Marielle Franco, Fiocruz, Cloroquina, pênis, bixas e Che Guevara

Ao confundir o ícone da Fiocruz com um pênis, a médica Mayra Pinheiro revela o discurso central do governo federal e da direita brasileira: o controle dos corpos e da vida sexual alheia

Foto: Leopoldo Silva - Agência Senado
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O depoimento da médica e secretária de Gestão do Trabalho e da Educação do Ministério da Saúde Mayra Pinheiro à CPI da Covid, realizado nesta terça-feira (25), é revelador em muitas camadas sobre o discurso que norteia todos os meandros do governo Bolsonaro e da direita brasileira, a saber: o corpo e a vida sexual da sociedade.

Em determinado momento, o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) colocou um áudio onde a médica Mayra Pinheiro reclama que a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) está tomada por políticas excessivamente LGBTs e que havia muitos tapetes com o rosto de Che Guevara, líder da revolução cubana. E também afirma que havia um pênis na porta da instituição,

"Tudo deles (Fiocruz) envolve LGBTI. Eles têm um pênis na porta da Fiocruz. Todos os tapetes das portas são a figura do Che Guevara, as salas são figurinhas do Lula Livre, Marielle Vive (…) a gente paga para cinco mil pessoas virem à Brasília para tirar a roupa, andar nu, fazer cocô em crucifixo", declarou a médica que, ao vivo assumiu ser a voz que dava conteúdo para o áudio. Posteriormente, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) explicou à gestora do governo Bolsonaro que o pênis que ela enxergou na porta da Fundação era na verdade o ícone da instituição.

A declaração de Mayra Pinheiro desnuda todo o campo ideológico e discursivo do governo Bolsonaro. Revela o que de fato movimenta a atual presidência da República: o controle dos corpos, a sexualidade alheia e, se possível, a eliminação das vidas LGBT de qualquer tipo de protocolo sanitário. É o clássico deletar e deixar morrer dos governos contemporâneos da extrema direita ocidental. Saúde apenas se for para normalizar.

A narrativa brasileira não anda só, caminha junto com os governos da Filipinas, Polônia e Hungria. Momentaneamente teve parceiros fundamentalistas nos governos da Bolívia e dos Estados Unidos.

Mas, para além dos poderes estatais a declaração de Mayra Pinheiro trouxe para a CPI os valores morais de uma articulação internacional que visa resgatar e ou mesmo edificar regimes políticos capitalistas e teocráticos. Cabe não subestimar, pois, contam com amplo apoio financeiro. Vocês leram alguma carta ou manifestação de incômodo com o governo Bolsonaro que tenha partido de agentes do mercado financeiro?

Os últimos dez anos serviram para os mais variados grupos da extrema direita se encontrarem e traçarem estratégias. A fala de Pinheiro pode ser encontrada nas bocas de várias licenças ou materiais que são distribuídos Brasil afora. Trata-se de um discurso anti-comunismo, anti-LGBT e profundamente racista.

Ao citar Marielle Franco, a médica Mayra Pinheiro não o fez como lamento pelo assassinato da parlamentar carioca, em 2018, mas sim revelando incômodo que a sua memória estivesse presente dentro da Fiocruz. Vivo ou morto o corpo LGBT, para a extrema direita brasileira e especificamente para o governo Bolsonaro, é um incômodo a ser eliminado.