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OPINIÃO
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Estamos em ano eleitoral. E já começam os debates partidários sobre focos e prioridades. Partidos ideológicos costumam centrar seus esforços nos grandes centros urbanos. Os mais clientelistas, nos grotões. São apostas que definem um ranking de importância política.
Mas, qual é, afinal, o desenho dos municípios brasileiros e qual a relação entre realidade e este ranking político?
O Brasil possui 5.570 municípios. Desses, 4.717 (84,6% do total) possuem menos de 40 mil habitantes. Tempos atrás, o economista José Eli da Veiga (USP e ex-presidente da Fundação SEADE) chegou a propor um novo cálculo sobre a população rural brasileira. Segundo o PNAD 2015, 15,28% dos brasileiros vivem em áreas rurais. Mas, nos cálculos de José Eli, o percentual é bem maior. Nas palavras de José Eli:
"Quem procurar conhecer os critérios de classificação territorial utilizados nas duas dezenas de nações mais democráticas e mais desenvolvidas do planeta, facilmente perceberá que menos de 60% da população brasileira pode ser considerada urbana. Enquanto isso, a participação dos habitantes de municípios essencialmente rurais caiu de 32,5% para 30,4%, e a dos relativamente rurais manteve-se praticamente estável, muito próxima de 13%. O mais interessante, todavia, é que em um quarto dos municípios essencialmente rurais houve crescimento populacional bem superior ao dos urbanos. Nos 1109 municípios mais atraentes do Brasil rural, a população aumentou mais de 30%, enquanto ela crescia 20% no Brasil urbano, e 15% no conjunto do país.”
Recentemente, o governo Bolsonaro sugeriu extinguir os municípios com menos de 5 mil habitantes ou 22% do total de municípios. O principal argumento é que 73% dos municípios brasileiros tem gestão fiscal difícil ou crítica, vários sem condições de financiar seu parlamento local.
Se o argumento central do governo é este, então melhor extinguir 70% das nossas cidades. Este é o percentual de municípios brasileiros que dependem de recursos externos, para além do que arrecadam. 50% dos municípios brasileiros dependem dos repasses do FPM (Fundo de Participação dos Municípios), segundo a Confederação Nacional dos Municípios.
Mas, a situação não é tão confortável para os que possuem recursos ou os grandes municípios. Em 2019, a cidade de São Paulo ultrapassou o teto de endividamento público e obrigou o prefeito Bruno Covas a procurar alterar, no Senado, a regra imposta pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional.
Há estudos que indicam gastos sem prioridades em diversas cidades litorâneas que recebem royalties da extração do petróleo. Royalties do petróleo criaram ilhas de riqueza em 17 cidades, segundo o jornal Valor Econômico.
Mas, voltemos ao ranking político e as prioridades eleitorais dos partidos neste 2020. Lembremos que Haddad venceu na maioria dos municípios brasileiros, na eleição de 2018. Venceu em 2.810 municípios e Jair Bolsonaro em 2.760. Isso significa que o PT entrou e convenceu a população dos grotões, algo que, até os anos 2000, somente os partidos conservadores conseguiam.
Aliás, os governadores do PT estão no Nordeste. O que alimenta a leitura política sobre as prioridades eleitorais municipais. Em 2018, Bolsonaro teve 3,6 milhões de votos na cidade de São Paulo, e Haddad computou 2,4 milhões de votos. O petista venceu em todos os estados do Nordeste e Bolsonaro ganhou em toda a região Sul e também no Sudeste e no Centro-Oeste.
Assim, se o foco for 2022, o Sudeste passa a ter tanta importância quanto nordeste. E, sudeste, no caso, significa municípios com mais de 100 mil habitantes. Já para o PT, precisa manter sua hegemonia no Nordeste, mas avançar no Sudeste (ou recuperar o que já teve).
As eleições municipais, portanto, se apresentam como este jogo de xadrez cujo tabuleiro é fugidio. Tirarão o sono de candidatos, militantes e estrategistas. Mas farão a festa de cabos eleitorais e marqueteiros.