Banho de sangue

Israel começa a demolir áreas urbanas de Gaza

Netanyahu quer redesenhar o mapa da ocupação de território palestino

Escrito em Opinião el
Completei 40 anos de trabalho como repórter de TV em 2020 e meio século de Jornalismo em 2022. Fui correspondente em Nova York por quase duas décadas, da TV Manchete, SBT e TV Globo. Colaborei com as redes CNN e CBC, dos Estados Unidos e Canadá. Colaborei com a Folha de S. Paulo e a rádio Jovem Pan. Fui o primeiro repórter a fazer uma entrevista improvisada com um líder da União Soviética, em Moscou, em 1988, e a conversa com Mikhail Gorbatchov no Kremlin foi notícia nas redes norte-americanas ABC, CBS e NBC, saiu no diário soviético Pravda e, apesar de transmitida pela TV Manchete, foi noticiada no Jornal Nacional, da concorrente TV Globo. Acompanhei de perto a Queda do Muro de Berlim, em 1989. Cobri os encontros dos líderes Ronald Reagan e Mikhail Gorbatchov que levaram ao fim da Guerra Fria -- na Islândia, na URSS e nos EUA. Cobri o prelúdio das invasões militares do Panamá e do Iraque. Participei de coberturas de Copas do Mundo e Olimpíadas (Itália, França, Estados Unidos, Brasil) e fiz 100 transmissões ao vivo de provas de automobilismo na Fórmula Indy. Dirigi 52 edições do Programa Nova África, da produtora Baboon Filmes, exibido na TV Brasil. Ao longo da carreira, passei por Quênia, Moçambique, África do Sul, Botsuana, Namíbia, Gana, Serra Leoa, Guiné Bissau, Cabo Verde e Marrocos -- no total, trabalhei em mais de 50 países de cinco continentes. No início dos anos 2000, em Nova York, criei o site Viomundo, do qual me afastei no final de 2021 para me dedicar a outros projetos. Sou co-autor de vários livros, dentre os quais se destaca O Lado Sujo do Futebol, finalista do Prêmio Jabuti. No Brasil, atuei no Globo Repórter, especialmente em viagens pela Amazônia, ganhei o Prêmio Embratel de 2005, investigando o uso fraudulento de tratamentos com células tronco, em série que foi ao ar no Jornal Nacional e o Prêmio Esso de Telejornalismo, em 2013, com a série As Crianças e a Tortura, exibida no Jornal da Record. Recebi dias menções honrosas no Prêmio Vladimir Herzog. Fui finalista do Prêmio Esso com o documentário "Luta na Terra de Makunaima", da TV Cultura, e do Prêmio Gabriel Garcia Marquez, com série investigativa sobre médicos que se viciam com drogas de hospitais.
Israel começa a demolir áreas urbanas de Gaza
Bombardeio. Madrugada de fogo em Gaza, sob ataque de Israel. Reprodução Al Jazeera

Na mesma nota em que condenou os ataques do Hamas contra civis israelenses, argumentando que se trata de crime de guerra, a Anistia Internacional disse que é preciso encontrar uma saída para a questão palestina:

As causas profundas destes repetidos ciclos de violência devem ser abordadas com urgência. Isto exige a defesa do direito internacional e o fim do bloqueio ilegal de Israel a Gaza, que dura 16 anos, e de todos os outros aspectos do sistema de apartheid de Israel imposto a todos os palestinos. O governo israelita deve abster-se de incitar à violência e às tensões na Cisjordânia ocupada, incluindo Jerusalém Oriental, especialmente em torno de locais religiosos. A Anistia Internacional apela à comunidade internacional para que intervenha urgentemente para proteger os civis e evitar mais sofrimento.

Ao meio dia deste domingo, mais de mil pessoas já tinham morrido. A estimativa é de 750 pessoas desaparecidos. Um número indefinido de reféns foi levado para Gaza.

Os ataques sem precedentes do Hamas, que teriam pego de surpresa a inteligência militar de Israel, levaram o Knesset, o Parlamento israelense, a declarar guerra.

Dúvidas se de fato houve um apagão de inteligência invadiram as redes sociais, com teorias fazendo paralelo com os ataques a Pearl Harbor (1941) e ao World Trade Center (2001).

Estes ataques, que levaram os Estados Unidos a entrar oficialmente na Segunda Guerra Mundial e a invadir o Afeganistão e o Iraque teriam resultado de falhas da inteligência estadunidense.

Há intensa especulação de que Israel deixou a ofensiva inicial proceder com o intuito de ficar com as mãos livres para lidar com o Hamas e outros grupos que recebem apoio do Irã, como o Hezbollah.

O Hezbollah reagiu cautelosamente ao chamado para se envolver na guerra, promovendo desde o Líbano um ataque contra instalação militar israelense em território ocupado.

Mapa da ONU mostra o cerco total a Gaza exercido por Israel

O anúncio de que o governo de Israel decidiu pela retirada da população civil de algumas áreas adjacentes a Gaza pode ser visto como sinal de que haverá uma invasão por terra.

Marwan Bishara, o principal comentarista da Al Jazeera, lembrou que milhões de árabes vivem lado a lado com milhões de israelenses e previu que a crise pode desandar em violência comunitária sem precedentes.

Da população de Israel, de pouco mais de 9,3 milhões de habitantes, mais de 20% são árabes.

Mais de 5 milhões de palestinos vivem sob permanente vigilância de Israel em Gaza ou na Cisjordânia.

Hoje, cerca de 650 mil colonos israelenses vivem em território que o plano aprovado pela ONU destinaria a um estado palestino, de acordo com a entidade.

A violência de colonos armados contra civis palestinos é apontada como uma das causas do conflito atual, além da entrada de grupos religiosos judaicos na mesquita de Al Aqsa, em Jerusalém, considerada território sagrado por 1,6 bilhão de muçulmanos.

Lideranças palestinas dizem que é plano deliberado dos governos de extrema-direita de Israel, com forte influência de partidos religiosos, de ocupar toda a Cisjordânia, reduzindo o território palestino ao que definem como "campo de concentração" de Gaza.

A ofensiva de Israel contra Gaza é uma oportunidade para o primeiro ministro Benjamin Netanyahu quebrar a espinha dorsal do Hamas, mas envolve várias armadilhas.

Combates de infantaria em território densamente povoado podem desandar em matança sem precedente de civis, além de oferecer ao Hamas e outros grupos palestinos a oportunidade de reagir com emboscadas e homens-bomba.

Nos últimos anos, a diplomacia de Israel foi razoavelmente bem sucedida na aproximação com vários governos árabes ou muçulmanos, como o da Turquia, o que resultou no congelamento de qualquer negociação de paz.

O apoio à expansão dos assentamentos ganhou tração entre os partidos religiosos que, apesar de minoritários, atuam como fiel da balança na política de Israel.

Massacres de civis em Gaza poderiam custar caro ao esforço diplomático de isolamento da causa palestina.

Do ponto-de-vista interno, no entanto, o Hamas acertou num alvo que Netanyahu terá de reparar, ao custo de eventualmente ser apeado do poder: a sensação de segurança que tornou possível a expansão contínua dos assentamentos de Israel em território ocupado.

Depois de Netanyahu propor um governo de união nacional e obter apoio unânime do Ocidente, lideranças militares ligadas ao governo de Israel falam em redesenhar o mapa da ocupação, da mesma forma que aconteceu depois da guerra do Yom Kippur, em 1973, quando Israel foi atacada por Egito e Síria.

Até agora, os governos árabes reagiram de forma cautelosa ao ataque do Hamas, diferentemente do que se viu no Irã, onde um porta-voz pontuou que "essa operação é um movimento espontâneo de resistência do povo oprimido da Palestina para defender seus direitos e é uma reação natural às políticas provocadoras e belicosas dos sionistas".

Durante a madrugada, no bombardeio aéreo a Gaza, áreas inteiras foram demolidas por ataques do Israel, uma tática que costuma preceder incursões armadas por terra.

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