Um golpe agendado – Por Elika Takimoto

Como os fracos e os medíocres, Bolsonaro ameaça sair com a bola quando a iminência de perder o jogo fica óbvia

Jair Bolsonaro e Braga Netto - Foto: Marcos Corrêa/PRCréditos: Presidência da República
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Hoje, acordamos com um golpe agendado. Mais essa para nossa história. Aqui é Brasil 2021, mermão. Não tem mais golpe no susto, não. Aqui o negócio é organizado. É ordem e progresso nos retrocessos de uma democracia.

O ministro da Defesa, o general Braga Netto, está – como os inábeis, os incapazes e os incompetentes fazem – ameaçando dizendo que “se não tiver eleição auditável, não terá eleição”.  No mesmo dia em que o fato (negado recentemente pelo general) teria ocorrido, o próprio Bolsonaro repetiu publicamente a ameaça: “Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições”.

Como os fracos e os medíocres, Bolsonaro ameaça sair com a bola quando a iminência de perder o jogo fica óbvia.

Há quem veja isso como um golpe militar e está sofrendo como padecemos todo santo dia neste desgoverno diante de tanto desmonte, alucinação e incompetência.

Eu já leio essa ameaça braganettoniana de forma diferente. Acho que essa desfaçatez é mais uma consequência de um golpe militar que já está em andamento.

“Golpe militar? Onde? Quando? Já aconteceu? Perdi alguma notícia?”.

 Miga, senta que te explico.

Lembra que uma presidenta democraticamente eleita por 54 milhões de votos, sem crime de responsabilidade comprovado, teve um processo de impeachment aberto por um réu do Supremo Tribunal Federal, em uma Câmara em que parte dos deputados era investigada por crimes que vão do trabalho escravo à corrupção?

Então, tudo começa por ali. Talvez um pouco antes.

Na ocasião, o então deputado federal Jair Bolsonaro homenageou um dos piores, perversos e mais sádicos torturadores da ditadura: “Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff, pelo exército de Caxias, pelas Forças Armadas, pelo Brasil acima de tudo e por Deus acima de tudo, o meu voto é sim”. Sob o comando de Ustra, miga, centenas de pessoas foram torturadas. Ustra espancava grávidas e, certa vez, levou filhos (de 4 e 9 anos) para ver uma mãe sendo torturada.

Testemunhamos ali, não podemos nos esquecer porque isso nos fala muito sobre nosso presente, uma das cenas públicas mais violentas da nossa história. Além de não receber punição alguma, começou ali, ao ver que as instituições não funcionavam, uma campanha (que segue até hoje e da qual nos tornamos reféns), cuja principal carta é o discurso de ódio e as ameaças.

Bolsonaro se tornou presidente com ajuda do então juiz Sergio Moro, que depois virou ministro do governo que ajudou a eleger ao julgar parcialmente Lula. Depois disso, temos, pasme, miga, mais de 6 mil militares atuando em cargos civis no governo Bolsonaro.

“Sério?”.

Sério, miga.

Militares no governo ganharam milhares de cargos, privilégios na Previdência e sairão sem arranhões da reforma que se propõe a acabar com o serviço público.

Militares estão  em áreas nas quais não necessariamente contam com notório conhecimento como no Ministério da Educação, no Ministério da Saúde atuando na Anvisa; no Ministério da Agricultura ocupando o Incra; no Ministério dos Direitos Humanos, ocupando a Funai; no Ministério da Cidadania, ocupando a pasta responsável pelos Esportes; no Ministério do Desenvolvimento Regional, ocupando o departamento responsável pela defesa civil, como bem elencou o cientista político William Nozaki para a Rede Brasil Atual.

Militares estão também em postos de direção ou em conselhos de administração de algumas das maiores empresas estatais do país, como Petrobras, Eletrobras, Itaipu Binacional, Telebras, Correios e Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares.

É ou não é um governo militar, miga? Nem na ditadura tivemos tantos fardados ocupando cargos tão estratégicos.

Por outro lado, estamos vendo o desastre que estão sendo estas gestões. O pior, dado a pandemia, foi o general Eduardo Pazuello. Olhando o que estão fazendo, cai por terra aquela ideia de que militares são competentes politicamente e administrativamente falando. Pelo contrário, se o que está sendo apontado na CPI for provado, minha irmã, nem te conto…

No caso do Ministério da Educação, se eu falar, eu choro de tanta dor vendo uma pasta tão importante ser comandada por um lunático.

“Mas e agora com mais essa ameaça desse general Braga Netto?".

Se for também comprovado mais esse ato covarde, novamente, as Forças Armadas serão rebaixadas na opinião pública, já que estão ali para seguir e fazer valer a Constituição e não rasgá-la. Não há legitimidade constitucional para as Forças Armadas interferirem nas eleições de 2022.

Braga Netto é lambedor de saco de Bolsonaro e – como seu patrão – faz a política no grito dado por machos alucinados. Homens covardes não conhecem outra forma de governar.

Golpearam em 2016, golpearam em 2018 e estão agendando, agora, não mais um golpe para 2022, mas, sim, a manutenção de tudo isso que eles nos roubaram. Já temos presos políticos, gente exilada, pessoas ameaçadas de se pronunciarem publicamente contra o governo, pessoas mortas, queimas de arquivo, ataque às universidades… está tudo aí, miga.

Só agora, vemos muita gente acordando. Antes tarde do que nunca para enxergar como essa galera de extrema direita joga imundamente.

E por que agora isso? Tudo está por conta do voto impresso.

Em maio, Bolsonaro afirmou, sem apresentar provas, que as urnas eletrônicas permitem fraude: “Se não tiver voto impresso, sinal de que não vai ter a eleição. Acho que o recado está dado”. Ministros do STF se posicionaram contra e bastou para esses homens saírem com o dedo em riste, típica atitude de quem não consegue aprofundar um diálogo e defender seus ideais de forma educada e inteligente.

O que fazer?

Olha, eu leio por desaforo. Rio por sobrevivência. Dialogo como resistência.

Ah, e sim, vou para as ruas dia 24 de novo porque não quero ter essa crise de consciência. Luto sem cansaço contra toda essa nojeira e poderei falar isso para meus netos e minhas netas.

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.

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