Por que a PUC-SP está parada

Dado o histórico recente de intervenção do Vaticano na PUC peruana, o evento ocorrido em São Paulo parece estar no mesmo contexto de avanço conservador da Igreja sobre suas instituições de ensino pelo mundo

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Dado o histórico recente de intervenção do Vaticano na PUC peruana, o evento ocorrido em São Paulo parece estar no mesmo contexto de avanço conservador da Igreja sobre suas instituições de ensino pelo mundo Por Hugo Albuquerque, no Outras Palavras No dia 13 de Novembro, o Cardeal Arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Scherer, nomeou como reitora da PUC-SP a professora Anna Cintra, última colocada no pleito direto realizado, entre a comunidade universitária, em agosto deste ano. A cúpula católica preteriu o reitor reeleito, Dirceu de Mello. A decisão foi recebida com comoção e revolta pela comunidade acadêmica, resultando na ocupação simbólica da reitoria, greve geral estudantil e outras medidas insurgentes. Trata-se de fato inédito na história daquela universidade, que se destacou por adotar, ainda no período da ditadura militar, práticas democráticas. Embora o nome do vencedor do pleito passasse pela posterior ratificação da Igreja, em regime de lista tríplice, ele nunca deixou de ser aprovado, o que transformou tal prática em norma costumeira, uma vez que foi reconhecida por toda a comunidade acadêmica. Para agravar a situação, a professora Anna Cintra ainda assinou um termo de compromisso durante um debate entre candidatos à reitoria no qual se comprometia, caso não fosse a candidata mais votada, a não aceitar eventual indicação para o cargo de reitora  (conforme consta neste vídeo) — promessa que foi, de pronto, descumprida. Candidata simpática à Igreja Católica e à doutrina conservadora hoje dominante no Vaticano, Anna Cinta já era apontada como a preferida da Arquidiocese. Ela atuou recentemente na função administrativa de renegociação de contratos de professores na Fundação São Paulo (Fundasp) — mantenedora da PUC-SP e braço da Igreja naquela universidade. Anna foi derrotada no pleito de agosto pela rejeição ao seu nome entre estudantes e funcionários que, junto aos professores, votam diretamente para reitor. Uma das causas que ajudam a explicar sua derrota foi a rejeição por parte dos estudantes de suas posições conservadoras quanto às liberdades na universidade — sobretudo a liberdade de cátedra, isto é, a liberdade de poder ensinar e aprender livremente –, enquanto os funcionários temem por mais arrochos. Logo após o anúncio da nomeação, na noite do dia 13, milhares de estudantes, reunidos em assembleia, decidiram ocupar simbolicamente a reitoria, fazer um cadeiraço e mobilizar uma greve. Em nova assembleia realizada dia 14 pela manhã, deliberou-se pela desocupação estratégica da reitoria e a entrega simbólica ao reitor reeleito, aclamado ao discursar. Reivindicou-se uma audiência pública com os representantes da Fundasp e o próprio Dom Odilo. Manteve-se a greve estudantil. Este movimento, aliás, já foi acompanhado, institucionalmente, pelo departamento de Jornalismo. Também encontrou solidariedade junto à Faculdade de Direito no próprio dia 14. Na manhã do dia 21, o Conselho da Faculdade de Direito reuniu-se em sessão extraordinária, decidindo, conforme este documento, pela orientação para os professores entrarem em greve e pela garantia institucional aos estudantes em greve, embora não tenha sido conclusivo quanto a uma decisão firme de paralisação. Além disso, em decisão amplamente majoritária, os chefes de departamento do Direito criticam a licitude da medida de indicação. Consideraram que o desrespeito de Anna Cintra ao termo de compromisso que firmou fere o princípio estatutário da moralidade. É um aceno para a entrada com alguma medida judicial contra a nomeação. Já no dia 14, diversos cursos haviam realizado assembleias, ratificando a contrariedade à indicação e optando greve geral. Além do campus Perdizes, a onda de protestos chegou ao campus da rua Marques de Paranaguá, que reúne os cursos de ciência exatas. O objetivo é construir a audiência pública com Anna Cintra, o atual reitor e representantes da Fundasp. Vários setores atuantes no movimento estudantil, setores organizados dos professores e funcionários estão atuando de maneira unitária e coordenada. Levando em consideração o histórico recente de intervenção do Vaticano na tradicionalíssima PUC peruana, o evento ocorrido em São Paulo parece estar no mesmo contexto de avanço conservador da Igreja sobre suas instituições de ensino pelo mundo. É preciso lembrar que tanto a PUC de São Paulo quanto a de Lima foram, ao seu tempo, grandes basitões da Teologia da Libertação, movimento libertário nascido no seio da própria Igreja e hoje duramente combatido pelo atual grupo hegemônico. Em outras palavras, a luta na PUC paulista não começou, e possivelmente não terminará, em seu interior, além de estar longe de se encaminhar para uma solução.