OPINIÃO

Corporativismo e racismo no caso do policial que baleou entregador no Rio

A tese absurda de legítima defesa sustentada pelo policial, que alegou se defender de uma suposta ameaça, contrasta diretamente com os requisitos estabelecidos no Código Penal.

PM antes de balear entregador de aplicativo no Rio.Créditos: Reprodução de Vídeo
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O recente incidente envolvendo um policial que baleou um entregador desarmado no Rio de Janeiro trouxe à tona questões complexas sobre o uso da força por agentes do Estado e a aplicação do instituto da legítima defesa. A tese absurda de legítima defesa sustentada pelo policial, que alegou se defender de uma suposta ameaça, contrasta diretamente com os requisitos estabelecidos no Código Penal Brasileiro e na doutrina jurídica.

De acordo com o Código Penal, a legítima defesa é uma excludente de ilicitude que se configura quando alguém, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, contra si ou contra outrem. No entanto, no caso em questão, o entregador encontrava-se desarmado e não representava qualquer ameaça iminente ao policial. A ação do policial, portanto, não pode ser justificada como legítima defesa, uma vez que não havia agressão injusta por parte do entregador.

A doutrina penal também reforça a inadequação da alegação de legítima defesa no presente caso. Para que a legítima defesa seja reconhecida, é necessário que haja proporcionalidade entre a ameaça e a resposta, o que claramente não ocorreu aqui. O policial, ao empunhar sua arma diante de um indivíduo desarmado, cometeu um crime de ameaça, não uma ação defensiva justificável.

É importante ressaltar que, diante da injusta ameaça representada pelo policial armado, o entregador teria, em tese, o direito de agir em legítima defesa, desarmando o agressor ou respondendo à ameaça com uma força compatível. Contudo, a conduta pacífica e não violenta do entregador evidencia a ausência de qualquer provocação por sua parte.

Diante disso, é plausível entender a ação do policial como uma tentativa de homicídio, dada a ausência de qualquer violência por parte do entregador. A falha do delegado responsável por não prender o policial em flagrante por tentativa de homicídio reflete a influência do corporativismo e do racismo estrutural nas instituições de segurança pública, minando a confiança da população no sistema de justiça e perpetuando a impunidade para os abusos cometidos por agentes do Estado.

Em suma, o caso do policial que baleou um entregador no Rio de Janeiro expõe a falácia da legítima defesa sustentada pelo corporativismo e pelo racismo estrutural, reforçando a urgência de reformas no sistema de segurança pública e de justiça para garantir a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos e a responsabilização dos agentes do Estado por seus atos.