Escrito en
POLÍTICA
el
Presidente da Câmara dos Deputados evidenciou sua tática de se fazer de vítima de “motivação política” e buscou jogar o fardo da Lava Jato nos ombros do governo. Tudo em um clima de muitos afagos dos parlamentares
Por Glauco Faria
Na sessão da CPI da Petrobras realizada nesta manhã e em parte da tarde em Brasília, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi aplaudido após e mesmo durante sua explanação inicial de 53 minutos. Tratou o pedido de abertura de inquérito feito em relação a ele, realizado pelo procurador-geral da República Rodrigo Janot, como algo feito por “motivação política”. Foi apoiado por lideranças – a maioria delas que apoiou sua eleição à presidência da Casa – e reverenciado de forma comovente pelos seu colegas.
A deferência era tanta que foi constrangedora. Em certos momentos, lembrava cenas do filme O Poderoso Chefão, onde convidados do casamento da filha de Don Corleone, personagem vivido por Marlon Brando, recebia pedidos e tinha sua mão beijada pelos convivas. No caso de hoje, não houve qualquer pedido aparente, apenas loas tecidas à vontade a Cunha.
Mas se há “motivação política” na inclusão do peemedebista na lista, quem é o “motivador”? Obviamente, o governo. Na trama em que o presidente da Câmara alega estar envolvido, Rodrigo Janot estaria interessado em agradar quem tem a possibilidade de conduzir sua reeleição, o Executivo, e por isso teria incluído o nome do peemedebista. Dupla e grave acusação: a de ingerência governamental no trabalho do Ministério Público e de uma conduta inidônea do procurador-geral. E os petistas, diante das acusações do presidente da Câmara, foram vacilantes, preferindo falar sobre temas correlatos mas não batendo de frente com o depoente.
As falas de Cunha foram diretas e, para ilustrar o que ele diz ser incoerência do procurador ao pedir investigações sobre ele, citou dois exemplos de senadores petistas, Delcídio Amaral, que teve o pedido de abertura de inquérito arquivado, e Gleisi Hoffman. Sempre com uma adversativa de que citava os exemplos mas não “acusava” ninguém, deixou os ataques mais agressivos a cargo de parceiros como o deputado Paulinho da Força (PSD-SP), que levantou a hipótese de conluio entre o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o procurador Janot.
O fato é que, diante da evidente tática do peemedebista de jogar o peso das investigações da Lava Jato nos ombros do governo, tomando a própria defesa como se fosse, também, uma defesa do Legislativo, atiçando os instintos corporativos dos parlamentares, Cunha mostrou mais uma vez que sabe bem o que quer e já definiu como fazê-lo. Enquanto isso, a articulação governista hesitou e, ao não fazer a defesa enfática do governo diante das acusações do presidente da Câmara, escancarou um modo de fazer política que é grande responsável pela atual situação em que se encontra o Planalto e a base dilmista no Legislativo.
Para além da tática política de Cunha, algo comovente na CPI foi descobrir o quanto nossos deputados prezam e valorizam a presunção de inocência. E sabem, porque assim disseram vários deles, que o envolvimento do nome de uma pessoa em investigações pode se traduzir em culpa para parte da opinião pública.
Uma intervenção reveladora – mas não a única – nesse sentido foi feita pelo deputado Celso Pansera (PMDB-RS), ao rebater a fala de Ivan Valente (Psol-SP), que pediu a Cunha que abrisse seus sigilos telefônico, bancário e fiscal para que pudesse continuar seu trabalho à frente da Câmara. De acordo com o parlamentar gaúcho, “pedir abertura de sigilo é induzir à condenação”. Diz muito a respeito da conduta de seus colegas em diversos episódios.
É uma pena esse interesse pela presunção de inocência ter surgido só agora, em especial para parlamentares que têm como hábito acusar e apontar o dedo para um adversário – político ou não – na primeira oportunidade. E também descobrimos, na didática sessão da CPI, que decisões judiciais podem ser contestadas publicamente, já que a abertura de inquérito para investigar Eduardo Cunha foi um pedido de Janot acatado por um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Teori Zavascki.
Poderíamos aproveitar essa onda de preocupação de parlamentares com a presunção de inocência para exigir que este seja um direito assegurado a todos os cidadãos, pois ele desaparece no cotidiano de muitos brasileiros, em especial aqueles que vivem nas periferias das grandes cidades, vítimas do autoritarismo do poder público e que raramente são tema de qualquer discussão no Congresso Nacional. Porque o ônus da prova e o peso da culpa, nesses casos, ficam para os acusados, que não são poucos.
Foto: Lucio Bernardo Jr. - Câmara dos Deputados