Desde que a DC Comics anunciou que a nova geração do Superman, no caso o filho de Clark Kent, Jon Kent, vai se descobrir bissexual ao longo da trama, nós descobrimos, ou melhor, nos certificamos de que a extrema direita é obcecada pela sexualidade alheia e pela disputa das mentalidades.
Não vimos jogador de vôlei ou deputado federal usando incansavelmente as suas redes para lamentar pessoas se alimentando de osso e lixo, mas sim espalhando discurso de ódio a partir da bissexualidade de Jon Kent.
Alguns até comentaram que tal postura e infantil, pois, se trata de um personagem fictício. Isso é um equívoco completo: não se trata apenas de uma HQ, mas sim de um produto consumido por milhares de pessoas, de todas as idades.
O objetivo da extrema direita, dentro e fora do Brasil, não é o Superman em si, mas o que a mudança anunciada pela DC Comics, mas também pela Marvel, que recentemente afirmou que vai incluir a questão LGBT em seus novos filmes (Eternos é o primeiro) significa para este grupo e o recado que ela dá para os setores democráticos da sociedade brasileira.
A guerra travada pelos fundamentalistas no Brasil não é para melhorar a economia e a vida dos mais pobres, mas sim para garantir o foro privilegiado e de dentro do Estado estabelecer uma guerra cultural constante. Spoiler: eles não precisam do Palácio do Planalto para isso.
Aliás, a censura da exposição em Porto Alegre e dos gibis com personagens LGBT na Bienal do Rio de Janeiro se deu a partir do terrorismo cultural que esses grupos fizeram a partir das redes.
A questão da sexualidade e dos grupos LGBT já são consideradas para líderes como Orban (Hungria) e Polônia (Bibi) como mais perniciosa do que o comunismo. O inimigo a ser derrotado são aqueles que tem por objetivo "destruir a família".
O jogador de vôlei, depois de ser demitido e vetado da seleção brasileira não foi às redes chorar, mas sim comemorar que agora tem mais de 700 mil seguidores (nesse momento já passou de 1 milhão) e novamente atacar o seu ex-colega de quadra em disputas nacionais. Já está eleito deputado federal, se assim o desejar.
Outra questão que também mostra até onde está indo a disputa por mentalidades e modos de vida é que neste momento grupos fundamentalistas estão atacando o brinquedo Pop-it, plástico bolha em silicone que virou febre entre as crianças durante os lockdown na pandemia. O motivo? o objeto possui as cores do arco-íris e teria "sido criado pelo movimento LGBT para confundir a cabeça das crianças".
Você pode rir e achar engraçado, mas a gente achou a mamadeira de piroca engraçada e ela elegeu o atual ocupante do Palácio do Planalto.
A LGBTfobia para além do crime
Na outra ponta, a esquerda e a centro-esquerda precisa entender o que está em jogo, parar de gastar energia com ataques contra a linguagem neutra e não apenas tratar da sexualidade quando provocada pela extrema direita.
Se quiser vencer as eleições (executivo e legislativo) terá de trazer o debate antes do discurso de ódio entupir as redes sociais, pois, a mamadeira de piroca 2022 já está pronta e sendo disseminada pelo país.
Portanto, a homofobia, além de ser crime, é parte de um modelo de sociedade incapaz de conviver com a diferença.
E a esquerda tem sido incapaz de fazer uma discussão sobre sexualidade de maneira libertária, a única coisa que tem conseguido oferecer é punitivismo. Isso não é debate político e nem disputa cultural.
Não se trata do Superman bissexual, mas se trata de uma guerra cultural que a esquerda brasileira está perdendo desde 2010, quando o então candidato à presidência José Serra (PSDB) abriu o bueiro do fundamentalismo e, desde então, o campo democrático só recuou.
Para além de tuítes e reações emocionadas, a esquerda precisa dizer qual é o seu projeto político para a luta antirracista, anti-machista e contra o ódio às LGBT… da economia nós já sabemos, falta juntar as pontas agora.