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OPINIÃO
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Não basta dizer que o governo de Jair Bolsonaro é de direita. Pra entender a dinâmica interna do governo é necessário um esforço maior de adjetivação. É necessário dividir a direita brasileira em dois grupos: a velha direita e a nova direita.
O sucesso eleitoral de Jair Bolsonaro significou a vitória da nova direita. A velha direita até foi chamada para compor o governo, mas ainda não conseguiu vencer as disputas internas e se tornar hegemônica.
Mas quem são os jovens? Quem são os velhos?
Os mais velhos primeiro.
Nenhum partido político representa mais a tal “velha direita” que o DEM. Começando pelos partidos regionais lá na República Velha, passando pela UDN nos anos 1940 e 50 e pela Arena durante a ditadura militar, chegando até PFL na IV República, o DEM tem no seu DNA a genealogia das velhas oligarquias brasileiras, a elite da terra, escravocrata.
Não foi o DEM quem venceu as eleições de 2018. Muito pelo contrário. Basta lembrar que o partido estava na grande coligação que apoiou a candidatura de Geraldo Alckmin, reeditando a aliança que foi fundamental para os governos tucanos na década de 1990.
Porém, mesmo perdendo as eleições, o DEM subiu a rampa junto com Jair Bolsonaro. Com alguma desconfiança, a velha direita acabou embarcando na canoa do capitão. Afinal, se o DEM confiasse em Bolsonaro a aliança teria nascido já no primeiro turno das eleições. Não tenho dúvidas de que Bolsonaro toparia. Na época ele estava sozinho, bateu em várias portas com o pires na mão. O DEM não quis apostar.
Não apostou por um motivo muito simples: Bolsonaro não representava a velha direita, a direita histórica, tradicional.
Bolsonaro representava outra coisa, algo que a maioria de nós ainda está tentando entender.
Nesses quase dois meses de governo, caos e incompetência se instalaram no Palácio do Planalto. As poucas vitórias que o governo teve deve, justamente, ao DEM. Rodrigo Maia sobrou nas eleições para a presidência da Câmara dos Deputados. Onyx Lorenzoni e Davi Alcolumbre deram um nó tático em Renan Calheiros e abocanharam a presidência do Senado.
O DEM controla as duas casas do Congresso Nacional. Não é pouca coisa. Não é mesmo. Se o presidente é fraco e inoperante, o DEM é eficiente e conhece muito bem a máquina. O DEM é a parte mais forte do governo.
Muito diferente é a “nova direita”
Formada, principalmente, por parlamentares do PSL (incluindo aqui os filhos do presidente da República), a nova direita é o resultado direto da narrativa do colapso que se difundiu no Brasil depois de junho de 2013. Segundo essa narrativa, a esquerda é a grande responsável pelo apocalipse e deve ser exterminada, varrida do mapa político brasileiro. A histeria antipetista foi alimentada pela pauta da moralização dos costumes. Tudo isso foi ressonado exponencialmente nas mídias digitais.
Na campanha, a estratégia da nova direita se mostrou imbatível. Bolsonaro venceu sem participar de debates, sem discutir seu plano de governo. Diante da ampla rejeição popular às reformas neoliberais, Bolsonaro venceu as eleições mesmo estando na companhia de um economista ultraliberal. A nova direita conduziu bem o espetáculo e lacrou o debate política.
A nova direita é digital e tem no Instagram, no Facebook, no Twitter e no WhatsApp o seu habitat natural. A velha direita é analógica, é habilidosa na conversa ao pé de orelha nos corredores do Congresso Nacional. A nova direita é boa de campanha. A velha direita é boa de política.
No governo, a nova direita só fez lambança. O barraco entre Gustavo Bebianno e Carlos Bolsonaro foi apenas um episódio entre outros tantos. Teve ainda o quebra pau envolvendo Joice Hasselmann e Eduardo Bolsonaro e a troca de xingamentos entre Olavo de Carvalho e a bancada do PSL que foi visitar a China, só pra citar alguns exemplos.
É certo que o caso Bebianno tem impacto político muito grande. O sujeito era um dos principais articuladores do governo, que essa semana deu início à batalha pela reforma da previdência. Onyx tentou até o fim evitar a demissão. Rodrigo Maia lamentou o ocorrido. Os aliados estão cada vez mais desconfiados. Bebianno estava ao lado de Bolsonaro lá no início, quando ninguém acreditava que um deputado inexpressivo e caricato pudesse se tornar presidente da décima maior economia do mundo.
Se Bolsonaro deixou seu filho mais novo humilhar publicamente seu escudeiro mais leal, o que não pode acontecer com um aliado de última hora, como é o DEM?
A nova direita investe muita energia em pautas absolutamente irrelevantes, que não agregam nenhum capital político para o governo, que só trazem desgaste. Ernesto Araújo age como um elefante em loja de cristal, desconsiderando completamente as liturgias tão valorizadas no campo da diplomacia. Ricardo Vélez Rodríguez diz que os brasileiros são canibais. Damares acusa os holandeses de abusarem sexualmente de crianças.
Contratos são rompidos, produtos brasileiros são boicotados no exterior.
Alguns acham que tudo isso é cortina de fumaça, como se o governo, estrategicamente, acionasse seus loucos de estimação para distrair a opinião pública. Não acredito em tamanha capacidade de articulação. Essa gente é aloprada mesmo.
Enquanto isso, os militares vão ocupando cargos estratégicos, ganhando mais espaço, se beneficiando do desgaste da nova direita. O DEM vai se articulando nos corredores do congresso, vai dando o ritmo da vida parlamentar do governo. Daí pode nascer uma nova situação de poder.
O jornal “Estadão”, que até aqui era simpático a Jair Bolsonaro, publicou na terça-feira, 19 de fevereiro, um editorial furioso que define o presidente como um “homem despreparado, incapaz e sem coragem”. O cerco está se fechando. Se Bolsonaro não controlar a afobação da nova direita dificilmente terminará o mandato. Basta saber se ele terá força pra tanto, se terá capacidade de liderar. Até aqui não teve.
No inferno, Antônio Carlos Magalhães, Carlos Lacerda e outros caciques da velha direita brasileira devem estar com comichões. Ao mesmo tempo desesperados com as trapalhadas dos mais jovens e gozando com janela de oportunidade que está aberta.
Afinal, não é de hoje que a velha direita é especialista em chegar ao poder sem ter sido eleita.
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