A banda paulistana Ira! deverá lançar em breve, após 13 anos, um álbum de inéditas. Algumas de suas canções já começam a aparecer em singles. A mais poderosa delas é, sem dúvida alguma, “Mulheres à frente da Tropa”, composição do guitarrista Edgard Scandurra que homenageia, entre outras, as brasileiras Marielle Franco, Dandara e Preta Ferreira.
O clipe foi dirigido pela cineasta Luciana Sérvulo da Cunha, autora, entre outros, do filme “Hijos de La Revolución”, que aborda as recentes mudanças migratórias em direção a uma abertura política promovidas por Raúl Castro em Cuba – simbolizadas pela visita do ex-presidente norte-americano Barack Obama.
Filme e canção se entrelaçam de maneira comovente e certeira. Quase todo rodado na ocupação 9 de Julho, em São Paulo, o clipe e a música são endereçados a algumas mulheres mas, no final das contas, acaba homenageando a todas.
O roteiro, feito em parceria por Luciana e Edgard, se desenvolve a partir do sonho de uma senhora que, ao dormir em sua poltrona, enxerga diversas mulheres indo rumo a seus destinos. Dentre elas, importantes personalidades aparecem e são homenageadas.
Nem canção, nem clipe disfarçam em momento algum seu engajamento. Enquanto várias mulheres de diversas idades e etnias seguem para seus destinos pelas ruas de São Paulo, versos contundentes se contradizem propositalmente e de maneira irônica com a doçura da melodia.
“Ouçam os gritos das ruas
Peito à mostra, vozes agudas
Ouçam as bombas que caem no solo
Tremem os corpos das crianças de colo”
Enquanto segue o refrão, cantado também por um lindo coro feminino:
“Mulheres à frente da tropa”
No caminho das personagens que seguem resolutas, sempre aparecem, feito uma espécie de guia ou lembrança de luta, figuras como Marielle Franco, Dandara, Preta Ferreira. O vídeo conta ainda com a participação de representantes do MSTC, MTST e MST, ativistas, estudantes, adolescentes, crianças, artistas e performances.
“Jovens mulheres adolescentes
Lutam por todos, até os descrentes
Imóveis ficamos, sem reação
Somente nos restam os calos nas mãos”
O coral da canção se amplifica em espiral acompanhado pelo singular acompanhamento dos excelentes músicos da banda. Os violões de Edgard sugerem caminhos, ponteados por percussões inesperadas, em grande riqueza sonora. O diálogo da voz do próprio Edgard com as vozes femininas nos provoca o gosto do improvável equilíbrio yin e yang e a suave entrega do cantor ao lugar de fala, na letra escrita na terceira pessoa.
“Elas não temem o covarde opressor
Elas não fogem do perigo da dor
Pontas de lança da revolução
Dedico à vocês essa canção”
Ao final, diante de todas as personagens que se reagrupam entre danças e sorrisos, de volta à janela da senhora do sonho, o lindo e libertário voo por todas da bailarina Sandra Miyazawa, nos devolve a esperança e a vontade, em um desfecho mágico e inesperado.
“Mulheres à frente da tropa”