Em Belém para uma série de eventos na UFPA (Universidade Federal do Pará), a ex-ministra da Justiça da França Christiane Taubira realizou nesta segunda-feira (24/3) uma conferência contrapondo os mitos e a realidade sobre a Amazônia. “Estou aqui como amazônida, como sua vizinha”, afirmou Taubira, que nasceu em Caiena, na Guiana Francesa. Após a palestra, ela conversou com exclusividade com a Revista Fórum sobre as expectativas para a COP 30, a ser realizada em novembro na capital paraense.
“Eu gostaria que a COP 30 fosse uma ruptura, que houvesse um antes e um depois do evento. Antes da COP 30, há um imaginário multilateral sobre a Amazônia, que consiste em pensar que é uma grande floresta ameaçada. E as declarações que foram realizadas sobre a Amazônia seguem essa lógica. O que eu espero ver mudar na COP 30 é que a gente compreenda que a Amazônia é um lugar de vida, que as atividades econômicas predatórias a fragilizam”, afirmou.
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Para ela, devemos aprender com as comunidades tradicionais da região. “As pessoas que vivem na Amazônia há milhares ou centenas de anos, como os indígenas, os quilombolas e as comunidades e populações mestiças e crioulas, desenvolveram, primeiramente, um conhecimento sobre a Amazônia. E, depois, uma relação que permite viver nesse ecossistema sem destruí-lo. Porque essa é, simplesmente, a condição do futuro. Elas mesmas estão inquietas com a destruição e com a economia extrativista e produtivista, a economia voraz. Então eu peço que escutemos e que admitamos que os povos e as comunidades que vivem na Amazônia sabem o que deve ser feito.”
Outro ponto que Taubira acha de fundamental importância em relação ao meio ambiente é a questão da biodiversidade. “A gente fala muito de mudança climática, mas, além disso, há uma perda considerável de biodiversidade. Nós devemos garantir a preservação da biodiversidade e permitir a reprodução, o replantio e a reinstalação de espécies animais”, analisou.
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“E, além disso, há a necessidade de lutar pela justiça social. Porque é ela que permite que as pessoas não sejam obrigadas a satisfazer os modelos comerciais predatórios. Eu sou muito sensível à necessidade de justiça social e ao fato de que as instâncias multilaterais são bem menos exigentes em relação à justiça social nos países do Hemisfério Sul que em relação à preservação dos ecossistemas.”
Ela acredita que justiça social e preservação do meio ambiente andam de mãos dadas. “Evidentemente, porque a pobreza contribui às atividades econômicas. Mas não se deve colocar o fardo do desmatamento sobre os pobres, seja na Amazônia seja no Congo. Mas é certo que, se não permitirmos a justiça social, uma atividade profissional, um salário que permita viver, o acesso à educação para as crianças, há o risco de prejuízos ao meio ambiente. Mas, mesmo que não houvesse esse risco, não seria justo. E eu não gosto do que não é justo.”
Taubira tem uma extensa trajetória política e foi a primeira mulher negra a ocupar o cargo de ministra da Justiça na França. Foi autora da lei histórica que reconhece, pela primeira vez, a escravidão e o tráfico negreiro como um crime contra a humanidade. Prestes a completar 24 anos, a Lei Taubira, como ficou conhecida, segue como referência para organizações do mundo todo, incluindo as Nações Unidas e o Parlamento Europeu.
A ex-ministra é conhecida internacionalmente pela atuação na defesa dos direitos humanos, da justiça social e da valorização das identidades culturais, destacando-se como uma das vozes mais influentes do pensamento político e jurídico contemporâneo.
Além da conferência desta segunda-feira, Taubira participará de uma série de encontros e workshops envolvendo programas de pós-graduação da UFPA e associações de estudantes indígenas, quilombolas e refugiados, além da Comissão de Equidade e Gênero.