Na manhã deste sábado, 9 de julho de 2022, num cenário que não encontra paralelo em qualquer outro momento da nossa história, 33 milhões de brasileiros passavam fome e outros 125 milhões comiam alimentos sem qualidade nutricional e em quantidade insuficiente. No entanto, o discurso eleitoral do presidente Jair Bolsonaro se guiou pelo cinismo, delírio, violência e autoritarismo: “guerra”, “socialismo”, “aborto”, “família”, enfim.
Na tal Marcha Para Jesus, que é organizada por um homem que se autointitula “apóstolo” e que com sua esposa já foi preso e condenado nos EUA por “contrabando de dinheiro”, além de ter respondido no Brasil por evasão de divisas, falsidade ideológica e estelionato, o caminhão de som foi colocado bem em frente ao portão de entrada do batalhão da Rota, a unidade da PM paulista que mais mata. Os berros, o teor das palavras e o clima no local eram de alucinação.
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Sim, alucinação. Quem, diante da maior e mais devastadora crise socioeconômica de todos os tempos, acredita que os problemas do Brasil se originam do “socialismo”, do “aborto” e da “ideologia de gênero”? Aliás, quem, em sã consciência e testemunhando os horrores da fome, acha que a saída para tudo está numa “guerra”?
A participação de Jair Bolsonaro na tal Marcha Para Jesus, onde é tratado como um deus e bajulado por multidões de fanáticos fundamentalistas que se ajoelham no asfalto para evocar uma entidade suprema profundamente reacionária, é uma confissão sobre suas prioridades. Ele quer mesmo uma “guerra” e não à toa tem armado seus fiéis seguidores alucinados até os dentes. Ele quer sim continuar a alimentar esse espantalho ridículo de um “socialismo” imaginário a quem atribui todos os resultados irrisórios e pífios de seu governo. Bolsonaro quer seguir com sua misoginia, seu machismo e seu discurso de superioridade patriarcal impondo às mulheres o controle de seus corpos por meio do rançoso e medieval discurso religioso sobre o aborto.
A porta do 1° Batalhão de Choque da Polícia Militar do Estado de São Paulo, das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar, a Rota, é o mise-en-scène ideal para toda essa pantomima patética. No imaginário de suas falanges abrutalhadas e irracionais, é dali que saem os valorosos homens que matam o inimigo e devem ser venerados como uma casta superior. Eles teriam, supostamente, a tríade fantasiosa, infantil e fraudulenta do bolsonarismo: a farda, a arma e a honestidade inviolável.
“Que nosso povo não experimente as dores do socialismo. Não queremos isso para o nosso Brasil. Estamos aqui para declarar que Jesus Cristo é o Senhor de São Paulo e do Brasil”, diz o homem que só pelo tom da voz e pelo caminhão de mentiras, maluquices e traços de mau-caratismo que despeja diariamente pode ser desmascarado à distância, exceto por seus iguais e pelos incautos.
Esse 9 de julho com muito delírio, fundamentalismo, extremismo, clamor por violência, mentiras e cinismo, bem na porta dos guerreiros que simbolicamente promovem o morticínio dos pobres, é, sobretudo, um sábado de muita confissão e sinceridade, afinal, não dá pra negar que tudo isso segue sendo a prioridade do presidente.