Desigualdade social e o racismo – Por Raimundo Bonfim

Em meio às crises econômica, social e sanitária, justamente quando o país mais precisava, o governo Bolsonaro cortou o orçamento e paralisou as políticas públicas. Todas as áreas foram afetadas e as consequências atingiram em cheio a população mais necessitada

Foto: Marcelo Casal/Agência BrasilCréditos: Marcello Casal Jr./Agência Brasil
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Cenas lamentáveis e revoltantes de pessoas em busca de ossos em açougues, para tentar retirar restos de carne para comer, ou em supermercados a procura de cabeças de peixe e pés de galinha têm sido cada vez mais frequentes no nosso país. A pobreza no Brasil chegou a tal ponto de termos que assistir a seres humanos aguardarem a passagem dos caminhões de lixo pelas ruas para se amontoarem na tentativa de encontrar algo para se alimentar. São cenas estarrecedoras que escancaram a fome e a miséria no nosso país. Uma vergonha internacional, principalmente porque o Brasil é o terceiro produtor de alimento do mundo, o segundo exportador, enquanto o povo passa fome.

Em meio ao desastre social e econômico, os empresários, sempre ávidos pelos lucros acima de tudo, se aproveitaram do drama das pessoas, para garantir comida na mesa, e resolveram vender restos de animais que antes eram destinados a cachorros. Esse aumento da pobreza a que o país foi submetido nos últimos anos tem culpados: o presidente Jair Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, que adotaram uma política econômica que exclui a classe trabalhadora e que foi arquitetada para atender o mercado. É assim que o capitalismo sobrevive: da exploração da miséria, com desprezo pela vida e desumanidade.

A política econômica em curso privilegia a alta da taxa de juros, beneficia o sistema financeiro em detrimento da produção. A permanente instabilidade política não atrai investimentos privados, sejam internos ou externos. Sem prioridade para políticas públicas, para obras de infraestrutura e falta de apoio, por meio de crédito para as pequenas e médias empresas, os trabalhadores são jogados na absoluta pobreza.

Em meio às crises econômica, social e sanitária, justamente quando o país mais precisava, o governo Bolsonaro cortou o orçamento e paralisou as políticas públicas. Todas as áreas foram afetadas e as consequências atingiram em cheio a população mais necessitada. Resultado: hoje temos quase 20 milhões de pessoas passando fome. Segundo estudo da Rede Penssan, mais de 117 milhões não se alimentam (isso significa que quase 50% da população brasileira comem menos do que o necessário, não comem ou não sabe se vão comer).

Esse quadro de desmonte do país, de desemprego e de fome começou antes da eleição de Bolsonaro, em 2018. Teve início com a Operação Lava Jato que culminou com o golpe contra ex-presidenta Dilma, continuou com a destruição dos direitos trabalhistas e da Previdência Social, aprovadas no governo do golpista Michel Temer e mantidas e aprofundadas por Bolsonaro e Guedes. A adoção de uma política ultraneoliberal imprimiu ao país números desesperadores: 15 milhões de desempregados, 25 milhões vivendo de “bico”. Ou seja, sem carteira assinada ou qualquer vínculo formal, sem nenhuma proteção social.

Além do aumento do número de desempregados, do crescimento da fome e da miséria, o povo empobrecido ainda enfrenta a crescente alta de preços de produtos e serviços. Levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) aponta que o valor da cesta básica, por exemplo, em algumas capitais chega a R$ 700 reais. O alto custo do gás de cozinha, que ultrapassa o valor de R$ 100 reais em algumas cidades, da energia elétrica e da água, da comida; a falta de auxílio emergencial e o fim do Bolsa Família põem cada vez mais o povo na exclusão social, ao mesmo tempo em que segue a política de desvalorização do salário mínimo, que está em R$ 1.100 reais apenas.

Enquanto as famílias lutam para garantir a sobrevivência no dia a dia, fomos surpreendidos há pouco tempo com a revelação de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, mantém investimentos milionários em paraísos fiscais, os chamados offshore, que são usados para esconder a origem do dinheiro aplicado. Não bastassem a carestia da comida e dos serviços, convivemos com um governo submerso em escândalos de corrupção e irregularidades, muitas delas reveladas pela CPI da Covid-19, que pediu o indiciamento de 80 pessoas, entre elas do presidente Jair Bolsonaro, de seus filhos Carlos, Eduardo e Flávio Bolsonaro e do ex-ministro Eduardo Pazuello.

Nós, militantes dos movimentos populares, temos denunciado a corrupção e toda forma de exclusão promovida pelo governo Bolsonaro. A Central de Movimentos Populares (CMP) integra a Campanha Fora Bolsonaro, articulação que congrega mais de 100 entidades de movimentos populares, sociais, sindicais, as frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo e partidos políticos de esquerda. Organizamos manifestações no Brasil e no exterior pela derrubada de todo governo Bolsonaro. Fizemos seis grandes atos, como milhares de pessoas nas ruas, sempre vinculando o mote Fora Bolsonaro com pautas sociais, como o desemprego, a vacina, a fome. .

Faremos no dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, mais um grande dia de protesto contra Bolsonaro, o racismo e genocídio da população negra. Sairemos às ruas também para denunciar o desemprego, a fome e a desigualdade social, que atingem principalmente a população negra e periférica.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que 54% da população brasileira é negra. É sabido que o capitalismo se consolidou no Brasil ancorado no racismo. Também não é novidade que as consequências da política ultraneoliberal e os efeitos da Covid-19 afetam muito mais os trabalhadores empobrecidos e os negros, especialmente a juventude e as mulheres – que sofrem uma tripla forma de discriminação porque são mulheres, negras e pobres. A discriminação sofrida pelas mulheres negras aparece em índices de violência que não deixam dúvidas: do total de mulheres assassinadas em 2019, 66% foram mulheres negras, de acordo com o Atlas da Violência 2021. Entre os homens, do total de mortos, os negros representam 77% das vítimas de homicídios. A desigualdade social é exposta também quando o tema é moradia. Em cortiços, vilas e favelas a disseminação do coronavírus foi muito mais rápida devido às condições precárias. Levantamento do IBGE/2020 aponta que  72% dos moradores de favelas são negros e negras.

O combate ao racismo é tarefa de todos e todas. Há uma estreita relação entre a luta contra o capitalismo, pela democracia e a superação do racismo, o fim do genocídio nas periferias, que só serão possíveis com o fim do capitalismo, do Bolsonaro e do bolsonarismo - responsável pelo espantoso crescimento do racismo.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.