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Militante destaca a politização do "rolezinho" e afirma que "Brasil vive, sim, um apartheid"
Por Igor Carvalho
[caption id="attachment_40036" align="alignleft" width="300"] Manifestantes se reúnem na frente do JK Iguatemi para protestar contra racismo (Foto: Divulgação)[/caption]
Joselicio Júnior, conhecido como Juninho, do Circulo Palmarino, um dos organizadores da manifestação que obrigou o JK Iguatemi a baixar as portas no último sábado (18), divulgou uma carta em que fala sobre a politização do "rolezinho".
No documento, Juninho afirma que o JK Iguatemi reforçou o racismo durante a manifestação. "A reação do empreendimento, fechando as portas minutos antes da nossa chegada, legitimou e reforçou o nosso discurso de que o Brasil vive, sim, um apartheid."
Confira, na íntegra, a carta:
Por Joselicio Júnior
Nós, militantes do movimento negro, cotidianamente falamos da existência do racismo e do quanto ele estrutura todas as relações na sociedade brasileira - sejam elas econômicas, sociais ou culturais - e muitas vezes somos acusados de extremistas, de praticar o racismo ao contrário, quando não nos dizem que tudo isso não passa de uma grande bobagem.
Nesse sentido, o debate que está colocado na sociedade a partir do fenômeno dos rolezinhos é bastante pedagógico, pois escancara o que é a segregação na sociedade brasileira e como ela é determinante para definir os espaços que negros, pobres e periféricos podem frequentar ou de que forma podem frequentar.
Nas primeiras declarações dos jovens organizadores dos rolezinhos, o discurso presente era o de que eles queriam apenas se divertir, encontrar os amigos, conhecer pessoas, namorar, mas a reação violenta de repressão da segurança privada e da polícia - simplesmente por considerar a presença desses jovens indesejada - provocou uma reflexão: No último final de semana, declarações dos adolescentes que encabeçaram os encontros reivindicavam o direito de ir e vir e, então, o que antes era apenas um encontro, agora é manifestação; Denúncia sobre a falta de espaços de lazer na periferia.
Sem a pretensão de instrumentalizar os rolezinhos - mas com o objetivo de provocar um amplo debate na sociedade - nós, do movimento negro, movimentos sociais e ativistas, chamamos o "Rolê Contra o Racismo", que reuniu cerca de 300 pessoas no último sábado, dia 18 de janeiro, nas imediações do Shopping JK Iguatemi, localizado no Itaim Bibi -SP. A reação do empreendimento, fechando as portas minutos antes da nossa chegada, legitimou e reforçou o nosso discurso de que o Brasil vive, sim, um apartheid.
Se alguém ainda tem dúvida sobre o pensamento dos ricos do nosso país, basta ver as declarações de representantes dos Shoppings, a exemplo de Nabil Sahyoun, presidente da Alshop (Associação Brasileira de Lojistas de Shoppings), que defende que "os jovens organizadores e participantes dos rolezinhos devem procurar o sambódromo", uma vez que, na opinião dele, "os shoppings não foram feitos para essa mobilização".
Ao mesmo tempo, o mesmo presidente afirma que os "shoppings foram construídos na periferia para incluir população, e que a preocupação com rolezinhos é pela segurança dos demais frequentadores". Ou seja, é criado o estimulo ao consumo, mas como não é possível garantir que todos tenham acesso, são criados mecanismos para dispersar, repelir e segregar.
Além disso, o poder econômico conta com o apoio do Estado para garantir o direito de quem pode ou não consumir, seja através dos aparatos repressores, como a Policia, seja por meio de normativas jurídicas, como as liminares concedidas pelo Judiciário que impedem os rolezinhos de forma extremamente arbitrária.
Trata-se de um cenário que escancara a luta de classes em nosso país e demonstra os limites da tentativa de conciliação e acomodação entre ricos e pobres. Nesse sentido, estamos cumprindo o nosso papel histórico de provocar a reflexão e aguçar as contradições, mantendo acessa a chama daqueles que resistiram contra a escravidão em busca de liberdade. Não temos dúvidas de que mudanças só virão com a organização e mobilização dos de baixo. Parafraseando o poeta José Carlos Limeira, “por menos que conte a História/ Não te esqueço meu povo/ Se Palmares não vive mais / Faremos Palmares de novo”.