OPINIÃO

“Saidinhas”: PL ameaça ressocialização de egressos e pode gerar aumento da criminalidade

Visão simplista não corresponde à realidade, visto que as saídas temporárias contribuem significativamente para a redução da reincidência criminal.

Flávio, Eduardo Bolsonaro e Guilherme Derrite, que bradam contra a "saídinha".Créditos: Facebook / Capitão Derrite
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O debate sobre políticas de ressocialização e reintegração de egressos do sistema prisional é central nas discussões sobre justiça criminal. Contudo, a extrema direita deturpa essa pauta, associando o fim das saídas temporárias e recrudescimento da legislação com à redução da criminalidade. Essa visão simplista não corresponde à realidade, visto que as saídas temporárias contribuem significativamente para a redução da reincidência criminal.

Dados da Secretaria da Administração Penitenciária de São Paulo revelam que, em uma recente saída temporária, apenas 4,5% dos sentenciados não retornaram às unidades prisionais em um universo de quase 35 mil pessoas que usufruíram do direito. Essa parcela automaticamente torna-se foragida, enfrentando regressão ao regime fechado e sanções disciplinares.

O Projeto de Lei nº 2.252/22, encaminhado para a CCJ após aprovação no Senado, representa um retrocesso alarmante nas políticas de ressocialização ao abolir as saídas temporárias. Tal medida é considerada desproporcional, inconstitucional e violadora dos direitos humanos, além de promover um ciclo de violência e marginalização pois não tem qualquer reflexo na principal mola do aumento da criminalidade: As históricas desigualdades sociais.

Ao privar os sentenciados do direito às saídas temporárias, o projeto de lei não apenas ignora os princípios de ressocialização, mas também aumenta os riscos de reincidência e exclusão social. Sem a oportunidade de retomar gradualmente suas atividades e relações fora do ambiente prisional, os indivíduos são privados de uma ferramenta importante para sua reintegração plena na sociedade.

É fundamental promover políticas que fortaleçam o direito às saídas temporárias e incentivem a reintegração dos egressos do sistema prisional, respeitando os direitos humanos e buscando uma justiça mais inclusiva e eficaz. Um grande exemplo disso é o incentivo ao sentenciados nos estudos preparatórios para o ENEM. Segundo a SAP 1.566 reeducandos custodiados nas unidades prisionais do Estado de São Paulo atingiram notas para ingresso em Instituições de Ensino Superior.

Parlamentares, como o Senador Flávio Bolsonaro, e agentes do executivo estadual, como o Secretário Guilherme Derrite, pregam erroneamente um suposto elo entre o aumento do encarceramento e a redução da criminalidade. No entanto, a realidade histórica do cárcere persiste com indivíduos analfabetos que ingressam no sistema e retornam à sociedade da mesma forma. Oportunidades de trabalho e estudo ainda são raras no sistema prisional.

As saídas temporárias são oportunidades para os egressos reconstruírem sua autoestima, recuperarem sua dignidade e se prepararem para uma reintegração plena na sociedade. Os legisladores devem considerar as evidências acumuladas ao redor do mundo sobre a importância das saídas temporárias na ressocialização, evitando violações dos princípios fundamentais de dignidade humana e justiça. Portanto, é urgente que a sociedade se mobilize em defesa dos direitos dos egressos e se oponha veementemente a qualquer tentativa de suprimir as saídas temporárias.

É importante ressaltar que a reintegração bem-sucedida dos egressos não é apenas uma questão de justiça social, mas também de interesse público. Quando os indivíduos são devidamente reintegrados à sociedade, têm maior probabilidade de se tornarem cidadãos produtivos e responsáveis, contribuindo positivamente para o desenvolvimento econômico e social do país.

Em última análise, a verdadeira medida de uma sociedade justa não é a severidade de suas punições, mas sim a sua capacidade de oferecer oportunidades de redenção e recuperação aos seus membros mais vulneráveis. É hora de rejeitar políticas baseadas no medo e na retribuição e abraçar uma abordagem mais compassiva e inclusiva da justiça criminal. Afinal, a verdadeira segurança não vem da privação de liberdade, mas sim da construção de comunidades fortes e solidárias, onde todos têm a chance de se tornarem melhores versões de si mesmos.