“O Marco Civil pode influenciar a legislação mundial sobre internet”, diz Alessandro Molon

Relator do Marco Civil da Internet comemora aprovação e diz que Brasil pode liderar a criação de uma legislação mundial sobre a rede

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Relator do Marco Civil da Internet comemora aprovação e diz que Brasil pode liderar a criação de uma legislação mundial sobre a rede Por Marcelo Hailer Na ultima terça-feira (26) foi aprovado com ampla maioria o Marco Civil da Internet que, depois de meses trancando a pauta da Câmara dos Deputados, encontrou-se um consenso o texto foi aprovado com a neutralidade da rede, matriz ideológica do texto, pois, garante o acesso igualitário à rede, impedindo que as empresas de telecomunicação comercializem pacotes de acesso à internet. Enfim, passado todo o turbilhão que envolveu o trâmite do Marco Civil da Internet, voltamos a conversar com o relator da matéria, o deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ), que na primeira conversa estava um pouco tenso e temeroso quanto ao futuro do texto, na conversa que você confere a seguir Molon comemorar a aprovação e acredita que o legislação brasileira sobre internet pode influenciar outros países. Molon também comentar que o governo vai trabalhar para que o Marco seja aprovado rapidamente no Senado e que se mantenha o texto original. “Se for pra alterar o texto, que seja pra ampliar os direitos”, comenta Alessandro Molon. Ainda de acordo com o deputado a expectativa do governo federal é chegar na Conferência Internacional de Governança na Internet, que acontece em Abril. O objetivo é que o Marco já seja lei para que se inicie um debate a respeito de um Marco Civil da Internet mundial. Revista Fórum – Qual é o significado da aprovação do Marco Civil da Internet? Alessandro Molon – Isso representa uma grande vitória para os mais de 100 milhões de internautas brasileiros, eu diria mais, para a internet mundial, aliás, não é a minha opinião é a opinião do pai da web Tim Berners-Lee, que divulgou uma nota esta semana dizendo que a aprovação do Marco Civil seria um presente não apenas para o Brasil, mas para todo o mundo. Uma lei construída de baixo pra cima pela sociedade que garante a neutralidade da rede, a liberdade de expressão e a privacidade dos usuários. O Brasil está saindo na frente na garantia dos direitos digitais. É uma grande alegria para o Brasil e eu espero que o Senado vote sem demora o Marco Civil para que a gente chegue na conferência mundial que vai ocorrer em São Paulo, no fim de abril, com o Marco Civil já transformado em lei e se isso acontecer nós podemos influenciar fortemente a legislação mundial sobre internet. Fórum – Todo o trâmite do Marco Civil foi uma batalha dura com forte lobby das teles e de setores mais conservadores. Em algum momento você chegou a pensar que fosse perder essa disputa? Molon – Em alguns momentos eu fiquei bastante preocupado, pois, houve momento de divergências político-partidária que contaminaram a discussão e nesse momento eu temi que o projeto pudesse ser prejudicado por conta desse ambiente político. Mas graças a ação do governo pra separar as coisas, pra se aproximar de sua base, há também a mobilização da sociedade civil para que o Congresso não jogasse fora algo tão precioso... E nós conseguimos um resultado excelente. Fórum – Houve uma mobilização social muito forte, tivemos o Gilberto Gil que lançou uma campanha, no dia da votação entregaram 320 mil assinaturas. Você considera que essa mobilização foi crucial pra aprovação do Marco Civil? Molon – Essa mobilização social foi fundamental pra aprovação do Marco Civil. A participação da sociedade dizendo ao Congresso que queria o Marco Civil com a neutralidade da rede foi decisivo para o resultado que alcançamos. Fórum – Uma questão que é muito comentada é a construção do Marco Civil, que foi de baixo pra cima. E muita gente tem dito que os parlamentares temem que isso vire moda. Acredita que a maneira como foi conduzida a construção do Marco pode vir a influenciar outros grupos organizados? Molon – Sem dúvida, eu acho que o outro do marco do Marco Civil foi o processo legislativo. Eu espero que tanto a sociedade quanto o Congresso, no sentido de aproveitar cada vez mais a colaboração da participação direta dos cidadãos brasileiros na construção de leis. O Congresso não deve temer isso, isso não reduz o papel do Congresso, ao contrário, o parlamento deve apostar nisso por que aí está uma das principais medidas para o reencontro entre representantes e representados. Nada melhor do que isso para reforçar a legitimidade do Congresso, pra fortalecer as instituições democráticas, então, isso não deve ser temido, ao contrário, deve ser buscado. Fórum – A unanimidade é algo utópico e alguns coletivos estão debatendo na rede a redação da neutralidade da rede, especificamente a questão da “exceção”, que isso pode abrir numa brecha para as teles no futuro praticarem os pacotes de internet. Molon – Vários especialistas que foram consultados mostraram que, no entendimento deles, essa redação é a melhor possível, por que? A neutralidade sem exceção é uma neutralidade que no limite pode prejudicar a própria prestação de serviços. Se uma rede de transmissão de vídeo ao vivo é tratada da mesma forma que um e-mail quando nós sabemos que para um e-mail chegar 0.2 segundos atrasado não faz nenhuma diferença, mas um vídeo a cada 0.2 segundos congelar inviabiliza a transmissão de vídeo ao vivo. Tratar desiguais igualmente não faz sentido, temos que tratar desigualmente desiguais. Ou seja, se há determinado pacotes de dados que para o melhor funcionamento, por razões técnicas, devem ser tratados de formas diferentes e isso todos os especialistas dizem que é bom para o funcionamento da internet. O que não é admissível é que o critério para essa diferença seja comercial, político, ideológico ou por qualquer outra razão. Outra questão é a prestação de serviços de emergência: cirurgias realizadas pela internet, não faz sentido que uma vida deixe de ser salva por que um e-mail tem que passar na frente. E as cirurgias realizadas através da internet serão cada vez mais comum. Esses casos específicos só podem se encaixar em duas situações: requisitos técnicos indispensáveis para o bom funcionamento da rede, que é o inciso primeiro do parágrafo primeiro do artigo nove, ou prestação de serviços de emergência. Por que os mesmos especialistas dizem que se você tentar botar tudo isso na lei, ela fica velha antes de sair. Por que? Por que o processo de modernização da internet é muito mais rápido do que o legislativo e esses casos vão estar exaustivamente enumerados no decreto que a presidência da república. Isso está muito bem amarrado no texto para que não haja qualquer brecha que permita qualquer uso indevido do conceito de exceções da neutralidade da rede. É por isso que o texto é tão aplaudido, pois não há brecha e possibilidade de se usar isso indevidamente. Fórum – Qual é a sua expectativa em relação ao trâmite do Marco Civil no Senado? Molon – eu espero que o Marco Civil seja votado o quanto antes no Senado por que seria fundamental que o Brasil fosse pra conferência internacional, na qual estarão presentes vários países e para que o Brasil possa chegar nessa conferência com o Marco já transformado em lei, pois consolidaria a nossa liderança e nos daria autoridade moral no evento para apontar para um Marco Civil da Internet internacional. Fórum – Os lobistas das teles podem vir a fazer pressão no Senado? Molon – Pode haver pressão dos mais diversos interesses, mas eu espero que o Senado resista e mantenha o texto que protege os interesses dos internautas e da internet, que nós aprovamos na Câmara com uma maioria esmagadora sem que haja qualquer recuo ou concessão. Espero que o Senado mantenha o texto, mas se houve qualquer alteração que seja pra avançar, pra garantir mais direitos. Fórum – Já há alguma articulação para que o projeto passe rápido pelo Senado? Molon – o governo vai trabalhar para aprovar o quanto antes e eu vou pessoalmente conversar com os senadores e pedir para que aprovem o quanto antes o texto. Fórum – Como você classificaria os grupos que atuaram contra o Marco Civil? Molon – dentre aqueles que se manifestaram contra o Marco Civil eu identificaria várias motivações. De um lado aqueles que lutaram contra o Marco Civil, por que o texto ao garantir direitos para os internautas limita o lucro de determinadas empresas, esses que ficaram contra o Marco Civil pelos interesses das empresas que representam, lamento profundamente. De um outro lado tem aqueles que lutaram contra o projeto por desconhecimento. Pois, no projeto não há qualquer mecanismo de controle ou de censura, pelo contrário, o projeto protege fortemente a liberdade de expressão, a privacidade do usuário, a neutralidade de rede que não está protegida hoje. Quem lutou contra imaginando que por trás do Marco Civil há uma tentativa de controlar a internet, o fez por desconhecimento. Mas eu esperio que com o acesso a informação, com uma recepção mais tranquila, estes cidadãos passem a apoiar o projeto. E teve aqueles que se mobilizaram contra o projeto por que ele foi apresentado e apoiado pelo governo, com uma visão pequena de quem por eventualmente não apoiar o governo e que acham que qualquer coisa que venha do governo é ruim. Essa é uma visão que eu considero muito limitada. Nós conhecemos a árvore pelos frutos e se o fruto é bom por que não apoiá-lo?