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Diogo Sant’Ana, secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência da República, Fernanda Machiaveli e Silas Cardoso, assessores na Secretaria-Geral da Presidência da República, escreveram o artigo que segue explicando o decreto 8.243 de 2014, que instituiu a Política Nacional de Participação Social – PNPS. O movimento contrário à sua aplicação é uma clara tentativa de fazer com que o Estado brasileiro seja apenas um instrumento de interesses privados.
Mais participação, mais cidadania, mais democracia
Dia 23 de maio, a Presidenta Dilma Rousseff assinou o decreto 8.243 de 2014, que instituiu a Política Nacional de Participação Social - PNPS, definindo diretrizes para cada uma das instâncias e mecanismos de participação social existentes no Governo Federal. A assinatura aconteceu durante a Arena da Participação Social, encontro que reuniu mais de 2 mil pessoas para discutir agendas prioritárias para as organizações da sociedade civil. A Política Nacional de Participação Social foi construída por meio de amplo processo participativo, tendo a minuta do Decreto sido submetida à consulta pública virtual no portal da Secretaria-Geral da Presidência da República, quando recebeu mais de 700 contribuições da sociedade civil. A Política tem como principal objetivo promover a adoção de mecanismos de participação social nas políticas e programas do governo federal. Em outras palavras, consolidar a participação social como método de governo. Além de disciplinar o funcionamento de conselhos, conferências, mesas de diálogo, fórum interconselhos, a PNPS prevê ambientes virtuais de participação social que permitirão aos cidadãos e cidadãs contribuírem por meio da internet nos processos de formulação de atos normativos. Juntos, conselhos, comissões, conferências, e ouvidorias constituirão o Sistema Nacional de Participação Social, que articulará os diversos canais de participação existentes no governo. Trata-se de um passo fundamental para aperfeiçoar as relações entre Estado e Sociedade Civil e conferir maior transparência e abertura às decisões do governo. É importante ressaltar que este passo resulta de processo acumulativo de experiências participativas das três esferas de governo que ganhou força a partir da Constituição de 1988. A própria Constituição é fruto da ascensão de mobilizações populares decisivas para restabelecer as liberdades democráticas e consagrar uma série de direitos sociais, inclusive a participação popular nas decisões do governo. A Constituição anuncia logo em seu Artigo 1º, parágrafo único, que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”. Prevê a utilização de plebiscitos e referendos, bem como a iniciativa popular no processo legislativo (art. 14). Além disso, a Carta Magna define a participação social como diretriz do Sistema Único de Saúde (Art 198, III), da Assistência Social (Art. 204, II), ana Seguridade Social (Art. 194, parágrafo único, VII) e, mais recentemente, do Sistema Nacional de Cultura (Art 216, § 1º, X). Assegura também em seu Artigo 10º “a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação”. E estabeleceu conselhos como instâncias de participação social nas políticas de saúde, cultura e na gestão do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza (Art. 79, parágrafo único). Ou seja, além de prever a participação por meio do voto direto em eleições periódicas para escolha dos representantes nos poderes Executivo e Legislativo, a Constituição previu a participação direta dos cidadãos nas políticas públicas setoriais, organizadas pelo Poder Executivo. E na medida em que foram sendo garantidos os direitos previstos na Constituição, as instâncias de participação social se multiplicaram e se fortaleceram. Só para se ter uma ideia do ritmo deste avanço, atualmente há na Administração Pública Federal 40 conselhos de políticas públicas com ampla participação social, 19 criados nos últimos 12 anos. Da mesma fora, já chegamos a 138 conferências nacionais realizadas, das quais 97 ocorreram nos últimos 12 anos, tratando de mais de 40 temas setoriais e envolvendo mais de 7 milhões de pessoas[1]. E há hoje mais de 270 ouvidorias públicas nos diversos órgãos do governo federal que recebem denúncias, sugestões e reclamações do cidadão. A participação social também está inserida no planejamento estratégico da administração pública federal desde o Plano Plurianual (PPA) de 2004-2007. Na ocasião, foram realizadas consultas e entidades representativas da sociedade civil para a elaboração do plano, o que se repetiu nos PPAs posteriores (2008-2011 e 2012-2015). No último PPA, foram apresentadas 629 contribuições da sociedade civil, das quais 77% foram incorporadas integralmente. Como inovação, foi constituída uma instância de monitoramento do Plano Plurianual pela sociedade civil, o Fórum Interconselhos, que reúne periodicamente representantes dos diversos conselhos para avaliar o cumprimento dos objetivos e metas estabelecidas. Segundo pesquisa do IPEA[2], houve um crescimento notável do número de “interfaces socioestatais” nos programas do governo federal na última década, chegando a quase 90% dos programas com pelo menos uma forma de interface entre Estado e sociedade. Como interface socioestatal entende-se ouvidorias, mesas de diálogo, audiências públicas, consultas públicas, conselhos, conferências e plataformas virtuais. Todas estas instâncias permitem que o cidadão, suas organizações, incluindo as representações de trabalhadores e de empregadores, movimentos sociais e academia incidam na formulação, acompanhamento e controle das ações governamentais. Ao abrir o Estado para a participação de todas as partes interessadas em cada setor, evita-se que somente aqueles que possuem canais privilegiados de acesso incidam sobre os tomadores de decisão. Mesmo assim, as manifestações de junho mostraram que a população brasileira, em especial a juventude, deseja participar e contribuir com os rumos do país de forma mais intensa e frequente. Ela quer influenciar diretamente nos rumos do País, ver suas demandas traduzidas em ações dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Nesse sentido, é necessário, cada vez mais, ampliar os espaços institucionais de participação social nos três poderes, intensificar o diálogo com a sociedade civil e fomentar as iniciativas de interesse público. A Política Nacional de Participação Social vem nessa direção, ampliando os canais institucionais de participação social no Poder Executivo. No século XXI, é fundamental que a participação social incorpore a linguagem e as formas da internet e das redes sociais para conseguir chegar mais perto dos cidadãos que não estão formalmente organizados. Experiência exitosa nesta seara foi a processo vivenciado com o Marco Civil da Internet, que, a partir de uma consulta pública virtual, deu ensejo a uma ampla mobilização social culminando numa das mais avançadas legislações sobre internet do mundo, que resguarda a privacidade e a liberdade de expressão dos usuários, bem como a neutralidade no tráfego de dados na rede. Para viabilizar processos colaborativos como esse, foi lançado também o portal Participa.br, que permitirá que todos contribuam por meio das comunidades temáticas e trilhas de participação. Estamos falando de um processo de aprofundamento democrático, que aproxima cada vez mais representantes e representados, responsabiliza as burocracias governamentais, fortalece o controle da sociedade sobre as políticas públicas e, assim, garante maior transparência e melhores resultados na ação governamental. Ao longo dos 25 anos da Constituição, a participação popular vem contribuindo para ampliar o conceito de cidadania, para tornar as políticas públicas mais próximas dos anseios da população e, como consequência, aprofundar a democracia brasileira. A Política Nacional de Participação Social, assim, tem o mérito inegável de recolocar o tema na agenda pública, debatendo o modelo de Estado e de democracia que o país deseja construir. É necessário que governo e sociedade estejam atentos à sua implementação, acompanhando de perto os seus resultados, identificando os limites e possibilidades para aperfeiçoá-la cada vez mais. Os desafios ainda são muitos e o caminho a percorrer é longo. Temos a clareza de que devemos seguir em um sentido: cada vez mais diálogo, mais participação, mais transparência, pois é assim que alcançaremos mais desenvolvimento, mais cidadania e mais democracia. Diogo Sant’Ana é doutor em direito económico pela Universidade de São Paulo. É Secretário-Executivo da Secretaria-Geral da Presidência da República. Fernanda Machiaveli é mestre em ciência política pela Universidade de São Paulo. Pertence à carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental e trabalha na Secretaria-Geral da Presidência da República. Silas Cardoso é advogado, mestrando em direito económico pela Universidade de São Paulo. Trabalha na Secretaria-Geral da Presidência da República.
[1]http://www.secretariageral.gov.br/art_social/conselhos-e-conferencias
[2]Participação social como método de governo:um mapeamento das “interfaces socioestatais” nos programas federais. Comunicado do Ipea 132, de 25/01/12 Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=12979
Foto capa: Antonio Cruz/Agência Brasil