Quando um jornalista da grande imprensa faz um comentário sobre economia, ele não está falando para a nação, mas para o mercado financeiro. Não se trata de análises, observações, reflexões sobre o destino das pessoas pobres, com carência alimentar etc. Mas de como o Brasil deve se comportar para ampliar os lucros do mercado financeiro.
Quem paga o salário de um jornalista que trabalha para as grandes emissoras são os empresários que os contratam para serem seus porta-vozes. Por isso que, num mundo onde os governos das grandes economias mundiais estão subsidiando a indústria de seus países, a Rede Globo, Record, Band etc defendem o oposto. E cantando num coro ao lado de Paulo Guedes, acreditam que é o investimento privado que nos salvará da crise.
Para essa gente, a regulação do Estado sobre a economia é um crime. Não só um crime, mas insanidade, e argumentam que é impossível uma economia prosperar deste modo. Mas e a China? E o Bidenomics?
A verdade é que a cabeça dos liberais da grande imprensa ainda está nos finais do século XVIII, quando a Revolução Francesa pariu a Constituição de 1791.
Existe uma oposição à política do pleno emprego. Paul Singer retrata como funcionava no tempo da Revolução Francesa: “O pressuposto dos constituintes era que o desemprego em massa era o produto dos monopólios e das restrições à livre circulação de mercadorias e homens por todos os mercados. Esse pressuposto é até hoje o argumento fundamental para recusar não só o direito de cada um a algum trabalho a ser oferecido pelo Estado, mas também a adoção de políticas fiscais e monetárias pelo Estado que elevam a demanda efetiva até o ponto em que a demanda por força de trabalho cubra aproximadamente a totalidade dos que oferecem sua capacidade de trabalhar ao mercado".[1]
Os empregadores acreditam que se o Estado entrasse na jogada de modo a forçar uma política na qual garantisse aos operários que encontrassem trabalho em quaisquer circunstâncias, “tornaria os trabalhadores exigentes em relação ao trabalho".
É um plano ardiloso em que é necessário dificultar o acesso ao emprego, ou precarizar o trabalho. Hoje, num mundo marcado pelo trabalho de plataformas digitais, no qual o trabalho se confunde com um bico ou trabalho amador, o desemprego é ainda mais forçado, as crises são projetos de maximização de lucros e precarização do trabalho. O capital percebeu que é preciso trabalho para aumentar os lucros, mas, para isso, busca tornar as despesas com o trabalho cada vez mais baratas.
As empresas observaram que para ampliar sua fortuna é preciso dispensar os custos sobre o trabalho e transferí-los para o trabalhador assim como os riscos. Elas não querem dividir com os trabalhadores os custos da alimentação, saúde e nem mesmo das ferramentas de trabalho. A lógica da indústria 4.0 adota uma racionalidade neoliberal de financeirização na qual os lucros são cada vez maiores e os custos quase zero.
Muitos acreditavam no fim do emprego. Que os humanos seriam substituídos por máquinas. Isso não vai acontecer. As máquinas não serão a razão do desemprego, mas a razão da precarização do trabalho. Os trabalhadores cumprem as tarefas, no tempo e no modelo determinado pelas orientações dos aplicativos (Uber, Ifood, Amazon…)
Hoje, o capital quer transformar o trabalhador em parceiro. Se não é possível fazer isto ideologicamente, será feito na marra. E na marra é gerando crises, ampliando o desemprego e empurrando os trabalhadores para essa exploração cruel e desproporcional.
São crises fabricadas porque no fundo não são crises, é o neoliberalismo mesmo. Menos direitos para se ter mais empregos não é uma solução para uma suposta crise, é o regime de trabalho do neoliberalismo.
É como o encarecimento dos produtos. Esta é a forma que o neoliberalismo usa para manter a circulação do capital em meio a guerras, pandemias etc. Não interessa se pessoas vão perder o acesso ao alimento, ao gás, à luz, o objetivo é manter os lucros e a circulação do capital.
Em um sistema não liberal, há outras formas de lidar com tais situações catastróficas (fixação dos preços, assistência social, taxação dos mais ricos etc.), mas no sistema neoliberal a forma de lidar com os problemas mundiais é fabricando crises para, em seguida, lançar o argumento de que o neoliberalismo não deu certo por conta da guerra, por conta da pandemia, por conta da corrupção, por conta de um presidente fascista…
O fato é que o neoliberalismo é a crise… Os direitos sociais estão em conflito com os interesses liberais. Por isso é necessário justificar a perda de direitos por meio de situações catastróficas. Sem estas, o neoliberalismo ficaria nu, sem suas roupas costuradas pela retórica midiática e, provavelmente, o rechaçariam, ririam da sua mediocridade.
Suas vestes alimentam o caos para remediar a todos com a falsa esperança de que um dia vai melhorar. Mas temos que entender que com o neoliberalismo nada mudará. É continuar fazendo a mesma coisa esperando um resultado diferente. Uma insanidade…
Agora, olha que coisa mais interessante. O trabalhador produz o dinheiro para uma empresa que paga jornalistas para influenciarem a opinião pública contra os próprios trabalhadores! O fim desse ciclo é o voto em políticos que são os braços legislativo e executivo destas corporações. É uma lógica perversa que tem um objetivo claro: a maximização dos lucros sobre a intensificação da exploração trabalhista.
[1] SINGER, P. Cidadania para todos. In: PINSKY, J. e PINSKY, B. História da cidadania. São Paulo: Contexto, 2008, p. 213-214.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.