Os bancários da Caixa Econômica Federal, representados pelo sindicato da categoria em São Paulo, Osasco e Região (Seeb/SP) e pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), formalizaram denúncia junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) contra o processo de IPO (Oferta Pública Inicial das ações) da Caixa Seguridade. Segundo a denúncia, duas instruções da CVM foram violadas. Com a medida, os trabalhadores do banco público esperam que a Comissão cancele o processo de privatização da subsidiária.
“Está claro que a abertura de capital da Caixa Seguridade tem diversas irregularidades”, afirma o presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae), Sergio Takemoto. Em assembleias com votação eletrônica realizadas por sindicatos de todo o país, nesta quinta-feira (22), os trabalhadores do banco deliberaram pelo estado de greve e paralisação das atividades nesta terça-feira (27), por 24 horas.
A denúncia feita à CVM, a aprovação do estado de greve e a paralisação na próxima semana ocorrem no contexto de uma campanha nacional contra a privatização da Caixa Seguridade e outras medidas de esvaziamento do banco público. A ação “Brasil Seguro é Caixa Pública”, durante todo este mês de abril, também reforça a posição dos bancários contrária à pressão do governo para a devolução dos chamados “Instrumentos Híbridos de Capital e Dívida (IHCDs)” — recursos que o banco aporta em seu capital para a concessão de crédito e investimentos em setores estratégicos ao desenvolvimento nacional, como infraestrutura, saneamento e habitação.
A denúncia — De acordo com a denúncia feita à CVM, o processo de IPO da Caixa Seguridade viola as instruções 400 e 539 da Comissão. A primeira normativa estabelece que o ofertante das ações — neste caso, os empregados da Caixa — devem receber preparação adequada e qualificação para vender os papéis. Apesar disso, o Sindicato dos Bancários de São Paulo Osasco e Região (Seeb/SP) tem recebido denúncias de cobrança de metas relacionadas ao IPO; inclusive, a reserva de R$ 1 milhão por gerente-geral.
Já a Instrução 539 trata da análise de risco e do perfil do cliente. Segundo a regra, as pessoas habilitadas a atuar como integrantes do sistema de distribuição e os consultores de valores mobiliários não podem recomendar produtos (no caso, as ações da Caixa Seguridade ofertadas no IPO) nem realizar operações ou prestar serviços sem que verifiquem a adequação de tais produtos ao perfil do cliente. É preciso analisar se a operação é adequada aos objetivos de investimento ou compatível com a situação financeira dos compradores.
“Se o empregado fizer uma venda inadequada de papéis, em desacordo com o perfil do cliente, ele pode ser responsabilizado. Por isso os bancos exigem cursos [para este tipo de operação/venda]”, explica o vice-presidente da CUT e diretor do Seeb/SP, Luiz Cláudio Marcolino, que protocolou as denúncias junto à CVM. “Em relação ao IPO, a direção da Caixa deveria ter essa preocupação; mas, estão forçando a oferta das ações de forma indiscriminada, colocando o empregado e o cliente em risco”, acrescenta.
Segundo ressalta Marcolino, a orientação dos gestores, conforme consta da denúncia, tem sido para que os bancários desconsiderem a adequação da abordagem ao perfil do cliente e exponham o IPO ao máximo. “É preciso deixar claro que esta não é uma ação isolada dos gerentes. É uma determinação da direção da empresa”, observa.
Na avaliação do presidente da Fenae, a pressão para a venda das ações como também para que os próprios trabalhadores comprem os papéis mostra o desespero da direção do banco e do governo para privatizar a Caixa a qualquer custo. “Sem falar no momento econômico totalmente inapropriado, quando as empresas que têm interesse em entrar na Bolsa de Valores estão desistindo dos negócios por conta da crise ocasionada pela pandemia”, ressalta Sergio Takemoto.
Campanha — Marcado para começar no próximo dia 29, o IPO da Caixa Seguridade é um dos principais focos da campanha “Brasil Seguro é Caixa Pública”. A operação de venda das ações, avaliada em R$ 60 bilhões antes da crise econômica causada pela pandemia da covid-19, agora é estimada em R$ 36 bilhões. “Praticamente, a metade do valor”, ressalta o presidente da Fenae.
Esta é a terceira vez que a direção do banco tenta vender a subsidiária. A última tentativa, no último mês de setembro, foi suspensa diante da instabilidade do mercado.
“Paralelamente à venda da Caixa Seguridade e de outras subsidiárias do banco que geram lucro ao Brasil, enfraquecendo a única empresa 100% pública do país, o governo toma medidas para diminuir ainda mais a sua capacidade de realizar políticas públicas impulsionadas pelos bancos estatais”, afirma Sergio Takemoto, em referência à devolução dos recursos de IHCDs ao Tesouro Nacional para o pagamento da dívida pública.
Os Instrumentos Híbridos de Capital e Dívida é um tipo de contrato — regulamentado, legal e auditado — de empréstimo realizado junto ao Tesouro que reforça o capital das instituições financeiras. Instrumentos como este não têm data de vencimento. Entre 2007 e 2013, a Caixa firmou seis contratos de IHCD para aumentar a capacidade de oferta de crédito, diminuir a taxa de juros e elevar o investimento do banco em políticas públicas.
Manobras para privatização — A exemplo da Caixa Seguridade, o governo vem usando subterfúgios para vender a Caixa Econômica Federal aos pedaços, de forma disfarçada. Ano passado, editou medida provisória (MP 995) que abriu caminho para a privatização do banco público por meio da criação e venda de subsidiárias sem o aval do Congresso. A manobra, inclusive, é questionada no Supremo Tribunal Federal (STF) em Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs); uma delas, ajuizada pela Fenae e a Contraf contra a privatização fatiada também da Petrobras.
Além da Caixa Seguridade, o governo trabalha para a venda de outras áreas estratégicas da Caixa Econômica, como Cartões, Gestão de Recursos e Loterias. O ainda nem formalizado Banco Digital também está na lista de privatizações. Trata-se, na verdade, de uma outra instituição financeira para onde serão transferidas as principais operações da Caixa, desidratando o banco público, segundo alerta o presidente da Fenae.
“O governo está entregando nosso patrimônio ao mercado. Essas medidas representam o fim da Caixa, dos programas sociais e dos investimentos para o desenvolvimento do país”, emenda Sergio Takemoto.