Não há como entender o apoio evangélico a Bolsonaro sem entender um pouco da mentalidade de grande parte da igreja evangélica brasileira. A mentalidade evangélica "clássica" é a da contrariedade, do inimigo, da demonização do outro.
Não basta dizer que o meu é bom. Isso não adianta. A mente "evangélica" não funciona na lógica do bom, mas sempre na negação. Assim foi formado o "ethos" da maioria evangélica brasileira (oriundo do sul dos EUA), sempre baseado na NEGAÇÃO de alguma coisa. Exemplos:
Crente NÃO fuma.
Crente NÃO bebe.
Crente NÃO transa antes do casamento.
E por aí vai...
Nunca foi o contrário, do tipo "crente é quem ama", "crente é quem pratica a justiça", etc...
O "crente normal" brasileiro TEM QUE ter o que negar. Tem que ter o "inimigo". Tem que ter a quem demonizar, pois isso é que o identifica. A identidade do "crente", portanto, está na "não identificação" com o outro. Perceba que a maioria dos testemunhos evangélicos é na base do “deixei de fazer”: Ex-isso, ex-aquilo, ex-aquiloutro, ainda que no fundo não sejam tão ex assim...
Malafaia e cia entenderam todas essas coisas desde cedo... E por isso "dão certo". Souberam ler a realidade evangélica brasileira e montaram seus impérios em cima disso. São pregadores do ódio, da raiva, e forjam “perseguições” para que apareçam sempre como os “defensores da fé”, guerreiros de uma batalha sangrenta contra “as hostes de Satanás”.
Todo esse processo explica, também, a atual atuação política evangélica brasileira... Pautada pelo ódio e a intolerância... Percebam que o discurso desses falsos pastores contra a esquerda não se dá na argumentação política, mas na configuração do inimigo. Esse discurso dá certo com os "crentes".
É por isso que a violência de Bolsonaro “em nome de Deus” encontra espaço e corações abertos em uma parte do evangelicalismo brasileiro. É a força motriz do ódio “ao diabo”, inimigo dos inimigos, ardilosamente pintado pelos falsos líderes como “comunismo”, “gayzismo”, “abortismo”. Nada é discutido. Tudo é odiado. E combatido!
Mas... Tem jeito?
Tem!
É quando esse "crente" descobre o evangelho... E se encanta pela pessoa de Jesus. É quando descobre que, em Jesus, o que existe é acolhimento, graça e amor. E, acreditem, tem muita gente nessa luta, pregando aqui e ali esse Evangelho que realmente liberta, e liberta principalmente da necessidade de se odiar o diferente.
Mas isso dá trabalho... É um enorme processo de desconstrução, mas ele já está por aí, acontecendo por todo canto (principalmente nas periferias abandonadas pelo Estado, pela direita e também pela esquerda) e eu acredito que chegará o dia em que "a justiça fluirá como um rio..."
Pode demorar, mas eu sei que esse dia vai chegar...
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.