LULA TERMINA MAL uma semana que tinha tudo para ser sua. O presidente emerge de uma significativa vitória sobre a greve dos professores e a demanda das Universidades federais por mais verba. Segurou tudo no peito e não cedeu em nada de importante. O problema é que se trata de vitória para lá de antipática. Vamos combinar: derrotar a Educação em nome de um ajuste fiscal aplicado sob diretrizes da Faria Lima não é galardão para ninguém. Paciência, cada um escolhe o lado na batalha e o governo optou pelo seu.
A VITÓRIA PODE SAIR CARA. O que se reivindicava? Recomposição dos orçamentos das Universidades em R$ 2,5 bilhões e reposição de parte das perdas acumuladas de congelamento salarial de Bolsonaro. Nada além do razoável. O que o governo ofereceu? Reajuste zero em 2024, penduricalhos secundários e uma recomposição orçamentária de 10% do total pedido. E muito, muito palavrório, malabarismos estatísticos e boa dose de lorota. Torturando números, o discurso oficial garante que em 2026, os reajustes salariais resultarão em aumentos – e não reajustes – que variam de 28% a 43%. O Excel, como se sabe, aceita tudo.
O MAIOR PROBLEMA GOVERNAMENTAL nas tratativas com professores/as e reitores/as residiu no fato de que seus negociadores eram de baixíssima qualidade e trombaram com um movimento paredista de 64 instituições federais, fortemente alicerçado nas bases e disposto a aguentar mais de dois meses de atividades extra-classe. Pela primeira vez, não houve isolamento social dos grevistas.
OS NEGOCIADORES do Ministério da Gestão e Inovação, chefiado por Esther Dweck, e do MEC, capitaneado por Camilo Santana, foram incapazes de dobrar os docentes. E aí o governo preparou sua bomba atômica. Ao invés de prepostos de décimo escalão, a situação exigia uma força maior. E um erro primário pode ter sido cometido.
EM DECISÃO NUNCA ANTES VISTA na história deste país, o presidente da República em pessoa entrou nas negociações. Foi assim que, na ensolarada manhã brasiliense de 10 de junho, Lula recebeu em Palácio reitores de Universidades e Institutos federais para o que foi anunciado como reunião de trabalho. Na verdade, tratava-se de um showmício para que ministros desfiassem infindável numeralha ao distinto público, alegando oferecer R$ 5,5 bilhões, muito mais que o montante solicitado. Um detalhe – uma pegadinha – não foi contado ali: havia quase nada de dinheiro novo. A bagatela apresentada consta de um dos ramos do PAC, já apresentado em agosto de 2023.
AO MICROFONE, o presidente pontificou sobre greves, aulas chatas, inteligência artificial e investimentos em obras com visibilidade. Lula externou uma concepção liberal de Universidade. Não a vê como instituição fundamental para o desenvolvimento e a transformação do país, mas como instrumento de ascensão e afirmação social individual. Por fim lacrou, afirmando não haver reajuste algum para este ano. Nada, zero.
FALOU-SE AQUI DE UM ERRO OFICIAL. Qual foi? Presidentes não negociam com categorias. Presidentes negociam com outros presidentes e dão ordens para quem está embaixo. A não ser que a fragilidade dos argumentos oficiais seja de tal ordem, que valeria a pena usar o último recurso, pois deixar a paralização continuar numa área que é menina dos olhos do PT desde sua fundação pegaria muito mal.
A GREVE FOI DERROTADA e está acabando nacionalmente. Mas na quinta, 20, em périplo pelo Ceará, Lula voltaria ao assunto, repetindo não entender as causas do protesto e exibindo dados e números absolutamente fictícios sobre benesses oficiais. Uma pergunta fica no ar: se tudo estava resolvido, por que voltar à matéria velha?
AQUI ESTÁ O BUSÍLIS da questão. A resposta parece ser: porque em todos os outros enfrentamentos dos últimos dez dias, o governo perdeu pesado, ou mostrou preocupantes fragilidades. Se não, vejamos.
NA TERÇA, 18, LULA CONCEDEU entrevista de 50 minutos à CBN, pintada como ponto de virada por seus apoiadores. Ali, o petista gastou latim para esculhambar de alto a baixo o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, como o responsável maior pelos desarranjos da economia. O dólar subiu e a bolsa caiu.
DIA SEGUINTE, NA REUNIÃO DO COPOM, na qual os juros poderiam baixar, Campos Neto ganhou de presente a adesão de quatro diretores indicados por Lula à tese de que a taxa Selic deve permanecer nas alturas. Isso significa uma transferência anual líquida de mais de R$ 700 bilhões ao ano dos orçamentos públicos aos especuladores e a demolição, a marretadas, do discurso oficial de véspera. Lula foi desmoralizado por seus preferidos.
E HÁ MAIS. A MÍDIA O DETONA dia sim outro também, tratando-o como incontrolável gastador e pouco preocupado com responsabilidade fiscal. Na Câmara, vem de derrotas parlamentares pesadas nas últimas semanas – saidinhas e fake news - e tem a MP das desonerações devolvida do Senado por um arrogante Rodrigo Pacheco.
MESMO QUANDO TENTA ACERTAR, Lula tem errado no timing. Cinco dias depois de apresentado o PL do Estuprador e após seu líder na Câmara ter tentado apartar o governo de um tema cabeludo, o presidente – a reboque das ruas - foi às redes tentar capitalizar os saldos de expressivas mobilizações femininas em vários estados. E apanhou de sua base feminina, que o acusa de omisso.
LULA NÃO CONSEGUE nem comemorar bons resultados nas pesquisas de opinião – Atlas Intel e Datafolha – que mostram a população satisfeita com os rumos de seu governo.
VAMOS DAR O DESCONTO. Quando provocado, Lula vai firme para o enfrentamento. A área de Educação aprendeu que não se brinca com Lula. Ele sabe enfrentar adversários com energia, mesmo aqueles que o apoiaram em diversas oportunidades muito duras.
O GOVERNO TEM DE COMEMORAR! Não há razão para não fazê-lo. Derrotou a Universidade! Deveria dizer alto e bom som: “Professores, pesquisadores, técnicos administrativos e funcionalismo público, saibam de uma coisa: Vocês existem e não são importantes para nós”!