A gigante do ultra fast fashion Shein gerou mais emissões que aquecem o planeta do que qualquer uma das maiores empresas de moda pela primeira vez. Os dados foram divulgados pela própria companhia em seu Relatório de Sustentabilidade e Impacto Social 2023.
A pegada de carbono da empresa quase triplicou nos últimos três anos, um aumento que superou até mesmo a impressionante taxa de crescimento das vendas da Shein. No ano passado as emissões de CO2 da empresas foram de 16,7 milhões de toneladas de dióxido de carbono, grande o suficiente para rivalizar com alguns países:
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- Uruguai, com população de cerca de 3,55 milhões de habitantes, teve emissões de aproximadamente 8,37 milhões de toneladas de CO2 em 2023. As emissões da Shein são quase o dobro das emissões anuais do país sul-americano.
- Bolívia, com população de aproximadamente 12,2 milhões de habitantes, teve emissões de aproximadamente 19,4 milhões de toneladas de CO2. As emissões da Shein representam cerca de 86% das emissões totais deste país.
- Islândia, com população de cerca de 376 mil habitantes, teve emissões em torno de 5,7 milhões de toneladas de CO2 em 2023. As emissões da Shein são mais de três vezes maiores do que as do país.
- Letônia, com cerca de 1,85 milhão de habitantes, teve emissões de aproximadamente 7,3 milhões de toneladas de CO2. As emissões da Shein são mais do que o dobro das do país.
Esses dados reforçam a relevância das emissões da Shein no contexto global, mostrando que suas emissões superam as de países inteiros, com populações e economias consideráveis. Isso reforça a relevância de discutir as práticas ambientais da empresa e sua responsabilidade no cenário internacional.
Líder de emissões de carbono
A Shein se destaca por seu modelo de negócios totalmente online, o que facilita sua expansão em vários países, focando especialmente em consumidores jovens, como a Geração Z, através de estratégias de marketing nas redes sociais, como TikTok e Instagram.
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Com presença global significativa, operando em mais de 150 países, tem como principal mercado os Estados Unidos, onde, em 2023, representou aproximadamente 40% das vendas globais da Shein.
O Brasil está entre os cinco principais mercado da Shein, com participação em torno de 10% e 15% das vendas. A França aparece em terceiro, com cerca de 5% a 10%; seguida da Espanha, entre 5% e 8%; e Canadá, 5%
Esses números são estimados com base nas vendas totais e na importância desses países para o crescimento e sucesso da Shein no mercado global de moda rápida.
Em 2023, a pegada de carbono da Shein ultrapassou a da Inditex, proprietária da Zara, anteriormente o maior emissor entre os grandes nomes da moda. Era aproximadamente o dobro daquelas da Nike, do Grupo H&M e da LVMH.
Certamente, tais comparações são imperfeitas. As empresas calculam suas emissões de maneiras diferentes e divulgam quantidades variadas de informações.
Metas para uma moda mais sustentável
No recente relatório de sustentabilidade e impacto social, a Shein apresenta metas e dados.
- Pegada de Carbono: A Shein se comprometeu a reduzir suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 25% até 2030 e alcançar emissões líquidas zero até 2050, alinhando-se com o Science Based Targets initiative (SBTi). Em 2023, suas iniciativas de eficiência energética em 28 instalações de fornecedores reduziram cerca de 46 mil toneladas métricas de emissões.
- Materiais Responsáveis: Cerca de 11% do portfólio de fibras da Shein para produtos com sua marca consistia em poliéster reciclado e viscose segura para florestas. Além disso, 16,2% das embalagens continham pelo menos 50% de materiais reciclados certificados.
- Iniciativas de Economia Circular: A Shein também investiu em práticas de economia circular, como a recuperação de 20 mil metros de tecidos estocados em parceria com Queen of Raw e a reutilização de mais de 101 mil kg de poliéster reciclado em produtos de vestuário.
- Energia Renovável: A empresa instalou mais de 51,6 MW de capacidade solar em 41 instalações de fornecedores e 43,6 MW em sete armazéns próprios.
O que diz o CEO da Shein
No relatório, o CEO da Shein, Sky Xu, destacou o compromisso da empresa em mitigar o impacto ambiental e promover mudanças sociais positivas. Ele afirmou que o modelo de negócios sob demanda da companhia, baseado em tecnologia, ajuda a reduzir o desperdício de inventário, permitindo à empresa oferecer preços acessíveis aos consumidores e, ao mesmo tempo, diminuir o impacto ambiental.
Ele também mencionou a importância da governança da cadeia de suprimentos e a gestão da pegada de carbono, especialmente nas emissões de Escopo 3.
As emissões de Escopo 3 são todas as emissões indiretas de gases de efeito estufa (GEE) que ocorrem ao longo da cadeia de valor de uma empresa, mas que não são diretamente controladas por ela. Essas emissões estão relacionadas às atividades que ocorrem fora das operações diretas da organização, tanto upstream (antes do produto chegar à empresa) quanto downstream (depois que o produto é vendido).
Xu reiterou que a empresa está apenas no início da sua jornada de sustentabilidade e que continuará a investir em inovações e melhorias contínuas para alcançar suas metas ambientais e sociais.
"Na SHEIN, nossa missão é tornar a beleza da moda acessível para todos. No entanto, reconhecemos que produzir roupas acessíveis e entregá-las rapidamente aos nossos clientes em todo o mundo apresenta desafios significativos que nós, junto com o restante da indústria, precisamos enfrentar. Estou orgulhoso dos esforços da nossa equipe até o momento para mitigar nosso impacto ambiental e promover mudanças sociais positivas, mas reconhecemos que ainda estamos no início dessa jornada e temos muito a melhorar", escreveu Xu.
Confira os gráficos
Consumo x produção
Uma das controvérsias dessas métricas para calcular as emissões de carbono é que, para além da empresa, penaliza os países de origem delas. Não aborda absolutamente nenhum aspecto da divisão internacional do trabalho. O cálculo é feito na produção e não no consumo.
A régua usada para calcular a pegada de carbono é a de emissões baseadas na produção, o Production-Based Accounting (PBA), que não considera a contribuição implícita das atividades econômicas - especialmente do comércio internacional - para as emissões de carbono.
O PBA é um método de contabilização das emissões de carbono que foca nas emissões geradas durante a produção de bens e serviços dentro de uma determinada área geográfica, tipicamente um país ou região. Este método mede as emissões no local onde a produção ocorre, independentemente de onde os bens e serviços são consumidos.
Uma alternativa é medir as emissões de CO2 pelo consumo (Consumption-Based Accounting - CBA). Esse método considera as emissões geradas pela produção de bens e serviços consumidos em uma região, independentemente de onde são produzidos. É usado para avaliar a pegada de carbono de um país ou região, considerando o consumo em vez da produção.
E qual a diferença? Para os não-membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que são principalmente países em desenvolvimento, do chamado Sul Global, a diferença entre as emissões CBA e PBA aumentou gradualmente de 1,47 Gt em 1990 para 4,17 Gt em 2019.
Gt é a sigla para gigatonelada, unidade de medida utilizada para contabilizar grandes quantidades de emissões de carbono, especialmente no contexto das emissões de gases de efeito estufa (GEE).
As emissões CBA dos 38 membros da OCDE, países ricos do Norte Global, foram continuamente mais altas do que as emissões PBA, com a diferença entre as duas aumentando gradualmente de 1,24 Gt em 1990 para 3,64 Gt em 2006 e depois diminuindo para 1,42 Gt em 2019.
Ainda assim, o significativo impacto ambiental da Shein é uma das várias controvérsias que têm atrapalhado suas ambições de abrir capital. Abordar as emissões é "particularmente crítico", disse o CEO Sky Xu no mais recente relatório de sustentabilidade da Shein, publicado no dia 22 de agosto.
Os esforços da empresa até agora incluem movimentos para apoiar fornecedores na melhoria da eficiência de fabricação e deslocar parte da produção para mais perto dos mercados consumidores chave.
Em julho, lançou um fundo de circularidade de 200 milhões de euros (222 milhões de dólares) focado na promoção da reciclagem de têxteis para têxteis.
Também está em processo de validação de sua meta de reduzir as emissões em 25% até 2030 com a Iniciativa de Metas Baseadas na Ciência, o principal árbitro global de metas climáticas corporativas. No entanto, as economias até o momento foram ofuscadas pelo crescimento acelerado da empresa.
A pegada de carbono da indústria da moda
Em 2023, a indústria global da moda foi responsável por cerca de 2,1 bilhões de toneladas métricas de emissões de gases de efeito estufa (GEE), representando aproximadamente 4% do total global de emissões. Esse valor é comparável às emissões combinadas de países como França, Alemanha e Reino Unido.
A indústria da moda é considerada uma das mais intensivas em carbono, principalmente devido às atividades de produção de matérias-primas, fabricação de roupas e transporte. Projeções indicam que, sem ações significativas de mitigação, essas emissões podem aumentar para 2,7 bilhões de toneladas até 2030.
Para alcançar as metas climáticas, a indústria precisará reduzir suas emissões para cerca de 1,1 bilhão de toneladas até 2030, o que exigirá medidas drásticas em eficiência energética, uso de materiais reciclados e mudanças no comportamento dos consumidores.
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