Essa semana aconteceu a exposição do baterista da banda CPM 22, o Japinha, que, na época, aos 38 anos de idade, falava em tirar a virgindade de uma menina de 16, fã da banda. Ele admitiu, disse que não fez nada demais, disse que era vegetariano e jamais faria mal a ninguém. Reviro os olhos.
Nas redes do grupo, fãs defendiam o baterista, que foi expulso, repetindo que ele não tinha feito nada demais. Afinal, "16 anos já sabe o que faz", "a menina estava se oferecendo", "ele apenas falou", bem parecido com o que fazem com vítimas de estupro dizendo que elas "estavam pedindo" e tirando a responsabilidade de quem cometeu a violência.
Tendo eu convivido no meio da música enquanto jovem demais, demais mesmo, quero chamar atenção para algo: isso é comum. Comum. Sempre foi. Chega de ser. Essas bandas de rock de hoje em dia, que tem homens de 40, 50 anos e fãs adolescentes, têm esse comportamento como regra. Mesmo quando eram mais jovens, muitos desses homens ficavam com meninas ainda mais jovens e vulneráveis. Mesmo sendo casados. Mesmo com filhos. O comportamento é recorrente.
Aí a gente tem que ouvir: o que elas estavam fazendo lá, elas também queriam, elas buscavam. É claro, que garota não cederia ao seu ídolo? Quantas meninas não vemos mudando o sobrenome para o do ídolo, como se fossem casadas com eles dentro de suas cabeças? Só funciona quando é algo distante, uma espécie de príncipe encantado sem defeitos do mundo real. É normal que as meninas fantasiem com seus ídolos. Faz parte. E esses homens jamais deveriam se aproveitar dessa posição de poder do imaginário de uma adolescente, muitas vezes recém saída da infância, 14, 15, 16 anos. Isso não é pedofilia, que é uma doença, isso é uma questão cultural, presente, diária. Homens mais velhos com meninas muito mais jovens. Está por todos os lados.
É uma questão cultural e estrutural, mas acredito também que alguns casos devam ser enxergados como fora da curva. A questão aqui é o homem usar do seu poder, do poder que ele sabe que ele tem no imaginário, para conseguir se sentir ainda mais poderoso, tratando mulheres como objetos e sendo verdadeiros colecionadores.
Não vou cravar aqui que tudo que acontece é abuso. Se tudo é abuso, nada é. Existem casos e casos, dos mais graves aos em que o homem foi apenas escroto e aí exposto como abusador. Existem muitas camadas de abuso psicológico, e às vezes, quando alguém coloca expectativa na outra pessoa e ela não corresponde, ela se sente violentada, pois isso causa dor. Particularmente, não acredito esses sejam casos de abuso. Deixando claro que não estou falando desse caso específico, em que um homem que poderia ser pai da garota estava falando de virgindade, ciúme, e "quero você pra mim". Porém, entre esses relatos, sempre vejo essa confusão acontecer. Não dá pra transformar toda mulher em vítima. Eu não gosto de ser rotulada como vítima, apesar de ter passado por situações na minha vida que foram muito ruins. Existem milhares de nuances em milhares de casos.
A questão é: isso aconteceu, isso acontece. Sempre aconteceu, e agora, com as redes, está sendo exposto. Só que, via de regra, não há consequências. Muitos desses casos sequer possuem uma tipificação. Os homens são expostos, as mulheres são massacradas, o caso é esquecido e a questão principal, que é essa estrutura de abuso, não é tocada. É o que acontece quando as forças são concentradas em personalizar questões. E aí continuam acontecendo. Enquanto isso não for discutido e não for compreendido como um problema real para aqueles que fazem e para aqueles que toleram, vai seguir acontecendo.
O que eu sugiro? Não sou detentora da verdade e raramente temos uma mágica solução, mas, para que ela venha, é preciso tocar nos pontos fundamentais e não apenas focar no cancelamento de internet.
O que eu sei é que cada vez mais homens têm medo de ser expostos. Isso leva alguns a apagar rastos e a uns outros tantos a ter medo mesmo. Que sejam coibidos, então, pelo medo, enquanto não forem por suas consciências.