O adágio popular ensina: “nunca coloque todos os ovos na mesma cesta”. É nessa vibração que as classes dominantes brasileiras tem operado a disputa eleitoral de 2022.
Torcendo o nariz ou não, o grosso da burguesia apoiou Bolsonaro em 2018. Uma parte importante segue ainda apoiando o capitão e vai respaldá-lo de novo na contenda atual. Essa é a tática primeira.
A segunda opção é o sonho da terceira via (na prática uma candidatura neoliberal, mas não neofascista). A Faria Lima sem os exageros bolsonaristas. Não está fácil configurar e impulsionar essa alternativa.
Alckmin fez menos de 5% em 2018. Doria pontua nessa margem. Não se fazem mais tucanos eleitoralmente competitivos no pleito presidencial.
Outra operação do andar de cima é incidir sobre a candidatura, o programa e as ações de um provável futuro governo Lula. Assegurar Alckmin como vice do petista é vitória que anima demais a turma da bufunfa.
O reiterado favoritismo de Lula nas pesquisas tem enfraquecido a tática da terceira via e desidratado o endosso dos ricaços à reeleição do atual presidente.
A turma que realmente manda já precificou a eleição de Lula. E trabalha, desde já para impedir que o novo governo seja democrático-popular. Incidem em tudo.
Ah, mas Lula não fez nova “Carta aos Brasileiros”. Fez sim, ora. A carta em 2022 anda, influencia, fala, opina. E tem peso político extraordinário: atende por Geraldo, o vice.
Quer dizer que abandonaram Doria e Moro? Não, longe disso. Doria, em condições normais de temperatura e pressão seria o candidato natural dos caras.
Só que o PIG (homenagem ao saudoso Paulo Henrique Amorim) foi quem criou o juiz justiceiro e todo culto à operação Lavajato. Como abandonar de vez o Moro (mesmo com as repetidas demonstrações de que o sujeito não passa de um semianalfabeto sem nenhum carisma?)
Ou seja: as classes dominantes seguem pragmaticamente com Bolsonaro, embora boa parte adoraria eleger Doria e outra ficaria feliz demais com Moro.
Para nós, da esquerda, o desafio é enfrentar essa burguesia mais realista - que já aderiu ou finge aderir a Lula.
Hiperpragmáticos esses setores das elites estão de olho em como continuar ganhando o que ganham e focados nas brechas para influenciar, inspirar, neutralizar e manejar o centro das políticas de um terceiro governo Lula.
O desafio imediato para nós, socialistas que lutamos por mudanças estruturais, é incidir no programa, nas propostas da candidatura Lula. E ter força na campanha eleitoral, para que não seja algo morno, sem demarcação. E o mais complicado: disputar um provável terceiro governo Lula, lutando para que seja instrumento de mudanças.
Não basta reconstruir. É preciso transformar o Brasil.
A desgraceira que o bolsonarismo representa dá um sentindo de urgência a todos nós. Derrotar o neofascismo e voltar a um mínimo de normalidade democrática, quanto mais rápido for possível.
Ocorre que o neofascismo bolsonarista veio acoplado ao neoliberalismo do Paulo Guedes. Precisamos derrotar ambos. A candidatura Lula será um movimento arrebatador, de baixo para cima.
Lula lá: para mudar o país profundamente. A burguesia já está de olho nesse cenário. Já está operando. Trabalham a favor de um reeditado lulinha paz e amor - com os ricos. Um governo que não mude nada de importante.
2022 não é 2002, entretanto.
A crise é muito mais profunda e generalizada. Idem as expectativas do povo por um tempo melhor. Por rápidas mudanças.
É Lula de novo ancorado nesse impulso transformador. Com apoio popular.
Re-constitucionalizar o país. Desfazer todas as maldades de Temer e Bolsonaro. Começar a executar um programa radicalmente transformador, focado não apenas nas políticas públicas distributivas e no crescimento econômico.
Terceiro governo Lula será sem medo de ousar nas reformas estruturais –até para não abrir espaço para outro golpe. E também porque sabemos agora que em poucos anos as conquistas se dissipam se não estiverem lastreadas em uma arquitetura radicalmente transformadora.