Uma grande violência contra as famílias mais vulneráveis do Brasil está prestes a acontecer. O prazo da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 828), que proíbe despejos durante a pandemia finda no próximo dia 31 de março e, caso não seja prorrogado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mais de 500 mil pessoas correm o risco de serem retiradas à força de seus lares, em meio as consequências da grave crise sanitária que ainda afeta a maioria da população - em especial os mais pobres. Por conta dessa situação, a Central de Movimentos Populares (CMP), faz um apelo à Suprema Corte para que acate um novo pedido da Campanha Nacional Despejo Zero e mantenha suspensos os despejos no país.
Em números, podemos ter uma noção dessa tragédia social. Estima-se que no Brasil o déficit habitacional atinja o patamar recorde de mais de 7,8 milhões de moradias, mais de 200 mil pessoas vivem nas ruas, com mais de 12 milhões de desempregados e 28 milhões de pessoas que voltaram a viver abaixo da linha da pobreza, com a insegurança alimentar atingindo 120 milhões de brasileiros. É neste contexto que se encontram as cerca de 500 mil pessoas, dentre elas 300 mil mulheres, ameaçadas de despejo hoje no Brasil. Elas pertencem a famílias que perderam seus empregos e, portanto, não mais conseguem pagar aluguel, têm fontes de renda precárias e ainda estão lidando com o aumento da conta de luz, do gás de cozinha que se soma a outras tragédias como a falta de carne, arroz e feijão para se alimentar.
Ao longo da pandemia, mesmo com a vigência da Lei Federal 14.216/2021 e diversas leis estaduais para impedir remoções em meio à crise sanitária, mais de 23 mil famílias foram despejadas no Brasil. A resposta do Estado quando se refere aos grupos mais vulneráveis é sempre muito violenta, tira a dignidade e a esperança em dias melhores. Se não fossem os movimentos populares e outros coletivos que atuam na área do direito à moradia terem protagonizado campanhas como a do Despejo Zero, as remoções de famílias nas periferias e no campo teriam atingido ainda mais pessoas, deixando um número mais alto de famílias sem um teto e expostas ao vírus mortal da covid-19.
Para recuperar a dignidade das famílias de baixa renda, o Brasil precisa retomar com urgência uma política de moradia voltada às populações que mais precisam. Desde 2016, houve um verdadeiro desmonte no nosso país com o fim do Ministério das Cidades e a destruição de programas como o Minha Casa, Minha Vida, que era direcionado para atender a população mais pobre. A CMP integra a Campanha Despejo Zero, articulação que congrega mais de 60 entidades, entre movimentos populares, sociais, coletivos e laboratórios de pesquisas, que tem atuando para impedir despejos, especialmente durante a pandemia.
O drama da moradia tem aumentado nos últimos meses com a pandemia da Covid-19 e com os recentes desastres ambientais que causaram a perda de moradias e deixaram milhares de pessoas desabrigadas, especialmente nos estados de Minas Gerais, Bahia e Rio de Janeiro. Essas tragédias não são fruto de causas naturais. Elas decorem da profunda destruição ambiental que altera mudanças climáticas, ausência de política habitacional, especulação imobiliária e desigualdade social.
Contudo, a nossa luta agora é para que os despejos sejam cancelados enquanto os impactos impostos pela pandemia não forem superados. O despejo de cerca de 500 mil pessoas de suas casas a partir do próximo dia 31 de março é desumano, é cruel, viola os direitos humanos. Por essa razão, a Campanha Despejo Zero, da qual a CMP faz parte, irá protocolar nos próximos dias no STF um pedido de prorrogação da APDF 828, para que a mesma tenha validade enquanto perdurar a pandemia da Covid-19. E, para sensibilizar os ministros da Corte e dialogar com a população sobre a necessidade de proteger essas pessoas em suas casas, vamos promover no próximo dia 17 uma mobilização nacional em todo o país, especialmente em frente ao STF, em Brasília, e nos Tribunais de Justiças nos estados. STF prorroga já! Despejo Zero!
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum