Nos Estados Unidos de Donald Trump, cada vez mais agentes de imigração federais têm usado máscaras e balaclavas para ocultar suas identidades. Essa moda não é nova e tem sido historicamente associada a regimes autoritários e movimentos de extrema direita.
No atual regime trumpista, essas peças viraram “tendência” entre os funcionários do Serviço de Imigração e Controle de Alfândega (ICE, na sigla em inglês) durante operações de imigração.
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Embora esse fenômeno tenha ganhado visibilidade neste segundo governo Trump, ele não é novo e remonta a práticas históricas cujos símbolos, como o anonimato, reforçam o controle, a opressão e a violação de direitos.
Desde o final do século XIX, grupos supremacistas brancos, como a Ku Klux Klan, ficaram notórios pelo uso de capuzes brancos e máscaras. Essa prática, adotada como uma forma de ocultar identidades e intimidar opositores, também foi replicada por grupos neonazistas nas últimas décadas. Ao esconderem seus rostos, esses indivíduos agem sem o risco de represálias ou punições, já que o anonimato simboliza não apenas a proteção contra a exposição, mas também contra consequências legais e sociais.
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No Brasil, durante a Ditadura Militar (1964-1985), agentes do regime operavam frequentemente à paisana, ocultando suas identidades para prender opositores políticos sem serem identificados. Essa estratégia de anonimato foi uma tática comum de regimes autoritários, que buscam evitar a responsabilização pelos abusos cometidos e impedir que as vítimas identificassem os responsáveis pela repressão.
Em diversos países latino-americanos, como o México e o Brasil, milícias e grupos de segurança privada de extrema direita frequentemente se utilizam de balaclavas e roupas militares para esconder suas identidades durante ações intimidatórias contra civis, grupos minoritários e opositores políticos. Esses grupos, muitas vezes vinculados ao crime organizado ou a interesses conservadores, recorrem ao anonimato como uma forma de praticar a violência sem medo de serem identificados ou responsabilizados.
Na Europa, movimentos como o Identitarismo (ideologia nacionalista e xenofóbica) também fazem uso de máscaras e acessórios para ocultar suas identidades, especialmente durante confrontos com grupos antifascistas e antirracistas. O anonimato proporciona segurança para os membros desses movimentos, permitindo-lhes se envolver em atividades sem o risco de perseguições legais ou sociais, enquanto evitam o escrutínio público.
Em países como Ucrânia, Hungria e Rússia, grupos paramilitares de extrema direita, como o Azov Battalion na Ucrânia, utilizam balaclavas e uniformes militares não identificáveis em protestos e confrontos com opositores políticos, sendo o anonimato uma tática de intimidação e controle.
No regime de Adolf Hitler, as forças da Gestapo (polícia secreta nazista) operavam frequentemente à paisana, infiltrando-se em grupos de oposição e mantendo suas identidades escondidas. Embora os agentes da Gestapo não usassem máscaras ou balaclavas, o anonimato era uma estratégia crucial para evitar represálias e criar uma atmosfera de medo entre as vítimas.
O uso de máscaras também é comum em movimentos de esquerda, como o antifascismo, mas a intenção por trás dessa prática é diferente. Nos protestos antifascistas, as máscaras são usadas como proteção contra perseguições políticas, já que os manifestantes enfrentam o risco de represálias. Porém, essa prática também é alvo de críticas, pois pode ser usada para justificar ações violentas sem identificação adequada, levantando questões sobre a legitimidade desses atos.
Trump e a popularização das máscaras no ICE
Durante esta segunda administração Trump, o uso de máscaras e balaclavas por agentes do ICE se tornou uma prática polêmica, especialmente em operações de imigração. A controvérsia tem gerado críticas em relação à transparência e responsabilidade.
Essa "tendência" reflete um movimento maior nas políticas de segurança do país, que, desde os atentados de 11 de setembro de 2001, passaram a se caracterizar pelo aumento da vigilância em massa e pela criação de centros de fusão entre agências governamentais e empresas privadas para troca de informações. Esses centros operam com pouca supervisão, o que amplia a falta de transparência e dificulta o monitoramento das operações de segurança.
Consequências e críticas ao uso de máscaras pelo ICE
Especialistas em direitos civis e segurança pública alertam para os riscos dessa prática, que pode prejudicar a credibilidade e legitimidade das instituições governamentais. Mike German, ex-agente do FBI, afirmou ao The Guardian que o uso de máscaras é um sintoma da erosão da democracia, já que o anonimato dos agentes dificulta a identificação e a responsabilização por abusos cometidos. Além disso, ele aponta que o anonimato facilita o trabalho de impostores, que podem se passar por agentes legítimos e atuar de maneira ilegal.
O senador democrata por Michigan Gary Peters, em uma audiência nesta quarta-feira (25) no Congresso dos Estados Unidos, expressou preocupação com o risco de confusão entre agentes reais e impostores, o que poderia gerar resistência e até violência por parte do público. Esse desconhecimento sobre a identidade dos agentes pode resultar em reações agressivas de civis que se sentem ameaçados por figuras não identificadas, colocando em risco a segurança tanto dos agentes quanto dos detidos.
A procuradora-geral Pam Bondi, que também estava presente na audiência, respondeu às preocupações de Peters alegando que, embora não soubesse de casos específicos de agentes mascarados, entendia que os agentes poderiam estar usando máscaras como uma medida de autoproteção, devido às ameaças e ataques direcionados a eles. Ela afirmou que os agentes do ICE estão tendo identidades e dados pessoais expostos e têm suas famílias ameaçadas. No entanto, a sua resposta foi recebida com ceticismo por Peters, que destacou que a falta de identificação poderia ser mais prejudicial, aumentando a confusão e o risco de confrontos.
Em resposta a essas preocupações, estados como a Califórnia começaram a propor projetos de lei para proibir o uso de máscaras por agentes de segurança em serviço, argumentando que os servidores públicos devem se identificar claramente para garantir a legitimidade de suas ações. A administração Trump, no entanto, justifica o uso de máscaras como uma medida de autoproteção para os agentes, alegando que eles têm sido ameaçados e expostos.
Símbolos de autoritarismo e medo
Mais do que um simples acessório de vestuário, as máscaras utilizadas pelos agentes de imigração durante a administração Trump se tornaram um símbolo marcante de um regime autoritário.
O uso dessas peças, especialmente em operações de imigração, vai além da questão estética, representando uma tendência histórica que remonta a regimes autoritários e movimentos de extrema direita, que recorrem ao anonimato como ferramenta de controle, repressão e opressão.
Em um cenário onde a transparência e a responsabilização são colocadas em xeque, o uso de máscaras se consolida como uma prática que reflete a erosão dos princípios democráticos daquele país que se autointitula "a maior democracia do mundo".