O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) iniciou, nesta terça-feira (26), o julgamento de duas ações que pedem a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão por abuso de poder econômico durante a campanha eleitoral em 2018. Por enquanto, dois ministros seguiram o voto do relator Luís Felipe Salomão e o placar está em 3 x 0 contra a cassação. Ainda faltam 4 ministros para votar.
As ações analisadas pelo tribunal foram apresentadas ainda em 2018 pela coligação “O Povo Feliz De Novo”, que tinha Fernando Haddad (PT) como candidato à presidência.
Na primeira, a chapa de Bolsonaro e Mourão é acusada, junto com o empresário Luciano Hang e as empresas Quick Mobile, Yacows, Croc Services, SMSMarket e WhatsApp, de irregularidades na contratação de serviços de disparos de mensagens em massa. Na outra, a coligação de Haddad aponta que a campanha de Bolsonaro, junto a empresas, usou de forma fraudulenta nomes e CPFs de idosos para registar chips de celular e garantir os disparos ilegais de mensagens, que envolviam fake news e ataques contra adversários.
Ao proferir seu voto, o relator Luís Felipe Salomão reconheceu que as provas apresentadas nas ações “demonstram que ao menos desde o início da campanha [de Bolsonaro] o foco residiu mesmo na mobilização e captação de votos mediante uso de ferramentas tecnológicas”, assumindo que houve uso indevido de mídias sociais, como WhatsApp, para promover ataques a adversários e desequilibrar o processo eleitoral.
O ministro, ainda que tenha reconhecido irregularidades na estrutura de comunicação da chapa de Bolsonaro, porém, votou contra a cassação pois, segundo ele, não foi possível “comprovar a gravidade do caso” com relação ao alcance desta conduta, isto é, os efeitos que isso possa ter gerado no eleitorado.
Vai acabar em pizza?
De acordo com o advogado Luiz Eduardo Peccinin, que é especialista em Direito Eleitoral, "cassar um mandato presidencial seria inédito e nada simples". Ele vai na linha do que foi argumentado por Salomão. "Depende muito das provas que foram produzidas e também da chamada gravidade da conduta, exigida para que a justiça eleitoral casse um mandato. Ou seja, não basta um ilícito eleitoral (que pode ser constatado hoje), isso envolve uma análise complexa de proporcionalidade, da responsabilidade do candidato, da repercussão da ilicitude sobre o processo eleitoral", disse à Fórum.
O advogado explica que ainda há muitos pontos da investigação que não vieram à público pois envolvem fatos sigilosos e que, no início do inquérito, "não foram produzidas provas consideradas essenciais para analisar a responsabilidade da campanha sobre o que foi denunciado, como buscas e apreensões na sede das empresas de disparo".
"É difícil prever um resultado, mas a essa altura é mais provável que o TSE entenda por deixar as coisas como estão para as eleições do ano que vem", atesta Peccinin.
O especialista pondera, contudo, que "independente do resultado", o julgamento é importante para o TSE "porque irá indicar a postura da corte em relação às eleições de 2022. Isso, de fato, já começou a ser configurado.
Apesar de votar contra a cassação, o ministro Luís Felipe Salomão sugeriu que o tribunal firme um entendimento de que o uso de aplicativos de mensagens para realizar disparos em massa, promovendo desinformação e ataques a adversários, configure abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação, que já poderia ser utilizado a partir do próximo pleito.
Resultado no ano que vem
Também ouvido pela Fórum, o advogado especialista em Direito Eleitoral, Francisco Emerenciano, acredita que há a possibilidade da discussão no TSE sobre o tema se arrastar até 2022.
O presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, marcou para quinta-feira (28) a continuidade do julgamento os votos dos 4 ministros restantes sejam proferidos.
"Tendo em vista a complexidade dos casos e a importância dos mandatos em discussão, muito provavelmente, os julgamentos não serão concluídos nesta sessão, sendo certo que eventual pedido de vista por um do ministros poderá levar o julgamento para o próximo ano", avalia Emerenciano.
"Particularmente, não acredito na possibilidade de cassação da chapa Bolsonaro/Mourão, no último ano de mandato (ano em que se realizará nova eleição), sobretudo se levado em consideração a responsabilidade institucional do TSE ao julgar processos envolvendo o presidente e vice-presidente da República", completa o especialista.
Já o advogado Cláudio Lima Filho, também especializado no tema, considera que "por mais que os disparos tenham acontecido, é preciso demonstrar claramente quem foi o responsável pela propagação das notícias falsas, além de comprovar que, por conta desses disparos, a disputa eleitoral ficou desequilibrada".
"Dessa forma, diante da dificuldade de se comprovar essas alegações, a cassação não tem grandes chances de êxito", atesta.