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OPINIÃO
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Novamente o ocupante do palácio brasiliense vem à porta de entrada e, fortemente vigiado, vocifera no breve capítulo da farsa iniciada em janeiro deste ano e rejubila diante das risadas dos bajuladores. Os cinegrafistas e seus colegas de profissão captam alguns dados tópicos, algumas frases canhestras no português sórdido do palaciano e carregam para as editorias, que buscam repercussão.
Sistematicamente, a personagem farsesca reclama de um governo dirigido por seu homônimo, questiona projetos de lei que se encontram no domínio de outro poder, fala mal de quaisquer instituições que não pensam como ele, nega a ciência e a cultura, fala em mudar propostas feitas pelo próprio governo, o homônimo. A personagem farsesca não é o presidente; é outro. Pouca gente acredita que poderia ser.
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Nos movimentos farsescos de todo dia, vivos e mortos são citados sem nenhum respeito, com tal intensidade e picardia que quase ninguém é capaz de se espantar ou se horrorizar. Religiosos de diversa estirpe gargalham e levantam as mãos como quem abençoa a peça farsesca. Nem mesmo a antiga exigência de que alto ocupante de palácio brasiliense deveria ter nível de estadista está em vigor. Tudo se transformou em farsa a partir da personagem que fala aos bajuladores quase todas as manhãs, sem outros compromissos.
As diversas plataformas de mídia repetem falas tópicas da personagem de porta de palácio e tratam o assunto seriamente, em nome de suposta ética interna às redes emissoras. Via de regra os jornalistas nunca questionam aquela forma de baixa comédia, pois se acostumaram a não ser ouvidos, fenômeno seguido pela maioria dos congressistas, visto que seus interesses são satisfeitos de alguma maneira. Evidentemente, os membros das altas cortes de justiça não se aproximam das falas e nada mudam em sua lenta caminhada de justiça, pelo menos enquanto não são totalmente envolvidos pela farsa.
No entanto, o pseudo-comediante diz coisas gravíssimas. Tanto maltrata a língua diante de aprendizes, crianças e adolescentes, quanto maltrata pessoas e imagens sem nenhum pudor, com uso de linguagem jamais vista e ouvida, exemplo vivo da falta de educação e da miséria cultural.
Parece existir um pacto infernal no mundo da farsa. Silêncio, risadinha entre dentes, atitude de respeito para inglês ver, obediência aos interesses do patronato que acumula recursos e mesmo o medo, aquele medo drummondiano que paralisa e amarela todas as relações humanas. Aos poucos, a federação vai virando um show de farsas variadas.
E a farsa segue. A última fala farsesca incluiu uma palavra talvez desconhecida do suposto comediante: energúmeno. O homônimo de presidente pensou em se referir ao educador Paulo Freire e ganhou novas risadas, audíveis nos microfones das mídias. Risadas esborrachadas e amplas, bocas abertas para alegrar o ator e para confirmar sua verdade. Risadas iguais às dos magnatas e industriais tidas e havidas quando o ator se referiu à garota Greta Thunberg. Machado de Assis precisaria de todo o seu engenho e arte para descrever a farsa nacional.
Energúmeno
A mídia que ainda se dá ao trabalho de sair das salas da vociferação, que é a minoria, busca repercutir. E me entristece vendo D. Nita Freire respondendo seriamente à farsa. Sim, ela fez bem, ainda que ela também saiba que respostas sérias diante da farsa nada significam, pois o enunciado sério deve ser coisa de adversários e esquerdistas, que de nada vale na leitura da farsa nacionalizada.
Não adianta mais tratar do papel histórico daquele que foi chamado de energúmeno. Nem a importância mundial de sua pedagogia. Muito menos que Paulo não criou um método, mas uma série de caminhos didático-pedagógicos que ampliam a comunhão entre aprendentes e ensinantes e os levam a um aprendizado alegre, rigoroso cientificamente, consciente do pertencimento social e consequente progresso da sociedade educada. Enfim, uma educação amorosa e inovadora. Ah, bom lembrar: jamais foi praticada no Brasil, pois a ditadura impôs sua ausência e os governos democráticos simplesmente tiveram medo de botar a mão na cumbuca da educação para a liberdade. No entanto, agora Paulo está presente (até sem ser citado, porque raras pessoas no Brasil o leram) nas escolas ricas dos pais ricos deste país, chamado de ensino por projetos centrado no aluno, com significativa valorização do professor, da professora.
Não, isso não adianta. Mas também não adianta rogar pragas e dizer que o espírito do Paulo virá puxar as pernas da personagem farsesca. De fato, não puxará, pois deve ter coisas lindas para fazer no mundo ativo dos grandes espíritos.
Energúmeno. Os melhores dicionários oferecem ao menos 5 acepções e a literatura mundial repercute tais acepções. Vejamos em Sacconi. 1. O obsessivo que se irrita e perde o equilíbrio emocional; 2. Aquele que só comete desatinos ou disparates; 3. Homem violento e extremista; 4.Homem muito ignorante ou desprovido de inteligência; 5. Aquele que é incapaz de fazer algo corretamente; 6. Homem possuído pelo demônio, possesso.
Ao fim e ao cabo, só há uma janela nesses argumentos farsescos, isto é, a personagem de porta de palácio, ao desejar escrachar Paulo Freire, de fato chamou o presidente de energúmeno, pois nenhuma acepção tem a ver com Paulo Freire de acordo com a consciência do mundo inteligente. O jogo da farsa só se resolve com a culpabilidade do “outro” farsesco. Não podendo ser Freire, é o outro eu, o eu outro da farsa.
Quanto ao presidente ofendido, ele nunca foi visto. Dizem que foi eleito, mas jamais apareceu. Ele não está em seu papel de representante do Estado. De fato, ele não é. O pais terá de esperar por um presidente.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.