que assumiu em 2003, por Calheiros, mas tem conexões também com o PSDB. Às vezes, interesses distintos podem “casar”…
O papel do STF
MACHADO – É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional.
JUCÁ – Com o Supremo, com tudo.
MACHADO – Com tudo, aí parava tudo.
JUCÁ – É. Delimitava onde está, pronto.
[…]
JUCÁ – [Em voz baixa] Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem ‘ó, só tem condições de [inaudível] sem ela [Dilma]. Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca’. Entendeu? Então… Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão garantir. Estão monitorando o MST, não sei o quê, para não perturbar.
(...)
JUCÁ – Eu acho que tem que ter um pacto.
[…]
MACHADO – Um caminho é buscar alguém que tem ligação com o Teori [Zavascki, relator da Lava Jato], mas parece que não tem ninguém.
JUCÁ – Não tem. É um cara fechado, foi ela [Dilma] que botou, um cara… Burocrata da… Ex-ministro do STJ [Superior Tribunal de Justiça].
Quando o ministro do Planejamento diz que conversou com ministros do STF e que eles teriam falado que “só tem condições” sem Dilma, pode-se inferir, primeiro, que há membros da mais alta corte do país que são suspeitos para julgar questões relativas à presidenta. Quando menciona a dificuldade de falar com Teori por ele ser um “burocrata”, presume-se que há colegas do ministro que não são.
Confirma-se também outra obviedade: no Supremo, a propalada imparcialidade dos doutos juristas não existe. E, ao contrário da divulgação dos grampos envolvendo Lula, não houve ainda qualquer colocação a respeito do diálogo entre Machado e Jucá.
O “esquema de Aécio”
MACHADO – É aquilo que você diz, o Aécio não ganha porra nenhuma…
JUCÁ – Não, esquece. Nenhum político desse tradicional ganha eleição, não.
MACHADO – O Aécio, rapaz… O Aécio não tem condição, a gente sabe disso. Quem que não sabe? Quem não conhece o esquema do Aécio? Eu, que participei de campanha do PSDB…
JUCÁ – É, a gente viveu tudo.
“Quem não conhece o esquema do Aécio”, pergunta, de forma retórica, Sérgio Machado. Jucá concorda. Até agora não se falou muita coisa sobre o assunto.
O medo das ruas
ROMERO JUCÁ – Eu ontem fui muito claro. […] Eu só acho o seguinte: com Dilma não dá, com a situação que está. Não adianta esse projeto de mandar o Lula para cá ser ministro, para tocar um gabinete, isso termina por jogar no chão a expectativa da economia. Porque se o Lula entrar, ele vai falar para a CUT, para o MST, é só quem ouve ele mais, quem dá algum crédito, o resto ninguém dá mais credito a ele para porra nenhuma. Concorda comigo? O Lula vai reunir ali com os setores empresariais?
MACHADO – Agora, ele acordou a militância do PT.
JUCÁ – Sim.
MACHADO – Aquele pessoal que resistiu acordou e vai dar merda.
(...)
JUCÁ – [Em voz baixa] Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem ‘ó, só tem condições de [inaudível] sem ela [Dilma]. Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca’. Entendeu? Então… Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão garantir. Estão monitorando o MST, não sei o quê, para não perturbar.
Temer não resistiu à pressão contra o fechamento do Ministério da Cultura. Mesmo sem abrir possibilidade de diálogo, diante da reação contra a extinção do MinC o interino se dobrou. Movimentos continuam em estado de mobilização quase permanente contra o governo provisório e as referências de Jucá e Machado ao “pessoal que acordou” e ao MST. As ruas têm força.