Uma boa parte de ser vereadora é responder a perguntas frequentes: dá pra fazer uma lei sobre isso? Dá pra consertar o asfalto da minha rua? E a linha de ônibus que sumiu, volta quando? Questões aparentemente distantes, unidas pelas políticas públicas, que dão conta delas.
Como vereadora, participo da elaboração de políticas públicas legislando, e da concretização das leis fiscalizando como estão sendo executadas pela Prefeitura. Legislar e fiscalizar são igualmente importantes.
Tive a felicidade de aprovar, em 2022, a Lei Municipal 7.291, que instituiu o Programa Municipal de Enfrentamento ao Feminicídio, uma iniciativa legislativa construída em diálogo com movimentos sociais e organizações que atendem mulheres em situação de violência. O programa propõe à Prefeitura articular ações de diversas secretarias no atendimento às violências sofridas pelas mulheres, como forma de prevenir o Feminicídio. Isso porque, quando uma mulher é vítima de um assassinato, ela já sofreu diversas violências anteriores. O feminicídio é a ponta visível de um iceberg de violências, muitas vezes invisíveis aos que cercam a vítima.
A articulação das ações de saúde, assistência social, de direitos humanos e de defesa dos direitos das mulheres está entre as metas do programa, cujo objetivo central é reduzir/erradicar o feminicídio. Pela primeira vez na história da cidade, tínhamos a lei e os recursos para essa política pública, com a recriada Secretaria Especial de Políticas e Promoção da Mulher, dona de um orçamento de aproximadamente 25 milhões de reais, sendo 19 deles destinados ao combate às diversas formas de violência. Dinheiro que não dá pra fazer tudo o que é necessário nesse tema, mas dá pra fazer um bocado.
E é preciso reconhecer que há iniciativas importantes da secretaria, que já executou 14 dos 19 milhões previstos, cumprindo seu papel de execução das políticas públicas. Um exemplo digno de nota é a extensão por 6 meses do Cartão Mulher Carioca aos órfãos do feminicídio. Poderia avançar mais, durar mais tempo? Poderia, claro. Mas é um avanço. E como o anúncio da extensão do cartão é de abril, eu gosto de pensar que o Programa de Enfrentamento ao Feminicídio, aprovado no último 8 de março, ajudou a chamar a atenção para essa questão social tão importante. E o mais importante de tudo é que as políticas públicas avançaram.
Por tudo isso, eu preciso me dizer estarrecida ao descobrir que o Projeto de Lei Orçamentária Anual para 2023 traz um corte de 52% na verba destinada ao enfrentamento a todas as formas de violência contra as mulheres, o que significa que no ano que vem inteiro, a Secretaria Especial de Políticas e Promoção da Mulher terá menos dinheiro para gastar ao longo do ano do que teve para gastar até outubro desse ano.
O papel de vereadora, do qual falei no início do texto, me obriga a fazer algumas perguntas: não deveríamos estar caminhando em sentido contrário e ampliando os recursos para o combate à violência contra mulheres? O que justifica essa diminuição de recursos? Que políticas serão descontinuadas ou reduzidas? O que ficará por implementar? Se a previsão de arrecadação e despesas totais do Orçamento para 2023 subiu em média 10%, as ações da secretaria deveriam ter 10% a de mais dinheiro? Por último, não custa perguntar: pra onde esse dinheiro foi?
A não ser que haja um improvável estudo não revelado pela prefeitura indicando que as mulheres cariocas que sofrem violência estão todas atendidas, não há justificativa para retirar dinheiro do combate a essas violências. Um corte deste tamanho, quando o orçamento prevê que haverá mais dinheiro para a prefeitura gastar, só pode significar falta de prioridade. Falta de apreço pela vida das mulheres. E em algum lugar, um pouco de falta de vergonha.
Neste dia 25 de novembro, Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, um dia de luta, é fundamental lembrar que é nos corpos femininos que a violência sexista deixa as suas marcas. Só quem é mulher sabe o quanto a violência contra a outra dói em nós. Alguém precisa avisar ao Prefeito e ao Secretário de Fazenda que não é só um corte no orçamento. É um corte fundo na nossa carne.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.