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Em entrevista à Fórum, o fotógrafo Sérgio Silva, que perdeu a visão de um olho por conta de uma bala de borracha disparada pela PM, falou sobre a sentença do juiz que o culpou pelo episódio, o apoio nas redes com a hashtag #culpadoporfotografar e sobre os precedentes que a decisão pode gerar para futuras coberturas de situações de violência e conflito
Por Matheus Moreira
O fotógrafo Serginho (Sérgio Andrade da Silva) perdeu a visão do olho esquerdo em junho de 2013 ao ser alvejado por um tiro de bala de borracha durante ação da Polícia Militar de São Paulo em uma manifestação. Em ação contra o Estado, Sérgio pediu indenização e pensão para cuidados médicos, mas foi condenado pelo juiz como único autor responsável pela perda da sua visão sob justificativa de ter entrado na “linha de tiro” da polícia e assumido para si o risco de se ferir.
Desde o fatídico episódio, em 2013, que Serginho recebe apoio de colegas jornalistas e ativistas e encampa campanhas contra a violência da PM.
Em entrevista à Fórum, o fotógrafo falou sobre a decisão do juiz, as campanhas de solidariedade, a violência policial e os riscos que profissionais da imprensa passam a correr com esse tipo de sentença.
Confira.
Fórum - Você já esperava essa decisão da Justiça?
Sérgio Silva - Eu recebo com muita indignação e muita tristeza. Por que eu sou a vítima na história e o juiz, através dessa decisão, promove a falácia, promove a inversão dos valores dessa questão. Mas, ao mesmo tempo, pensando como funciona o nosso processo judiciário no Brasil, já era uma decisão esperada, até porque o juiz que analisa o processo é um funcionário do Estado. Então, ele jamais vai tomar uma decisão contra o seu patrão.
Além disso, não é a primeira vez que isso acontece. Em 2014, um desembargador, Vicente Abreu, tomou a mesma decisão em um caso igual ao meu, o do fotografo Alex Silveira, que também perdeu a visão de um olho, em 2000, pela mesma violência, da mesma Polícia Militar, do mesmo estado. Esse desembargador também conduziu Alex como culpado na história. Então o que o juiz do meu processo está fazendo é seguindo uma lógica de defesa da qual o Estado se apoderou para se beneficiar.
Fórum - Você diria que sua condenação foi feita com base em precedente aberto por Abreu em 2014?
Sérgio Silva - Exatamente. Na nota do Conjur o juiz deixa muito claro que há jurisprudência. Dentro da burocracia judicial que existe no Brasil, ele age de forma que para muitos juristas está certo. Se você pensar em uma questão moral, física, de direitos, ele está infringindo um direito e cometendo um ato de violência.
Fórum - Quais os próximos passos? Sua defesa recorrerá da decisão?
Sérgio Silva - Esse é um sistema pré-moldado. O juiz toma uma decisão dessa e então o meu advogado entra com recurso. Vou passar mais bons anos da minha vida esperando que o meu recurso seja analisado e então uma nova decisão de um outro juiz. É assim que funciona o sistema judiciário, ele não muda.
Fórum - Criaram uma hashtag sobre o seu caso nas redes sociais. Como está sendo esse apoio?
Sérgio Silva - As pessoas entendem e sabem que uma grande violação de um direito está acontecendo. O apoio vai acontecendo naturalmente. Mas também há comentários sobre notas dos grandes veículos de comunicação. Eu não tive coragem de ler. São comentários de pessoas que não têm nenhum sentimento humano quanto a essa decisão e acham que o juiz está certo nessa condenação. Então, além do apoio, tem esse pensamento contrário com o qual a gente precisa lidar.
Fórum - Que outros precedentes ou impactos essa decisão pode ter para fotojornalistas e jornalistas que cobrem conflitos e manifestações?
Sérgio Silva - Ele cria uma situação na qual a Polícia Militar agora possa atirar em qualquer profissional da imprensa. Isso é tirar o direito do profissional de imprensa de atuar em uma situação de conflito. Eles estão exatamente querendo tirar as câmeras, tirar os microfones, tirar tudo isso das coberturas de situação em que há ação ofensiva da polícia para que as pessoas fiquem com medo e com receio de exercer o seu trabalho.
Foto: Sérgio Andrade da Silva/Reprodução Facebook