OPINIÃO

O retorno da democracia no Brasil – Por Emir Sader

Os dois meses da eleição até sua posse serão ocupados por Lula, já eleito presidente. Bolsonaro, após as 48 horas iniciais de silêncio, provavelmente desaparecerá do cenário político brasileiro

Créditos: Ricardo Stuckert
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A eleição de Lula encerra um novo período de ruptura da democracia no Brasil, que começou com o golpe contra Dilma, consumado em 2016. Um processo que também impediu Lula de ser eleito presidente do Brasil em 2018 (para o qual foi era favorito para ganhar no primeiro turno).

Em vez disso, o Brasil experimentou governos de fato que reintroduziram o modelo neoliberal, com recessão econômica e desemprego, e autoritarismo em vez de democracia. Esse período termina com a derrota de Bolsonaro, que não conseguiu se reeleger

O Brasil teve a mais longa ditadura militar do Cone Sul (de 1964 a 1985, 21 anos), depois teve governos democraticamente eleitos de 1990 a 2016, 26 anos) e, novamente, um período de ruptura da democracia (de 2016 a 2022, 6 anos). E um período de transição democrática de 5 anos, de 1985 a 1990). No total, em 58 anos, 27 anos de ruptura da democracia, com 26 de continuidade democrática. Praticamente metade do tempo na democracia, a outra metade não.

A partir de 1º de janeiro, com a posse de Lula, o Brasil reinicia um novo período democrático. O discurso de Lula na noite de domingo já era considerado uma espécie de discurso de posse.

Enquanto Bolsonaro, após 48 horas de silêncio absoluto, como se já tivesse desistido do restante de seu mandato, fez uma declaração de 2 minutos (sic). Em que agradeceu os votos recebidos, caracterizou os bloqueios como uma reação aos resultados eleitorais, mas condenou o uso da violência. Imediatamente, reafirmo suas abordagens ideológicas. Nenhum reconhecimento de sua derrota, nenhuma referência a Lula.

Imediatamente, um de seus ministros afirmou estar pronto para o processo de transição, que começará no dia 3, com a presidente do PT, Gleisi Hoffman, representando o "presidente Lula", segundo suas próprias palavras.

O Judiciário considerou esses pronunciamentos como reconhecimento dos resultados eleitorais e início da transição para o novo Governo.

Lula ocupou, desde domingo à noite, todos os espaços políticos. Ele recebeu saudações de Biden, Putin, Macron, Ji Jinping, entre outros líderes. Ele almoçou na segunda-feira com Alberto Fernandez. Ele foi convidado a participar de uma reunião global sobre o clima, pelo presidente da

Egito, em novembro. López Obrador o convidou para outro evento internacional no México, também em novembro. Lula foi convidado a levar sua visão de mundo para a próxima reunião do Fórum Econômico Mundial, em Davos.

Os dois meses da eleição até sua posse serão ocupados por Lula, já eleito presidente. Bolsonaro, após as 48 horas iniciais de silêncio, provavelmente desaparecerá do cenário político brasileiro.

Os partidos que o apoiaram abordaram Lula para negociar os termos de adesão ao governo, o que levaria à maioria parlamentar de que Lula precisa. O primeiro foi o Centrão. Os principais governadores dos estados também apontaram para alianças com o governo Lula, entre eles os de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Lula, por sua vez, viaja para a Bahia, província que lhe deu maior apoio, além de se encontrar com os governadores do Nordeste, única região em que Lula triunfou (com 70%) de apoio.

Após meses de tensão e ansiedade, os brasileiros vivem momentos de alívio. Foi um longo ano para os brasileiros que viveram entre ameaças à democracia e a esperança da vitória de Lula. O resultado apertado deu origem a um clima pós-eleitoral e pós-Bolsonaro.

Não será fácil explicar para os filhos e netos de brasileiros como Bolsonaro se tornou presidente do Brasil. E como, no confronto entre Bolsonaro e Lula, ele triunfou por menos de 2% dos votos.

Mas a própria experiência da eleição de Dilma Rousseff, que também venceu por uma pequena margem, mostra a rapidez com que a página da eleição é virada. Ela iniciou seu governo com 70% de apoio. Lula deve ter esse mesmo tipo de apoio, pois os brasileiros passam das incertezas para um clima de esperança.

Já está sendo anunciado que a posse de Lula será um grande evento, com projeção internacional, que poderá aproximar Biden Putin e Xi Jinping. O Brasil já vive plenamente o clima pós-Bolsonaro e uma vida política totalmente liderada por Lula.