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Dimitri Sales, advogado especialista na área de Direitos Humanos, afirmou que o parlamentar cometeu crimes de incitação à violência e difamação, mas não acredita na perda de mandato
Por Marcelo Hailer
O deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) protagonizou, ontem (9), mais uma cena de violência verbal para o seu currículo, quando, em uma discussão com a também deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), disse à parlamentar que não a estupraria, pois ela não era merecedora de tal ato, dando a entender que outras mulheres merecem ser estupradas. A fala ocupou as redes e toda a imprensa, e uma campanha nacional pela cassação do deputado já conta com mais de 30 mil apoiadores.
Jair Bolsonaro é reincidente no que diz respeito a ofensas e agressões à deputada Maria do Rosário. Em 2003, durante uma discussão sobre redução da maioridade penal, no Salão Verde do Congresso Nacional, Bolsonaro empurrou e xingou a deputada de "vagabunda". À época, nada aconteceu com o parlamentar. Outras ações por quebra de decoro contra ele também foram arquivadas.
Para entender o trâmite de uma cassação parlamentar e saber quais crimes o deputado Jair Bolsonaro cometeu com seu discurso no plenário da Câmara, Fórum conversou com Dimitri Sales, advogado especialista em Direitos Humanos e fundador da Comissão LGBT da OAB-SP. Sales afirma que Bolsonaro cometou dois tipos de crimes: incitação à violência e injúria. Porém, o advogado atenta para o fato de que a decisão de cassar o deputado “é política, mais do que jurídica” e que depende “dos seus pares”.
Confira, a seguir, a entrevista na íntegra.
Fórum - Há espaço jurídico e político para cassá-lo?
Dimitri Sales - A cassação é um ato político, não é um ato jurídico. Que ele (Jair Bolsonaro) cometeu o crime, ele cometeu. Cometeu crime de incitação à violência, de injúria contra a deputada. Esses crimes qualificariam uma conduta de quebra de decoro parlamentar. Agora, esse é o grande problema: a decisão se dá pelos pares. A possibilidade de você perder um mandato por uma decisão judicial se dá a partir de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de abrir um processo criminal.
A Maria do Rosário pode entrar com uma representação no Supremo contra ele e o Supremo pode decidir que a conduta resulte em quebra de decoro, mas, mesmo assim, por conta das decisões últimas, o Supremo não consegue cassar o mandato. A cassação do mandato é sempre da Câmara, não tem jeito. A decisão é mais política do que jurídica.
Fórum - O STF faz uma indicação de cassação?
Sales - O STF pode condenar o deputado por uma prática criminosa e comunicar essa decisão à Câmara dos Deputados. Na práxis, vamos dizer assim, o Supremo condenou alguns deputados e condenou à perda do mandato. Mas a Câmara dos Deputados resolveu descumprir aquela decisão e votar a cassação do parlamentar, como por exemplo o caso do deputado Donadon (Natan PMDB-RO), cassado no começo deste ano.
A decisão do Supremo vai muito na condenação penal e a quebra do decoro é um ato político. Se o Supremo decidir que houve quebra de decoro, ainda assim essa decisão não repercute, pela práxis, na automática perda do mandato. A perda só se dá por um processo instaurado pelo Conselho de Ética, que vai ser o primeiro desafio da Maria do Rosário. Tem que apresentar uma queixa no Conselho de Ética. O conselho, primeiro, tem que julgar se abre ou não processo contra o deputado. E essa é a primeira barreira a enfrentar: convencer o Conselho a abrir um processo por quebra de decoro.
Abrindo o processo, o relator tem que apontar pela cassação. Se ele aponta que não é possível, outro deputado pode apresentar um parecer paralelo. Aí tem que aprovar esse segundo parecer, que é outro desafio. Se o Conselho indica a cassação do mandato, ele (Bolsonaro) pode recorrer na Corregedoria. Resumindo: ele pode ir para o plenário da Câmara e o presidente decide pelo agendamento da votação do relatório pedindo cassação.
Fórum - Você acredita na cassação de Jair Bolsonaro?
Sales - Não. Precisaríamos mobilizar muito a sociedade, no estilo do que foi a votação da “cura gay”, que todo mundo foi para as ruas e resultou na retirada da pauta no Congresso Nacional. Eu não acho que a gente consiga essa mobilização, por conta disso. Agora, essa minha avaliação não impede que a gente grite e mostre para a sociedade que esse cara é um maluco e que esse tipo de postura não pode ser aceita.
Foto: Reprodução